Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Época requenta o escândalo com relatório da PF

 

O assunto já estava sendo encaminhado para o arquivo morto da imprensa, mas a revista Época deste final de semana trouxe um relatório da Polícia Federal, “obtido com exclusividade”, no qual se comprova que o governador de Goiás, Marconi Perillo, do PSDB, fez negócios com o bicheiro Carlos Cachoeira. Em um desses negócios, o bicheiro teria pago um ágio de R$ 500 mil por uma casa comprada do governador, em troca da liberação de pagamentos por parte do governo de Goiás à construtora Delta. Segundo a revista, o relatório policial contém 73 páginas e 169 diálogos telefônicos altamente comprometedores.

Por conta dessa reportagem, os jornais desta segunda-feira, dia 16, recolocam o caso em destaque. No domingo, a Folha de S. Paulo já havia substituído o escândalo Cachoeira por uma notícia sobre indícios de prática de suborno em obras da ferrovia Norte-Sul, também em Goiás. O caso trata de superfaturamento nas obras da ferrovia: apenas no trecho entre Goiás e Tocantins teriam sido desviados cerca de R$ 100 milhões, por meio de conluio entre dirigentes da Valec, estatal que administra as obras, e as sete empreiteiras encarregadas da construção.

Nesta segunda-feira, os jornais reproduzem declarações do vice-presidente da CPI do caso Demóstenes-Cachoeira, deputado Odair Cunha (PT-MG), de que vai indiciar o governador de Goiás. Embora uma CPI do Congresso não tenha poderes para punir o governador, Perillo pode ser investigado pelo procurador-geral da República e processado no Superior Tribunal de Justiça.

Segundo os documentos exibidos pela revista Época, assim que assumiu o governo de Goiás, no ano passado, o tucano Marconi Perillo fechou um acordo com a construtora Delta, sob intermediação do bicheiro Carlos Cachoeira: “para que a construtora recebesse em dia o que o governo de Goiás lhe devia, a construtora teria de pagar a Perillo”, diz a revista.

Dito assim, parece que a pobre empreiteira foi vítima de uma chantagem armada pelo governador com a ajuda do bicheiro. Na verdade, segundo a reportagem, a Delta não apenas acompanhava as intermediações entre Cachoeira e o governador como tinha negócios à parte com o bicheiro, cuja natureza a Polícia Federal ainda está investigando.

Kassab na mira

Os arquivos revelados pela revista Época desmentem uma a uma as declarações feitas pelo governador Marconi Perillo à Comissão Parlamentar de Inquérito do Congresso Nacional. Sua defesa, feita há um mês em Brasília, baseava-se na afirmação de que Carlos Cachoeira não teve participação na venda da casa, que teria sido feita diretamente pelo governador ao empresário Walter Paulo Santiago, dono de uma faculdade em Goiânia.

As contradições são esclarecedoras: Perillo diz que vendeu a casa a Santiago, não a Cachoeira, e que recebeu em cheque. Santiago afirma que comprou a casa do governador, e pagou em dinheiro, não em cheque. Na verdade, segundo esclarece a revista, a venda da casa foi apenas uma forma encontrada para repassar ao governador o dinheiro da propina pela liberação de pagamentos devidos pelo governo de Goiás à construtora Delta.

Os documentos obtidos junto à Polícia Federal apontam a montagem de um esquema no qual o bicheiro Carlos Cachoeira atua como um sócio da empreiteira, usando essa relação para lavar dinheiro obtido em outras atividades. Como ele é reconhecidamente ligado à máfia da jogatina, que conta com destacados simpatizantes no Congresso Nacional, é possível que a investigação, se for levada adiante, acabe conduzindo a personagens ainda mais destacados do que o governador de Goiás.

No entanto, não se pode apostar que a imprensa esteja disposta a ir tão fundo. Antes da revelação feita pela revista Época no final de semana, os grandes jornais de circulação nacional já davam sinais de haverem esgotado seu interesse no assunto.

Se a cassação do senador Demóstenes Torres, ocorrida na semana passada, atingiu em cheio seu antigo partido, o Democratas, o bombardeio contra o governador Marconi Perillo pode vir a fragilizar ainda mais o PSDB, que já enfrenta dificuldades com a falta de fidelidade de seu novo aliado, o PSD, criado recentemente pelo prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab. Além de perturbar o equilíbrio alcançado pelas legendas mais antigas, o PSD de Kassab coleciona adversários poderosos ao fazer alianças oportunistas pelo Brasil afora. Também envolvido em denúncias de corrupção, Kassab corre o risco de vir a ser a próxima manchete.