Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Não podemos debater?

É curioso um cacoete corriqueiro da (concentrada) mídia brasileira: toda vez que ela é questionada sobre o fato de estar fazendo o seu trabalho direito, seus porta-vozes chiam com o mesmo argumento, de que a liberdade de imprensa está ameaçada. Os donos dos meios de comunicação precisam perceber que a população tem direito de saber muita coisa que a liberdade de imprensa exige dos seus veículos e profissionais.

Tomemos como exemplo o recente acirrar de ânimos entre governo e mídia. Após a denúncia da revista CartaCapital quanto ao exercício do jornalismo no episódio das fotos do dinheiro, não se parou de debater o papel da imprensa numa democracia. A internet foi o fórum principal para isso, e até mesmo Ali Kamel teve que se explicar sobre uma prática jornalística de suas equipes, coisa impensável até então.

‘Revanche’ de petistas

Há muito que se fala de liberdade de imprensa e pouco de democratização dos meios de comunicação. Afinal, o que a maioria dos brasileiros sabe sobre as concessões públicas de rádio e TV? Como e por que elas são renovadas? Por que parlamentares possuem emissoras se a Constituição não permite? Por que uma concentração do meios entre algumas famílias no Brasil, como Marinho, Saad, Frias e Civita?

Se prezamos tanto a liberdade de imprensa (como deve ser), as questões acima precisam ser discutidas pela sociedade. E a sociedade é formada, dentre outros setores, pela própria imprensa, leitores e… governo.

Agora, o projeto de democratização da mídia anunciado por Ciro Gomes, reiterado no site do PT e por seus parlamentares como proposta do governo, já é rechaçado ‘em nome da liberdade de imprensa’, ou visto como ‘revanche’ dos petistas. Ainda que seja verdade, não se pode desqualificar a intenção, nem tirar o debate dos holofotes, impedindo a sociedade de opinar.

Desejo histórico

Pois o referido projeto já está sendo chamado pela revista Época de ‘pretexto’ para a ‘revanche’, e o colunista Paulo Nogueira já decretou: quem tem que julgar a mídia não é o governo, mas a o público e a Justiça. Ou seja, não toquemos nesse assunto simplesmente porque ao governo não cabe responsabilidade sobre isso.

Ora, é claro que cabe, uma vez que o Estado existe para todos os cidadãos. E assim como precisa promover distribuição de renda e os direitos humanos básicos, precisa também buscar o equilíbrio da representatividade da população e dos órgãos de mídia. A sociedade espera uma maior democratização dos meios para se sentir representada e com possibilidade de acompanhar e interagir. A internet é isso, e não pára de crescer pelo mesmo motivo.

Portanto, é preciso que venha para a pauta do dia o projeto de democratização dos meios, pois isso é um desejo histórico do povo brasileiro. Mesmo se os porta-vozes dos barões disserem o contrário.

******

Jornalista, Rio de Janeiro; www.lessa27.blogspot.com