Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Plínio Bortolotti

‘Para o bem ou para o mal, tanto os jornais como os leitores tornaram-se dependentes das pesquisas eleitorais: os primeiros usando-as como estímulo para manchetes; os segundos para verificar a posição de seus candidatos ou para refletir sobre o voto a ser digitado na urna eletrônica. Livrar-se delas com um ‘eu não acredito’ ou, por outro viés, com o ‘eu acredito’, como se as pesquisas fossem um novo tipo de oráculo, é a pior forma de debater o assunto. Entre um e outro extremo há nuances que, bem vistas, podem ajudar o leitor a compreendê-las melhor.

A principal pergunta que os leitores/eleitores fazem é a razão de as sondagens apresentarem tantas divergências em seus números. Daí para a acusação de que os institutos servem a ‘interesses’ ou a este ou aquele candidato, é um pulo. A Associação Brasileira de Agências de Pesquisa (Abep) registra 180 filiadas no País, sendo quatro as grandes empresas pesquisadoras: Datafolha, Ibope, Sensus e Vox Populi. Elas vivem da credibilidade de seus produtos e seria ilógico supor que todas estivessem dispostas a sacrificá-la em nome de um imediatismo comprometedor da sobrevivência no mercado. De mais, as pesquisas são regulamentadas por lei, têm de ser registradas nos tribunais eleitorais, são fiscalizadas pela Justiça Eleitoral e podem ser verificadas por qualquer interessado. Pode não ser um mecanismo infalível antifraude, mas existem regulamentos seguros e conhecidos.

Orientações

Mauro Paulino, diretor do Datafolha, dá algumas orientações para o leitor acompanhar as pesquisas. Ele diz que é preciso prestar atenção à margem de erro: se um candidato tem 35% de intenção de votos, por exemplo, e a margem de erro é de três pontos percentuais, os índices dele oscilarão entre 32% e 38% (o quem nem sempre fica claro para o leitor). Paulino lembra também a necessidade de verificar com cuidado a metodologia utilizada e se a pesquisa reproduz ‘proporções verificáveis em cada cidade’, ou seja, se as amostras de municípios e eleitores foram feitas corretamente. Ele lembra ainda que à medida que se aproximam as eleições, o número de enquetes vai aumentar, ‘com dois ou três institutos divulgando pesquisas na mesma semana’, por isso recomenda a verificação do histórico e da credibilidade de cada instituição pesquisadora: ‘O eleitor tem de escolher um instituto como escolhe um candidato’.

Estimulada ou espontânea?

Outra dúvida refere-se ao tipo pesquisa: ‘estimulada’ ou ‘espontânea’, qual se aproxima mais da realidade? Nas duas, o pesquisado tem de responder à pergunta: ‘Se a eleição fosse hoje, em qual candidato você votaria?’ Na estimulada, ele recebe um disco com o nome dos candidatos para orientar a resposta; na espontânea, tem de lembrar o nome por iniciativa própria. Mauro Paulino considera a pesquisa estimulada ‘mais próxima do que o eleitor pretende fazer no dia da eleição’. Para ele, com o horário gratuito, debates e entrevistas, no decorrer da campanha, o eleitor chegará ao dia do voto com o nome do candidato ‘fixado’. Paulino reconhece que a pesquisa espontânea apresenta um voto mais ‘cristalizado’, mas diz que os números tendem a convergir na proximidade da eleição. Os demais especialistas ouvidos têm ponto de vista parecido sobre o assunto.

Portanto, para uma visão mais abrangente das pesquisas, os leitores não podem se contentar em ler apenas a manchete e os destaques escolhidos pelos jornalistas. É preciso também ir ao pé da página, onde, normalmente, estão as informações técnicas, para conferi-las. E, acima de tudo: as pesquisas devem ser vistas pelo que elas são, isto é, sondagens delimitadas a determinado momento.

Divergência de índices

Em 12 de julho, O Povo publicou pesquisa do Instituto Ultradata na qual o candidato ao governo do Ceará Cid Gomes (PSB) aparecia com 43% dos votos e o governador Lúcio Alcântara (PSDB), candidato à reeleição, com 36%, com margem de erro de 2,8 pontos percentuais para mais ou para menos. A pesquisa foi feita entre os dias 6 e 8 de julho.

Na edição de 27/7, o Diário do Nordeste publicou pesquisa do Ibope, realizada entre os dias 23 e 25 deste mês, com o seguinte resultado: Lúcio Alcântara com 46% e Cid Gomes 35%, com margem de erro de três pontos percentuais.

Fabrizio Caritatos, gestor de pesquisas do Ultradata, diz que as ‘flutuações’ são normais, principalmente no início da campanha, quando o voto dos eleitores não está consolidado. Para ele, o ‘retrato de um dia pode ser diferente do outro’ e ambos divergentes do resultado eleitoral. Com o dia da eleição distante, ‘ainda não é o caso de fazer avaliações comparativas’, diz ele. Caritatos sugere que os institutos de pesquisa insiram uma pergunta em seus formulários questionando se o eleitor está mesmo decidido a votar no candidato ao qual declara preferência ou se pode mudar de voto. Essa variável ‘não foi mensurada’ e ajudaria a dar uma idéia mais aproximada das mudanças que poderiam ocorrer, diz ele.

Para Márcia Cavallari, diretora executiva do Ibope Opinião, quando se trata de pesquisas, tem de se observar se os dados foram colhidos no mesmo período. Caso contrário, ela também vê a comparação como indevida. Cavallari revela que o próprio Ibope fez uma pesquisa anterior no Ceará, não divulgada, com resultado diferente dos números publicados pelo Diário do Nordeste, na quinta-feira. ‘A situação mudou’, afirma. ‘Se a Ultradata fez a pesquisa em período diferente, fotografou outro momento.’

Em comparações, segundo Cavallari, também é preciso verificar a metodologia utilizada e se as perguntas foram feitas na mesma seqüência, ‘pois isso pode influenciar a resposta do eleitor’. As orientações são válidas se os dados foram colhidos no mesmo período: ‘Se foram em momentos diferentes, não há nem como comparar; não dá para tirar fotografia de um momento que já passou’, diz ela.

Concluindo, gostaria de dizer que expus algumas hipóteses a respeito de um tema polêmico, obviamente, sem pretender encerrar o assunto.’