Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Uma ombudsman que gosta de controvérsias

Na semana passada, a quinta ombudsman do New York Times, Margaret Sullivan, perguntou publicamente se o recém-nomeado diretor-geral do jornal – o ex-diretor-geral da BBC Mark Thompson – era a pessoa indicada para o emprego. Foi uma pergunta razoável, embora a resposta seja pouco clara. O publisher Arthur Sulzberger Jr. Continua, no entanto, apoiando Thompson. Também representou a declaração de independência que qualquer pessoa em sua posição deve assumir, mais cedo ou mais tarde. Margaret ocupa o cargo apenas há pouco tempo e, portanto, sua posição causou surpresa e elogios.

A tarefa de ombudsman do NYTimes é quase impossível. Não só as páginas do jornal (impressas e online) são submetidas a uma análise profunda, como também são as opiniões do ombudsman. Até agora, com base em seu desempenho, Margaret tem se saído muito bem, comenta Dan Gillmor [The Guardian, 26/10/12]. Gillmor foi, entre mais de uma dúzia de pessoas, procurado pelo jornal recentemente para se candidatar ao cargo. Como já havia escrito em julho, sua abordagem teria sido radicalmente diferente do que o NYTimes fizera até agora – e também consideravelmente diferente dos objetivos de Margaret.

Fundamentalmente, seu plano era diminuir o perfil do ombudsman e, proporcionalmente, aumentar o perfil do público, o seja, da audiência do jornal. Dito isso, e considerando as metas que Margaret estabeleceu para si própria, ela vem levantando as controvérsias que qualquer ombudsman deveria levantar. Gillmor não concorda com tudo o que ela escreveu e, às vezes, se espanta com sua escolha de temas. Mas ela vem expandindo o trabalho de maneiras inteligentes e quase sempre se conhece sua posição sobre determinado assunto.

O uso de fontes anônimas

Antes, a voz do ombudsman podia ser quase sempre encontrada numa coluna bi-semanal aos domingos, na seção de comentários, com eventuais posts no blog do ombudsman. Margaret mudou isso rapidamente. A coluna do ombudsman na edição impressa continua, mas não é ali que Margaret Sullivan faz seu melhor trabalho. Isso agora está em seu blog, Public Editor's Journal, onde textos de grande importância, como a questão de Mark Thompson, aparecem de forma muito mais oportuna, e onde ela pode trazer os leitores para o processo de uma maneira mais direta.

No início de seu mandato, ela questionou os editores do NYTimes pela forma como foi publicada a reação de Mitt Romney ao ataque contra um consulado dos EUA na Líbia, no qual o embaixador e três outros cidadãos americanos foram mortos. O jornal refez a matéria que estava em seu site, retirando várias citações de assessores de Romney e mudando, de forma fundamental, o tom do texto. Num texto cordial mas duro, escrito apenas algumas horas após a publicação pelo jornal da matéria refeita, Margaret disse que, na verdade, tratava-se de matérias diferentes e que ambas deveriam ter sido preservadas no site.

Assim como muita gente, Gillmor ficou satisfeito de ver a ombudsman criticar o fato de o jornal permitir que fontes vetassem citações – e ainda mais contente quando o NYTimes atualizou sua política de proibi-lo. É claro que o jornal também adota uma política sobre o uso desnecessário de fontes anônimas que desrespeita constantemente, portanto é preciso esperar para ver se a política referente às citações significa algo a sério. Espera-se que Margaret considere o uso desenfreado de fontes anônimas tão detestável como o consideraram seus antecessores. Seria um triunfo para ela se tivesse sucesso numa questão que os outros não conseguiram levar adiante – e uma vergonha, para a organização, compreender como esta prática põe em risco a credibilidade.

Trabalho admirável

É intrigante que Margaret tenha se aventurado por assuntos que têm pouco a ver com o jornalismo do NYTimes, pelo menos de forma direta. Bom exemplo disso, e bem-vindo, foi quando disse, no final do mês passado, que percebia uma desconexão entre palavras e atos do presidente Barack Obama no que se refere à liberdade de expressão, considerando os flagrantes ataques feitos ao jornalismo por seus informantes, assim como a predileção de seu governo pelo sigilo e outras atitudes que não dão atenção à Primeira Emenda da Constituição.

Possivelmente, o principal tropeço de Margaret Sullivan até agora foi em seu blog, sobre o freelancer Andrew Goldman, repreendido por seu editor pelos comentários que fez no Twitter sobre a atriz Tippi Hedren, que entrevistou para a revista de fim de semana do NYTimes. Goldman respondeu de maneira precipitada e rude às críticas de que realmente perguntara a Tippi se ela “conseguira o sucesso na cama”. “É possível acreditar que estamos falando disso em 2012?”, perguntou a ombudsman indignada, juntando-se aos críticos. Posteriormente, ela disse que teria sido uma boa ideia falar com ele antes de seu post original. Ele se negou a fazer comentários, em duas oportunidades após o post, no blog.

Margaret acomodou-se no coração do NYTimes, na redação, e muitas vezes cita a equipe editorial. Mas ela terá trabalho para manter sua independência e opiniões claras: os jornalistas estão entre as pessoas com mais nervos à flor da pele e opacas do planeta, sempre prontos a distribuir críticas e fazer perguntas embaraçosas, mas muitas vezes furiosos quando alguém põe em dúvida seus esforços. Se a ombudsman realmente representar o público, às vezes terá de questionar a equipe editorial de maneira dura. Será que ela irá futuramente concluir que deveria trabalhar em local diferente? Ela está convencida de que está no lugar certo. E, até agora, nada a contradiz.

Também é preocupante o ritmo frenético que ela se impôs em suas primeiras semanas no cargo. Ela diz que é ambiciosa e gosta de escrever muito; necessitará dessa energia, e muito mais, considerando a maneira que escolheu para interpretar o papel. Até agora, vem desempenhando um trabalho admirável.