Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Monopólio global da TV

Nesses dias de Copa do Mundo, que já foram empolgantes para nós, até que Zidane estragasse a brincadeira, brasileiros e brasileiras estão condenados a ouvir o narrador Galvão Bueno e os comentaristas de arbitragem Arnaldo César Coelho e de futebol, os ex-craques Roberto Falcão e Casagrande.

Não há outra opção. A Rede Globo de Televisão fechou contrato de exclusividade para transmitir os jogos para o Brasil, de modo que a diversidade de opiniões está proibida de acontecer na TV brasileira. Só os profissionais da emissora têm direito a opinar enquanto desenrola o espetáculo. Monopólio global jamais visto. Privilégio supremo do capital.

Aos demais canais resta a geladeira. Sobram para eles falar sobre comida requentada. Depois que as partidas são realizadas, os comentários globais feitos, as jogadas repetidas exaustivamente, os noticiários da Globo apresentados, o resto entra a falar. Mas, aí, não tem mais graça, como ocorreria o contrário se, simultaneamente, fosse possível confrontar as opiniões da variedade de profissionais do futebol em ação de cobertura jornalística pelas demais emissoras.

Pressupostos legais

Em cima da massa de informações futebolísticas originadas nos belos estádios de futebol da Alemanha, novinhos em folha, onde o espetáculo da alegria das torcidas encanta e emociona o mundo, denotando a união dos povos pelo esporte mais popular no planeta terra, os narradores e comentaristas das outras TVs ficam mudos, esperando que o show termine para entrarem em campo. Algo totalmente frustrante.

A diversidade inexiste até nos canais pagos. A grande massa da população certamente não tem acesso a eles, dada a insuficiência de renda, ficando telespectadores e telespectadoras, igualmente, sujeitos, na condição de objetos, à tirania da cobertura única, oligopolizada e monopolizada.

Restaria o questionamento relativo à legislação que regula a atuação dos meios de comunicação, destacamente a televisão. 

Sabendo que as transmissões pela TV existem por força de concessão pública, se um canal, como o da Globo, assim como o resto, é subordinado aos mesmos pressupostos legais, o que exige a lei para que um evento essencialmente público, como é o caso de Copa do Mundo, seja oferecido ao povo para que este disponha de apreciações críticas diversificadas em nome da liberdade democrática que está na base do conceito de concessão pública?

Informação, formação

Detentores de concessões públicas podem exercer, como o Estado, o direito soberano de agir monopolisticamente quanto ao produto que se responsabilizam em oferecer ao contribuinte, ao qual o poder público tem que responder em última instância, ferindo, com isso, os pressupostos democráticos cuja expressão maior se baseia na necessária liberdade de opção relativamente a tal produto a ser oferecido ao consumo da sociedade?

Acima dos interesses econômicos estariam ou não, de acordo com a lei, o interesse dos cidadãos?

Poderiam ou não optar pelo que determina a liberdade individual em matéria de usufruto do produto que lhe é oferecido, no caso a informação futebolística, visto que a concessão é pública?

É legal exercer monopólio sobre algo que é fundametalmente público, ou o correto seria que a divulgação de informação por meio de instrumento oferecido pelo Estado em forma de concessão tenha que contemplar, necessariamente, a diversidade em nome do interesse público?

A monopolização eliminou a liberdade de o cidadão e cidadã decidirem sobre produto que lhe oferecem: a imagem gerada na Alemanha por meio da TV – cuja existência é dada pela decisão estatal por meio de representante do povo livremente eleito de acordo com as normas democráticas. 

Vista a questão em sua generalidade totalizante, dialética, a monopolização da transmissão da Copa do Mundo fere a liberdade de optar, garantida na legislação brasileira, que concede ao setor privado, sob condições, o direito de exploração do produto informação que, essencialmente, é formação – cuja essência, em uma democracia, para ser compatível com esta, necessita ser amplamente democratizada.

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Repórter do Jornal da Comunidade, Brasília (DF)