Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Reality show carcerário, a solução

Além de escritor, nas horas vagas sou funcionário público do Estado do Rio de Janeiro, lotado no Departamento Geral de Ações Sócio-Educativas (Degase, a ‘Febem-RJ’). Em minha atividade funcional, pude observar que um adolescente infrator, quando entregue às nossas unidades de internamento por determinação judicial, e cujo ato infracional tenha tido repercussão na imprensa, principalmente através dos telejornais, é recebido pelos colegas internos como uma espécie de ‘herói’. Nos primeiros dias, pode ser visto rodeado pelos companheiros, interessados nas suas fanfarrices. Geralmente acaba ganhando pequenos privilégios entre os seus novos amigos e até se torna forte candidato a ‘xerife’ de grupo.

Já ouvi adolescentes reclamando contra o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), a Lei n° 8.069/90, que proíbe a exibição pública de suas imagens, ou que se faça qualquer referência capaz de identificá-los nas matérias veiculadas pela imprensa, quando dos seus envolvimentos em atos infracionais.

Art. 247. Divulgar, total ou parcialmente, sem autorização devida, por qualquer meio de comunicação, nome, ato ou documento de procedimento policial, administrativo ou judicial relativo a criança ou adolescente a que se atribua ato infracional:

Pena – multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência.

§ 1º Incorre na mesma pena quem exibe, total ou parcialmente, fotografia de criança ou adolescente envolvido em ato infracional, ou qualquer ilustração que lhe diga respeito ou se refira a atos que lhe sejam atribuídos, de forma a permitir sua identificação, direta ou indiretamente.

§ 2º Se o fato for praticado por órgão de imprensa ou emissora de rádio ou televisão, além da pena prevista neste artigo, a autoridade judiciária poderá determinar a apreensão da publicação ou a suspensão da programação da emissora até por dois dias, bem como da publicação do periódico até por dois números.

Os adolescentes infratores querem seus 15 minutos de fama, sem tarja no rosto e com nome e endereço completo da boca onde atuam. E quanto aos marmanjos? Outro dia reclamei:

A imprensa trata muito pouco sobre as tais lideranças do PCC. Basicamente falam do Marcola. Até já criaram uma ‘entrevista’ com o capo. Falaram em acordo do Estado com o PCC, e o resto é uma obscuridade total. Logo após uma série de atentados, com muitas vítimas nos necrotérios, os telejornais apresentam algum telefonema revelando a ordem para desencadear os ataques. Uma coisa à base do ‘passa o cerol geral’. Pronto, está ‘esclarecida’ a fonte dos ataques (‘Cacarejou, botou, herr Bornhausen’, no site O Informante).

No entanto tudo indica que a queixa não é só minha. Por motivos distintos dos meus, outros interessados também reclamam da falta de divulgação dos nomes dos envolvidos nos ataques criminosos contra a população paulista.

Rede nacional

Flávio Freire, em O Globo Online (16/7/2007), revela: ‘Falta de publicidade a alguns integrantes da facção [PCC] provoca racha‘. Segundo o autor da matéria, um agente penitenciário que trabalha no complexo de segurança máxima de Presidente Bernardes informou que ‘integrantes da organização estariam insatisfeitos com a ‘falta de publicidade’ em torno dos seus nomes’. E que (pasme se for capaz) a insatisfação parte dos próprios parentes dos detentos, que lhes informam sobre a omissão (!) dos seus nomes nos órgãos de imprensa. Os presos anônimos encontraram um meio de protestar contra essa injusta discriminação: destituem seus advogados, nos casos em que estes também atuem para os bandidos famosos. E ainda armaram um plano para matar as celebridades carcerárias. Plano este interceptado em escutas telefônicas autorizadas pela Justiça.

Talvez esse problema possa ser resolvido com a inauguração da primeira penitenciária federal de segurança máxima, em Catanduvas (PR), para onde serão transferidos os mais perigosos chefes das máfias populares. Na prisão federal de Catanduvas, toda a movimentação será controlada por um sistema de vídeo, com 200 câmeras fixas e móveis, estrategicamente dispostas, com transmissões ao vivo para três centrais de monitoramento (uma dentro do prédio, outra na delegacia da Polícia Federal de Cascavel e a terceira no Departamento Penitenciário, em Brasília).

Bom, agora basta que uma grande emissora de televisão adquira o direito de retransmissão em rede nacional, e o sucesso do programa estará garantido. Os patrocínios poderiam vir de empresas de segurança privada, indústria de blindagem de automóveis, de colete à prova de bala e congêneres. Tal medida beneficiaria, provavelmente, o próprio sistema carcerário, pois evitaria o ‘racha’ entre as facções criminosas e até mesmo reduziria o número de evasões (nenhum deles quereria perder a oportunidade de ser famoso). Então, o Brasil, no ranking mundial, bateria até o ‘padrão europeu de fugas’.

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Escritor, Rio de Janeiro