Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Os 100 dias da presidente

Mania importada dos Estados Unidos, a avaliação dos primeiros cem dias dos governos – período em que a oposição costuma dar uma trégua ao governante para que ele coloque a máquina governamental em funcionamento – pegou aqui também. E cria um interesse maior quando o eleito, por suas características, representa uma grande novidade. Foi assim com Lula, um ex-operário, e foi assim com Dilma, a primeira mulher eleita para governar o Brasil.


Se com Lula o temor era uma radicalização à esquerda, com Dilma o medo era que ela não tivesse capacidade, sem Lula por perto, de governar o país. Como disse o jornal O Estado de S. Paulo na página de abertura da matéria “100 Dias do Governo”:




“Dilma Rousseff completa hoje 100 dias no cargo de presidente da República com o feito de ter dirimido a dúvida mais mordaz lançada contra ela por seus opositores durante a campanha eleitoral do ano passado: seria Dilma, criada à imagem e semelhança de Lula, capaz de comandar o país sozinha? Para silenciar os críticos nesse quesito, a primeira mulher a ocupar a Presidência fez questão de imprimir a marca de uma governante austera e discreta… Dúvidas de gestão à parte, resta ao fim dos 100 dias a certeza de que Dilma se impôs. Parafraseando o francês conde de Buffon (1707- 1788), para quem ‘o estilo é o homem’, hoje ‘a mulher é o estilo’” (O Estado de S. Paulo, 10/04/2011).


Comparando os artigos escritos sobre os primeiros 100 dias de Lula (em 2003, no primeiro mandato) com o que se disse agora sobre Dilma, a primeira – e talvez única – diferença entre a presidente e seu criador é mesmo o estilo.


Apoio popular e respeito do mídia


Em artigo publicado na Folha de S.Paulo em 9 de abril de 2003, Eliane Cantanhêde dizia:




“Para comemorar os seus primeiros cem dias na Presidência, Lula foi à televisão três dias antes (na segunda, 7/4) para fazer o que ele faz de melhor: ‘conversar’ com o povo brasileiro. Apesar de excessivamente longo, seu pronunciamento recuperou o palanqueiro que há em Lula, olhando diretamente para a câmera (ou para o telespectador), expondo as dificuldades para tomar decisões e justificando as ‘medidas amargas’, como aumento de juros e de superávit primário.”


A paixão pelos holofotes é, por enquanto, a grande diferença entre Lula e sua sucessora:




“Desde que assumiu, orientou os ministros a fugirem dos holofotes. Quem desobedeceu, sentiu as consequências. Em três meses de mandato, Dilma transformou o Planalto na sede de uma mostra de 80 artistas plásticas brasileiras, aberta ao público. Na noite do dia 2, foi ver uma peça de teatro no CCBB de Brasília, acompanhada de um mínimo de seguranças” (O Estado de S. Paulo, 10/04/2011).


Isso sem falar na projeção de um filme no Planalto para uma plateia só de mulheres.


Mas, entre as diferenças de estilo, a que merece mais destaque, pelo menos do ponto de vista feminino, é a ênfase que a presidente tem dado às mulheres, como destacou o artigo de Roldão Arruda no Estadão de domingo (10/4):




“Nos 33 pronunciamentos que fez desde a posse, em 15 deles a presidente Dilma Rousseff relembrou o fato de ser a primeira mulher no cargo ou homenageou as mulheres… Mas o que está atraindo mais a atenção delas nos discursos é um detalhe que, embora desapercebido para a maioria, encanta os ouvidos mais atentos. Trata-se da ênfase que Dilma dá à questão da independência econômica das mulheres – como assalariadas ou empreendedoras. Isso representa um avanço em relação ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que valorizou as mulheres por outros caminhos, o combate à violência entre eles”.


Como escreveu Gilberto Dimenstein em artigo da Folha sobre os 100 dias de governo Lula em 2003: “Obviamente não dá para avaliar um governo direito nem depois de quatro anos de mandato, muito menos em 100 dias.”


Mas uma coisa é certa, a julgar pela cobertura dos jornais desses 100 dias de Dilma: a postura discreta da presidente está, sem dúvida, ganhando o apoio popular e o respeito da mídia. Resta ver como estará a popularidade da presidente e a situação do país ao completar mais 1.361 dias do governo.

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Jornalista