Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Discurso impregnado de resistência

Samuel Pinheiro Guimarães, embaixador de carreira e atual chefe da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (SAE), é um intelectual que parece encarar a finitude a partir do posicionamento clássico das gentes de construtos críticos. Avesso à fórmula mercado + consumo = felicidade, Pinheiro Guimarães tem o discurso impregnado de resistência e certamente pensa o Estado como movimento social, Estado esse que se opõe às práticas autoritárias de um fascismo societário.

Um vez dado o escopo de seu pensamento, tentamos entrevistá-lo por telefone ou e-mail; fomos dissuadidos a fazê-lo pela assessoria, mas estimulados a usar dos métodos tradicionais do jornalismo olho-no-olho, bem ao gosto do embaixador. Nosso orçamento não alcançou.

Pensadores como SPG tentam agora sugerir um novíssimo marco epistemológico, pluralista e contra-hegemônico. Lembrando de filósofos menos recentes, Althusser ensinou sobre a ruptura epistemológica; Khun sobre mudanças de paradigmas; e Popper a respeito da refutação das teorias, todos eles concorrendo para uma evolução teórica e do pensamento, mas de forma radical. A morrinha dos velhos paradigmas de impor ‘parâmetros internacionais’ às políticas nacionais deve continuar até 2022, deadline do estudo prognóstico para o Brasil a que SAE se dedica no momento: (http://www.sae.gov.br/brasil2022/).

Dias melhores não virão

‘Esses parâmetros, que pela primeira vez surgiram como resultado das negociações da Rodada Uruguai e que se concretizaram no conjunto de acordos que vieram a constituir a Organização Mundial do Comércio, limitam de forma significativa a capacidade dos Estados subdesenvolvidos de organizar e executar políticas de desenvolvimento necessárias à superação de suas fragilidades econômicas e sociais’, disse recentemente SPG.

O atual tombo de 19% no IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) brasileiro corrobora – para usar o jargão popperiano – a observação acima do titular da SAE, ‘de organizar e executar políticas de desenvolvimento necessárias à superação de suas fragilidades econômicas e sociais’. Por outro lado, um conhecido diplomata boca-rota diria que são as políticas sociais do atual governo, ou outra asneira qualquer, que minariam no futuro a pujança econômica alcançada no governo Lula. Cego aos cânones da falsa racionalidade liberal, uma turma que o segue insiste naquela burrice paramétrica e perversa, numa espécie de leitmotiv autodestrutivo e narcisista.

SPG prognostica ainda o aparecimento de quatro crises: econômico-financeira, ambiental e de energia, política (protagonismo chinês) e a crise ideológica, advinda da falência do neoliberalismo econômico. Ou seja, dias melhores não virão.

O discurso auto-enganador e vazio

Nessa conjuntura de crises (estruturais), tenderão a ocorrer mudanças de modelos, isto é, a falseabilidade das teorias e políticas ora em voga. Mas os futuristas mágicos dos cálculos financeiros liberais e do embuste – ou asnal teimosia – do livre mercado predatório são cegos intelectualmente para perceber a roubada para a qual lentamente nos encaminhamos.

De Brasília, o jornalista João Campos, do Centro de Desenvolvimento Sustentável da UnB, alerta: ‘A necessidade de reduzir a emissão de gases causadores do efeito-estufa, alarmada por cientistas de todo o mundo, tem obrigado países a desenvolver fontes de energia alternativas ao petróleo. O Brasil tem a sexta maior reserva de urânio do mundo. No entanto, apenas 30% do subsolo do país é conhecido’.

A energia nuclear é uma diretriz da SAE para a matriz energética do país nos próximos 12 anos. ‘O potencial hidrelétrico brasileiro também é sub-explorado. Temos capacidade para gerar 260 mil megawatts, mas só usamos 80 mil. Isso é menos de um terço do total. E o investimento nessas fontes gera conflitos de interesses da indústria petroleira, que vai fazer forte oposição nos próximos anos’, disse o embaixador ao repórter.

Enquanto isso, o lobby itamaratiense ‘Av. Paulista’ aposta no moto Serra insípido: é a mentalidade ultrapassada de discurso auto-enganador e vazio, mas de bolsos cheios e repletos de ‘boas intenções’.

Enquanto isso, o planeta e os pobres pagam.

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Jornalista, Curitiba, PR