Tuesday, 23 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Admiradores e amigos lamentam a morte de Millôr

** Luis Fernando Verissimo, escritor: “O que me impressionava no Millôr era que ele era um sujeito brilhante em qualquer situação. Não só escrevendo, mas produzindo ou numa simples conversa do dia-a-dia. Ele tinha uma mente realmente brilhante, era interessado por tudo e comentava todos os assuntos sempre de um jeito diferente e genial mesmo. O curioso é que os humoristas costumam ser pessoas tristes, mas o Millôr, não. Era uma pessoa absolutamente interessada pela vida. Houve uma vez em que fomos convidados para um encontro literário, em Passo Fundo, e o Millôr fez uma participação que foi absolutamente educativa. Ele fez um discurso que era um elogio à democracia, uma defesa aos direitos humanos. Então, assim que ele terminou a sua palavra, nos disse que o que ele havia lido era o discurso de posse do general Médici. Ou seja, disse para a gente não se empolgar muito com as palavras, que é para termos cuidado porque nem sempre elas passam ou representam a realidade. E esse ensinamento veio de um homem que era apaixonado e um estudioso das palavras.”

** Ziraldo, cartunista: “Uma vez deparei com um quadro do Magritte, que era um homem de terno e gravata, num plano americano, e no lugar da cabeça, um sol. Peguei aquela imagem e mandei para o Millôr com um recado: ‘Millôr, achei o seu retrato, foi o Magritte que te pintou’. O Millôr era isso: no lugar da cabeça, uma explosão de luz. Uma luz que se apagou. Para mim, ele era essa imagem. O Millôr detestava essa coisa de falar da pessoa depois da morte. Então é difícil acrescentar alguma coisa sobre o que ele foi. E é difícil porque não tenho nada de novo para dizer, entende? Éramos amigos, trabalhamos juntos… A gente estava esperando… A bruxa está solta. Na semana passada foi o maior humorista da TV, agora o maior humorista da imprensa… Acho que não estou me sentindo bem. É como a frase que ele dizia: ‘Cristo morreu, Newton morreu, Einsten morreu… E eu não estou me sentindo muito bem’.”

** Ana de Hollanda, ministra da Cultura: “É uma perda irreparável. Millôr acompanhou as nossas gerações todas. Ele tinha um humor muito inteligente, observador da realidade. Ele vai fazer falta. Foi muito importante para todos nós. O importante está aí. Os livros dele estão aí. Nós temos que pensar no que o escritor, o criador deixou de sua obra. Ele partiu, mas sua obra está aí. Temos que agradecer pelo que ele deixou.”

** Carlos Alberto Gouvêa Chateaubriand, presidente do MAM: “Millôr Fernandes era um artista completo. Dramaturgo, comediógrafo, cenarista, pensador, tradutor, adaptador. Tinha uma grande ligação com o MAM, onde fez duas exposições: uma individual, “Desenho Humorístico”, em setembro de 1957, e outra coletiva, “Arte Agora II/ Visão da Terra”, organizada pelo critico Roberto Pontual em maio de 1977, onde mostrou sua versatilidade como artista plástico em técnicas como óleo/tela, bico de pena, guache e colagem. É mais uma grande perda para a cultura brasileira.”

** Mauricio de Sousa, criador da Turma da Mônica: “Conheci o Millôr antes de ele ser Millôr Fernandes. Assinava Vão Gogo, na revista O Cruzeiro. Eu me alimentava com as tiradas geniais, algumas que, por ser muito jovem, nem entendia. Era um humor atilado, sofisticado. Com o tempo, fui perdendo o Vão Gogo e conhecendo a majestade do humor de Millôr. Nos últimos anos, acompanhei como e quando pude, aquela visão de mundo que ele nos passava. E aqui e ali, com críticas super-inteligentes, deixa um legado para a eternidade.”

** Dilma Rousseff, presidente da República, em comunicado: “Millôr Fernandes foi um gênio brasileiro, um ícone do humorismo. Brilhante jornalista, com a mesma maestria tornou-se escritor, cartunista e dramaturgo. Autodidata, traduziu para o português dezenas de obras teatrais clássicas. Atuou em diversos veículos de comunicação, além de ter sido fundador de publicações alternativas. Com sua morte, o Brasil e toda a nossa geração perdem uma referência intelectual.”

** Eduardo Paes, prefeito do Rio, em comunicado: “O Rio de Janeiro perdeu hoje, com a morte de Millôr Fernandes, não apenas um homem fantástico, mas grande parte de seu humor e leveza. Jornalista, escritor, desenhista, tradutor, humorista: são tantos os talentos desse carioca nascido no Méier que se tivesse de escolher uma palavra apenas para defini-lo seria ‘indispensável’. Millôr foi uma figura ímpar na história recente dessa cidade, tendo participado ativamente da fundação do Pasquim e da luta intelectual contra a ditadura militar. Mas, principalmente, por ter travado uma batalha incessante contra a ignorância política, os desvios éticos e a ‘legalização da corrupção’, sempre usando o humor afiado como sua principal arma.”

