Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Eleição na entidade na alçada da Justiça

Segue o impasse diante da eleição na Associação Brasileira de Imprensa (ABI). Na terça-feira (16/4), a juíza Maria da Glória Bandeira de Mello, titular da 8ª Vara Cível do Rio de Janeiro, negou o pedido da chapa de oposição Vladimir Herzog para suspender o processo eleitoral e determinou que a eleição ocorra em caráter condicional (sub judice), até que a ABI responda às alegações contidas no processo. Caso sejam acatadas as reivindicações, será realizada nova eleição. Caso contrário, permanece a administração vencedora até uma eventual decisão em contrário.

Mauricio Azêdo, presidente da ABI e candidato à reeleição na chapa Prudente de Morais, repete a indignação que já expressou na mídia: “A ABI está sendo alvo de uma campanha de mentiras, e responde aos ataques com os argumentos de que dispõe. Lideram a pretensa chapa, que não consegue se registrar, diretores que não renunciaram aos cargos e se uniram a pessoas que nem jornalistas são”. Seu desabafo se complementa com uma agressão verbal ao opositor Domingos Meirelles: “Temos confiança de que vamos derrubar as pretensões de Domingos Meirelles, moleque e oportunista”. A advogada Maria Arueira Chaves, do escritório Siqueira Castro Advogados, que representa a ABI, não conseguiu obter, em cartório, uma cópia do processo antes que a juíza – que ela considera muito cautelosa – desse o despacho. Depois que tomou conhecimento da ação pelo site do Tribunal de Justiça, e viu que a juíza pretende reapreciar a decisão após a ABI apresentar sua resposta, a advogada prepara sua defesa, mas aguarda que a entidade seja citada, o que ainda não ocorreu.

A chapa de oposição entrou com processo pleiteando o adiamento da eleição por não conseguir seu registro a tempo. Também nesta 3ª.feira (16/4), representantes da chapa participaram de uma reunião extraordinária do Conselho da ABI para apresentar o que consideram as muitas irregularidades cometidas – sobre a escolha da comissão eleitoral e os prazos estabelecidos, entre outros aspectos –, “sempre contrariando o estatuto da entidade”.

Em seguida, encontraram-se com seus advogados para decidir se devem entrar com um agravo ou o recurso contra uma decisão não definitiva. No despacho mencionado, a juíza considera que, por enquanto, a ação não tem provas suficientes. Paulo Jerônimo de Souza, o Pajê, protesta: “Quer mais prova que apresentar o estatuto e mostrar que não foi obedecido?”.

Um dos entraves que a oposição encontrou foi a exigência de os candidatos estarem em dia com o pagamento das mensalidades, ao mesmo tempo em que a ABI não recebe esses pagamentos, por ter dado férias ao funcionário responsável, e se recusar a emitir boletos de cobrança. Para comprovar a diferença de tratamento dispensado às duas chapas, a oposição teve acesso à cópia do cheque pessoal de Mauricio Azêdo, nominal à ABI, destinado ao pagamento de mensalidades de fevereiro de 2013 de 17 associados em atraso, quase todos candidatos da situação. Uma curiosidade é que, na listagem desses associados, aparece o nome de Arcanjo Antonino Lopes do Nascimento, o Tim Lopes, morto tragicamente em 2002. Parece ter sido apenas uma confusão, já que o irmão dele, Miro Lopes, é candidato na chapa Prudente de Morais, da situação.

