Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

O que é ser um líder?

Liderança. Quem há de saber de onde ela surge? Que espécie de característica o ser humano precisa ter para tornar-se líder no seu círculo de relacionamentos? A imagem que mais se associa à do líder é a de um homem forte, capaz de dar aos seus liderados uma proteção que esses, sozinhos, não seriam capazes de desenvolver. Um guerreiro, que vai à frente do seu exército.

O carisma é, talvez, o alimento ou o núcleo dessa força que torna algumas pessoas capazes de guiar os demais para a realização de determinadas ações, por mais absurdas que possam parecer aos olhos dos que não estão sob a liderança daquele. Na passagem do século 19 para o século 20, Max Weber já tratara dos tipos de liderança.

Na era em que vivemos, quando, pelo poder da tecnologia, imagens e informações correm o mundo instantaneamente, as lideranças já não precisam do contato com os seus liderados. Aliás, essa é uma das características da liderança contemporânea: o total afastamento físico da multidão. O poder de sedução do vocalista de uma banda é resultado de suas características pessoais, mas dependem sobremaneira das técnicas de marketing utilizadas na divulgação do seu trabalho, do momento em que é lançado ao público, da mensagem que ele transmite, do código que utiliza para a transmissão. Uma excelente banda de jazz terá pouca chance de empolgar uma platéia formada por não conhecedores deste tipo de música.

O cerne da liderança

Ainda tratando das lideranças midiáticas, o sistema absorve também aqueles cuja imagem não esteja adequada ao padrão estabelecido. Talvez isso explique o sucesso de determinados políticos, o muitas vezes candidato à presidência da República e deputado federal Enéas Carneiro é um exemplo (terá ele sido reeleito?).

Mas e quando tratamos da liderança que se estabelece fora do eixo midiático? O que faz um professor ‘hipnotizar’ uma sala lotada de alunos, enquanto outro não segura a atenção nem da primeira fila, se ambos estão tratando do mesmo assunto? O que faz um chefe de departamento de uma empresa privada ou repartição pública conseguir dos seus subordinados a realização de tarefas consideradas ou comprovadamente inexeqüíveis por outros chefes?

A discussão da liderança discorrida até aqui deteve-se em ações legais ou socialmente aceitas. Entretanto um outro tipo, a despeito das condições externas adversas, se mantém, cresce e pode revelar o verdadeiro cerne do que seja a liderança: o desenvolvimento de organizações para a realização de ações ilegais e violentas. Excluindo-se as operações cuja violência é simbólica, como a corrupção, a formação de grupos organizados ou ‘quadrilhas’, como denominados pela linguagem policial e copiados pela mídia, exigem uma leitura mais aprofundada sobre o fenômeno da liderança.

Exemplo emblemático

Neste tipo de agrupamento a imagem mais latente é a de Lampião: um ‘cabra valente’, forte o suficiente para, ele próprio, enfrentar a polícia, mas também para decidir a parada entre os comandados, caso colocassem em xeque a sua autoridade. Outra característica associada é o elã que desperta entre as mulheres. Elas o querem e ele as quer e tem, muitas. Ser a mulher do chefe (ou uma das) representa ser bem servida quanto à vida sexual. Esse é o padrão da liderança bandida. Força, agilidade e sexualidade latentes.

Quais dessas características podem ser associadas àquele homem apresentado à imprensa como líder de um bando de 60 assaltantes, responsável, entre outros, pelo seqüestro de um empresário cearense? A cadeira de rodas, da qual César Almeida ou Alemão necessita para locomover-se, definitivamente não é o símbolo ao qual podemos associar um líder de uma organização que precisa de agilidade para continuar existindo. A ele também não pode ser associada a imagem de quem decide a parada pelo poder físico, mesmo supervalorizado por armas de alta destruição. Sair da alça de mira de um cadeirante não deve ser tarefa difícil para quem leva a vida saindo da alça de mira da polícia.

De todos os exemplos apresentados, este é o mais emblemático da grande dificuldade para a definição de quais características são necessárias ao surgimento de uma liderança.

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Mônica Costa é mestranda em Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e assessora de imprensa em empresas pública e privada