** Claudius Ceccon, cartunista, um dos fundadores do Pasquim: “Ter conhecido o Millôr quando eu tinha 16 anos e trabalhava na paginação de O Cruzeiro foi um privilégio. Privilégio maior foi ter mantido com ele durante todos esses anos uma relação de amizade e admiração. Podia eventualmente discordar de algo que dissesse, mas sua argumentação era sempre brilhante. Ele nos deixa um exemplo de profissionalismo, de independência beirando o anarquismo e da prática do mais elevado nível de humor a que se pode aspirar. Mestre do desenho, escritor, teatrólogo, tradutor, poeta, compositor – em tudo ele nunca foi menos do que excelente. Millôr nos deixa uma obra excepcional que permanecerá. Mas que falta ele nos faz!”

** Marcelo Madureira, humorista: “A bruxa está solta no humor. Ele mostrou ao mundo que o humorista é um intelectual. Não todos, é claro. E foi a duras penas, traduzindo Shakespeare, fazendo haikai. Uma vez, quando éramos jovens, eu e Helio de La Peña fomos à casa dele levar exemplares da revista Casseta Popular. Estávamos tremendo de medo, dois mortais diante de Zeus. Ele abriu a porta, pegou os exemplares, olhou para nós e disse: ‘Muito obrigado, façam sucesso e fiquem ricos.’ Espero que os vaticínios de Millôr, como Deus do humor, se cumpram. Fazer sucesso, fizemos, falta ficarmos ricos. Millôr inventou o frescobol, único esporte no mundo que não tem pontos. Agora querem fazer um campeonato de frescobol. Se estivesse vivo, ele condenaria, é a prova inequívoca de que a humanidade involui. Ele sempre teve posições muito firmes. Não entrou com pedido de bolsa-ditadura. Foi coerente. Dizia: ‘Não sabia que aquilo era investimento.’ Millôr Fernandes, do Méier para a eternidade.”

** Renata Sorrah, atriz: “A gente perde um grande homem e uma das maiores inteligências do país. Além de um grande escritor, um tradutor primoroso, porque um tradutor precisa ter um talento especial e um domínio completo da sua própria língua para poder passar para os outros o que um autor quer expressar. Ele traduziu as peças mais especiais da minha carreira, como Os veranistas (1978), de Górki, Afinal uma mulher de negócios, de Fassbinder, As lágrimas amargas de Petra von Kant (1982), também de Fassbinder, Grande pequeno (1985), do Botto Strauss, Encontrar-se (1989), de Pirandello, e Medeia (2004), de Eurípedes. Fora que, em 1977, eu fiz É…, com a Fernanda Montenegro e com o Fernando Torres, uma comédia maravilhosa, que foi um grande sucesso.”

** Eduardo Wotzik, diretor da peça Millôr impossível: “Foi o maior homem que eu conheci. Uma dessas poucas pessoas que você tem realmente prazer em conhecer. Foi ele que me explicou que a inteligência é a maior energia de vitalidade do ser humano. Morrem os apóstolos, os profetas… Mas o Millôr era o papa do humor. Era um sujeito surpreendente, com um espírito crítico refinado, e talvez o homem mais livre que eu já conheci. Ele era realmente capaz de transformar e melhorar a nossa vida com o que ele fazia. Talvez ele tenha as melhores peças, as melhores traduções, os melhores poemas, as melhores piadas e os melhores haikais. Ele não dava esmola, tudo que ele dava era o melhor. A peça que eu fiz se chamava Millôr impossível porque é impossível sintetizar o que ele era, e também porque ele sempre foi um moleque impossível.”

** Arnaldo Jabor, cineasta: “Em uma semana perdemos dois grandes humoristas do Brasil, Chico Anysio e, agora, Millôr. Com o trabalho deles, nós víamos as nossas vidas ao avesso, por um outro ângulo. Isso nos ilumina muito. Millôr era importante desde que trabalhava na revista O Cruzeiro, há muitos anos. Ele criou um tipo de humor muito culto, muito inteligente, instruído, influenciado por pessoas como o Steinberg. Além disso, era um grande tradutor, o Hamlet traduzido por ele é uma maravilha. Os dois não eram apenas humoristas, eram uma espécie de analistas ‘sociológicos’ da nossa vida cotidiana. Morrem dois grandes humoristas e ficam muitos palhaços vivos. Isso é uma coisa triste.”

** Sérgio Augusto, jornalista e escritor: “Conheci o Millôr em 1963, quando fui trabalhar como redator na revista O Cruzeiro. Tenho tanta coisa para dizer… eu achava ele o grande filósofo do Brasil. Ele foi a pessoa mais inteligente que conheci, o maior humorista e o maior frasista. É o nosso Bernard Shaw, o nosso Groucho Marx, nosso Saul Steinberg. Com a diferença de que os dois primeiros não sabiam desenhar e o Saul não sabia escrever. O Millôr juntava tudo isso. Ele era de uma versatilidade extraordinária. E era um franco-atirador, um autodidata, e se orgulhava disso. Não tinha formação universitária, dizia que tinha se formado na Universidade Livre do Méier! Acho que ele tinha um domínio da língua portuguesa como ninguém, e escrevia com uma concisão absoluta. Foi uma figura genial.”

