Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

A chegada do tycoon a Belém

Há 53 anos o pernambucano Romulo Maiorana chegou a Belém. Num dia de setembro de 1953 ele apareceu pela primeira vez na terrasse do Grande Hotel, o principal ponto de encontro da elite da cidade naquele ano, marcado pelo Congresso Eucarístico Nacional, realizado na capital paraense, e pela maior cheia de todos os tempos do rio Amazonas. Além de freqüentar a boate do sofisticado hotel, Romulo também dançava na sede do Bancrévea, que ficava nos fundos.

 

Conversava fácil, era simpático e insinuante. Criava ambiente favorável para seu maior interesse naquele momento: começar a fabricar flâmulas e placas publicitárias. Era ao que se dedicava a sua Duplex Publicidade, estabelecida em Natal, no Rio Grande do Norte, em sociedade com Nelson Valença.

 

Romulo estivera antes em Fortaleza e São Luís, mas não se convencera sobre esses mercados. Belém parecia mais receptiva – e era, de fato: os bons resultados o levaram a usar pela primeira vez o silk-screen em publicidade e a lançar o Guia Duplex, inventariando as oportunidades locais de negócio. Uma vez fixado um pé no comércio, o outro foi fincado no jornalismo: a experiência de Romulo se desenvolvera nessas dois sentidos, ainda à cata de um sucesso que, quando ocorria, era efêmero. Mas não lhe faltavam persistência e audácia.

 

Com 14 anos, foi mandado para a terra de origem de seus pais, nascidos na Calábria e estabelecidos inicialmente em Recife. Concluiu na Itália de Mussolini o curso científico e iniciou o primeiro ano na Faculdade de Ciências Econômicas. Serviu na guerra, mas sem entrar em combate: sua participação se limitou à retaguarda, como datilógrafo.

 

Finda a Segunda Guerra Mundial, em 1946, voltou ao Brasil, mas para Natal, onde sua família montara uma confeitaria, depois de deixar Pernambuco. Romulo passou a dividir o seu tempo entre a confeitaria da família e seu primeiro experimento jornalístico: uma coluna social, que começou a escrever na Tribuna de Natal, cujo redator-chefe, Aluízio Alves, viria a ser o governador do Estado.

 

Mas o que ele queria mesmo era crescer. Por isso, os três anos seguintes foram divididos entre o Rio de Janeiro e São Paulo, como vendedor da Olivetti, uma multinacional italiana. Ganhou algum dinheiro, mas não se satisfez: queria ser o dono do seu próprio negócio, tornando-se empresário. Voltou para Natal e abriu a Duplex. Mas o mercado limitado da capital do Rio Grande do Norte era um problema e foi sondar novos horizontes. Finalmente, em 1953, se fixou na cidade da qual não sairia mais, nela morrendo, 33 anos depois, como um de seus mais conhecidos e influentes cidadãos.

 

Poder sem paralelo

 

Romulo alcançou essa posição destacada enfrentando uma corrida de obstáculosassando de um negda, ptrendo, 33 anos depois, como um de seus mais conhecidos e influentes cidadondar novos horizontes. Finalme e com revezamento. Deu partida para uma nova fase no comércio de Belém, instalando uma rede com quatro lojas que deixavam para trás o modelo acanhado e rústico adotado a partir do pós-guerra, que desfigurava o passado sem se atualizar ao presente. Suas lojas não atraíam apenas pelas mercadorias que ofereciam aos clientes: começavam a impressionar a partir das vitrines de luxo. Os funcionários tinham boa apresentação, com destaque para as bonitas atendentes, e o serviço já era personalizado, com crédito fácil.

 

Além de vender roupas feitas e artigos domésticos em seus magazines, que chegaram a ter 150 funcionários, Romulo fundou a Transamazon, empresa de transporte, comprou metade das ações de uma fábrica de confecções (a Strassy) e era o controlador de uma nova firma de publicidade. Mas não ficou dentro de suas lojas: foi um dos 13 fundadores do Clube de Diretores Lojistas, introduzindo o Serviço de Proteção ao Crédito em Belém.

 

O que ele mais queria, porém, era se tornar dono de um jornal. Estava em condições de comandar o negócio e de participar da sua redação. Um ano depois de chegar a Belém ele já era um dos redatores da coluna social de Armando Pinheiro na Folha do Norte. Com Soçaite, que passou a dividir com Pierre Beltrand (Ubiratan de Aguiar) e Cavaleiro de Macedo, saiu da retaguarda para a linha de frente do novo tipo de colunismo social, mais preocupado com os acontecimentos políticos e econômicos do que simplesmente com o mundanismo. Assinou outras colunas até comprar O Liberal, em 1966, finalmente realizando o maior dos seus planos.

 

Mas não foi simples nem pacífico fechar tumultuosamente sua cadeia de lojas, num episódio até hoje não bem explicado, e começar a carreira como dono de jornal, formando o maior império de comunicação do Pará e do norte do país. Apesar do veto que seus sucessores tentam impor à história, um dos problemas mais sérios que Romulo teve diante de si foi limpar o seu passado, pondo fim a acusações e suspeições.

 

Em março de 1960, por exemplo, o governador da então Guanabara (hoje Rio de Janeiro), o udenista Carlos Lacerda, incluiu o nome de Romulo entre contrabandistas de Belém, numa entrevista dada à televisão e reproduzida nos jornais. Lacerda nunca provou a acusação, mas ela teve grande repercussão na época, inclusive por citar nomes ainda mais famosos, como o do ex-governador Moura Carvalho.

 

Em 1974 esse tipo de nódoa ainda ecoava. Ela foi lembrada pelo jornal A Província do Pará, numa série de violentos editoriais, que caracterizaram um autêntico duelo verbal com O Liberal. A Folha do Norte, comprada por Romulo, era uma caricatura do poderoso jornal de Paulo e João Maranhão, e os dois grupos disputavam-lhe a sucessão, investindo numa tecnologia de ponta, a impressão ‘a frio’, em off-set.

 

Moralmente, A Província, que se considerava representante da família paraense, se proclamou vitoriosa. Mas, de fato, Romulo Maiorana foi quem ganhou. Superados os maiores obstáculos, ele conquistaria um poder sem paralelo na história da imprensa paraense, cujos ecos se fazem sentir até hoje, freqüentemente como cacofonia do passado.

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Jornalista, editor do Jornal Pessoal