Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Os tiros nos filmes

Ontem assisti a Acossado, de Jean-Luc Godard e O assassinato de um presidente, de Niels Mueller. Acossado (1959) é incrível, os diálogos brilham e o charme da língua francesa definitivamente seduz. O mocinho boa pinta, fora-da-lei, pilantra. Uma bela mulher que filosofa ao lado dele sobre o amor, sobre a arte. Ele morre no final, deixando ela deslumbrada com um tipo de revolução interna e uma pitada de ironia. Assim como morre o mocinho de Zabriskie Point (1970), dirigido por Michelangelo Antonioni. Um rapaz interessante, que quer andar de alguma forma pela marginalidade, e leva junto uma mulher de belos cabelos esvoaçantes. No fim, ela fica sem ele, mas conseguimos sentir que ele transformou sua vida.

No Assassinato do presidente (2004), Sean Penn começa a engolir e a não digerir o funcionamento do sistema. Ele é deixado por sua mulher e humilhado pelo chefe da loja em que trabalha, enquanto assiste em diversos momentos a discursos irritantes do presidente Richard Nixon. Toda sua revolta acaba sendo divagada para a figura do presidente de seu país. E então ele decide assassinar o homem que ocupa o cargo mais respeitado da sociedade para “entrar” para a história. Sean atua muito bem. Sua aflição é bravamente compartilhada e ele faz a gente sentir raiva de nossos empregos.

Objetos de desejo

Me lembrei de Taxi Driver (1976). Martin Scorsese ao lado de uma trilha sonora inesquecível, narra a história de um motorista de táxi aflito. Robert De Niro perde sua mocinha depois de levá-la para uma sessão cinematográfica pornô. E acaba nas drogas e nas armas. Robert De Niro, assim como Sean Penn, se encontra aos poucos com sua escória, se reduz à loucura e também reflete seu desespero em um representante político. Toda coincidência pode ser mera semelhança. Mas os tiros aparecem em todos os filmes. Sou apaixonada pelo cinema. E tenho a triste coragem de dizer que as armas ficam bonitas na tela e fazem parte dos personagens.

Acho que a história do cinema e a cultura das guerras serviram para agregar certa positividade aos revólveres e às pistolas. Se tornaram, sem que nos pedissem autorização, objetos de desejo. Não podemos reclamar então, quando elas servem para exterminar crianças que só queriam estudar.

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Assistente de produção de TV, Rio de Janeiro, RJ