** Arnaldo Branco, humorista: “O Millôr era o nosso maior satirista, o nosso Bernard Shaw, o nosso Steinberg. A morte dele equivale a uma fuga de cérebros. Era o jogador perfeito, o Pelé do humor, o cara com mais recursos, imune ao erro.”

** Sérgio Sant’Anna, escritor, à Globo News: “O humor em geral é rasteiro. Na busca da popularidade, tem a ânsia de facilitar. O Millôr não facilitava nada. Ele fazia de você, leitor, inteligente também. Isso era excepcional. As páginas dele eram sempre ilustradas: era palavra e imagem ao mesmo tempo.”

** Marcelo Tas, humorista e apresentador, pelo Twitter: “Ele dizia que não se evita o nascimento nem a morte e perguntava se não dava pra melhorar o intervalo? Mostrou que sim! Obrigado, mestre Millôr.”

** Gregorio Duvivier, ator, pelo Twitter: “Millôr não era só nosso melhor frasista. Era nosso melhor dramaturgo, nosso melhor poeta, nosso melhor artista plástico. Procurem saber.”

** Ed Motta, cantor, pelo Twitter: “Sempre encontrava o Millôr Fernandes no restaurante Satyricon aqui no Rio, ele gostava de frequentar no almoço, sempre muito simpático. RIP.”

** Serginho Groisman, apresentador, pelo Twitter: “Millôr Fernandes: um gênio que tratou de todas as questões com humor sofisticado. Deveria ser leitura obrigatória nas escolas.”

** Maurício Ricardo, cartunista, pelo Twitter: “Putz. Millôr e Chico. Em menos de uma semana perdemos uma fatia enorme da alma brasileira.”

** Ritchie, cantor, pelo Twitter: “R.I.P. Millôr Fernandes #sempalavras. Perder o Chico e o Millôr numa semana só é uma baita falta de humor.”

** Stepan Nercessian, ator, pelo Twitter: “O mundo vai ficando sem graça: adeus, grande amigo Millôr Fernandes.”

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Frases marcantes de Millôr Fernandes

** “Fiquem tranquilos os poderosos que têm medo de nós: nenhum humorista atira pra matar.”

** “O cadáver é que é o produto final. Nós somos apenas a matéria-prima.”

** “O homem é o único animal que ri. E é rindo que ele mostra o animal que é.”

** “Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados.”

** “Como são admiráveis as pessoas que não conhecemos muito bem.”

** “O otimista não sabe o que o espera.”

** “Eu também não sou um homem livre. Mas muito poucos estiveram tão perto.”

** “Nunca ninguém perdeu dinheiro apostando na desonestidade.”

** “Brasil, condenado à esperança.”

** “Brasil; um filme pornô com trilha de Bossa Nova.”

** “Todo homem nasce original e morre plágio.”

** “O dedo do destino não deixa impressão digital.”

** “Sabemos que Você, aí de cima, não tem mais como evitar o nascimento e a morte. Mas não pode, pelo menos, melhorar um pouco o intervalo?”

** “Repito um velho conselho, cada vez mais válido, sobretudo pro Congresso: Quando alguém gritar ‘Pega ladrão’, finge que não é com você.”

** “Quando os eruditos descobriram a língua, ela já estava completamente pronta pelo povo. Os eruditos tiveram apenas que proibir o povo de falar errado.”

** “A infância não, a infância dura pouco. A juventude não, a juventude é passageira. A velhice, sim. Quando um cara fica velho é pro resto da vida. E cada dia fica mais velho.”

** “Não devemos odiar com fins lucrativos. O ódio perde a sua pureza.”

** “Um Homem só é completo quando tem família; mulher e filhos. Desculpe: completo ou acabado?”

** “Deus é realmente um ser superior. Não há nada nem parecido no governo federal.”

** “Prudência: E devemos sempre deixar bem claro que nenhum de nós, brasileiros, é contra o roubo. Somos apenas contra ser roubados.”

** “Feliz é o que você percebe que era, muito tempo depois.”

** “Aprenda de uma vez: Se você acordou de manhã é evidente que não morreu durante a noite. A felicidade começa com a constatação do óbvio.”

** “Nem só comer e coçar é questão de começar. Viver também.”

** “Os ateus têm um Deus em que nem eles acreditam.”

** “O melhor do sexo antes do casamento é que depois você não precisa se casar.”

** “Tudo na vida tem uma utilidade – se não fosse o mau cheiro, quem inventaria o perfume?”

** “Voto de pobreza, obviamente só pode ser feito por rico.”

** “Errar é humano. Botar a culpa nos outros também.”

** “O problema de ficar na fossa é que lá só tem chato.”

** “Anatomia é uma coisa que os homens também têm, mas que, nas mulheres, fica muito melhor.”