Marcada para 26/4, com chapa única, esta eleição não parece reservar surpresas. Mas seu desenrolar, talvez. J&Cia reproduz a seguir carta encaminhada pelo movimento de oposição Vladimir Herzog e que está circulando na internet:

Quando a primeira vítima é a verdade

Nos últimos dias, Maurício Azêdo mentiu a todos os jornais que o procuraram para falar sobre a crise política e financeira que abala a ABI, a mais longeva guardiã das liberdades. Mentiu a O Globo, Estadão e Folha de S.Paulo sem nenhum constrangimento. Mentiu à repórter Laura Antunes, de O Globo, ao negar a existência de uma crise financeira, informando que a ABI estava, inclusive, realizando reformas no prédio com recursos próprios. A repórter ignorava que o andaime cenográfico montado na sexta-feira de carnaval, em volta do edifício-sede, foi instalado apenas para enganar a imprensa e o corpo social. Não se viu até hoje nenhum operário trabalhando na fachada do prédio. Quem tiver alguma dúvida, basta consultar os inquilinos das lojas do andar térreo, os principais prejudicados com o emaranhado de ferragens que dificulta a circulação de pedestres e a entrada e saída de clientes.

Se não existisse crise financeira, não teria sentido Azêdo participar pessoalmente das audiências na Justiça do Trabalho, ao lado do advogado da ABI, para pedir que as indenizações devidas aos empregados, todos demitidos pela mulher, fossem parceladas em seis e até doze meses. A alegação para o pagamento parcelado é de que a ABI “não se encontra em boa situação financeira”.

Azêdo mentiu ao Estadão ao afirmar que a entidade tem três mil associados. Fornadas de jornalistas abandonam a cada ano a ABI, descontentes com os rumos da atual administração. No seu corpo social existem apenas 600 associados em dia. Nas eleições realizadas anualmente, para a renovação do terço do Conselho Deliberativo, pouco mais de 100 associados aparecem para votar. Azêdo foi grosseiro com os integrantes da Chapa Vladimir Herzog ao qualificá-la como um “bando de oportunistas”. Uma chapa que tem entre seus integrantes Alberto Dines, Ziraldo, Carlos Chagas, Zuenir Ventura, Flávio Tavares, Joseti Marques e Domingos Meirelles, além de outros companheiros com uma trajetória profissional respeitável, merece ser tratada com mais respeito.

Azêdo mentiu aos três jornais ao negar a existência de uma crise política. Os desentendimentos com a diretoria não começaram agora, mas em 2005, oito meses depois de ser eleito pela primeira vez (atualmente encontra-se no terceiro mandato e é candidato pela quarta vez). Naquele ano, metade da diretoria demitiu-se oito meses depois da posse por não concordar com métodos autoritários do atual presidente da ABI.

A segunda crise ocorreria dois anos depois, em 2007. Um funcionário nomeado com superpoderes por Azêdo, à revelia da Diretoria, agrediu fisicamente a diretora-administrativa. O caso terminou na polícia e o agressor foi condenado na Justiça. Apesar de não ter assistido à cena, Azêdo assumiu a defesa do funcionário. Sustentou que a diretora é que o havia esbofeteado.

As comemorações do Centenário da ABI, no Teatro Municipal, em 2008, provocaram a terceira grande crise. Os membros da diretoria foram encaminhados pela mulher de Azêdo para um camarote distante. Do outro lado do salão, Azêdo recebia convidados especiais numa festinha privê, em meio a salgadinhos, canapés, champanhe, uísque e vinho importado. Audálio Dantas, então vice-presidente da ABI, chegou atrasado e, sem saber, dirigiu-se ao salão onde o presidente festejava os 100 anos da instituição ao lado de amigos particulares. Ao tentar entrar, acreditando que a diretoria estava também reunida naquele local, foi barrado pelas recepcionistas porque seu nome não constava da lista de convidados. Audálio demitiu-se da ABI meses depois.

A quarta crise ocorreu em 2010. Durante uma assembleia-geral tumultuada, onde foi alvejado com graves ofensa pessoais, o presidente da ABI conseguiu remover o artigo 44 do Estatuto que limitava a reeleição a dois mandatos. Sem o artigo 44, ele poderá reeleger-se ad eternum.

A crise de 2013, que levou à formação da Chapa Vladimir Herzog, foi provocada pela grave situação em que se encontra a entidade, com quase todos os seus andares sob penhora como garantia de dívidas previdenciárias e tributárias, que chegam a cerca de R$ 8 milhões.

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Cristina Carvalho é editora do Jornalistas&Cia no Rio de Janeiro