Saturday, 20 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Mídia opõe-se a mudança na lei que permite remover arquivos da web

Uma coalizão de jornais e emissoras britânicas opõe-se a mudanças na lei que pode dar aos tribunais o poder de remover arquivos de matérias na internet. Um documento de consulta da Comissão Legal sobre uma reforma na lei de desacato ao tribunal levantou receios na indústria de mídia de que a proposta possa alterar fundamentalmente reportagens sobre crimes na era digital.

A Associação de Advogados da Mídia (MLA, na sigla em inglês), que representa jornais e emissoras, deverá apresentar uma resposta expondo preocupações sobre o número de propostas divulgadas no documento de consulta da comissão. Cada um dos principais grupos de jornais – inclusive a News International, que publica o Sun, a Associated Newspapers, que publica o Daily Mail, o Guardian News & Media, que publica o Guardian, e emissoras como a BBC, a ITV e a BSkyB – é membro da MLA. Alguns grupos de mídia podem preferir fazer submissões separadas antes do prazo final, que é 28 de fevereiro. A MLA deverá reunir-se nas próximas semanas para discutir sua resposta às possíveis mudanças.

Segundo as propostas apresentadas para consulta pela Comissão Legal, os juízes dos tribunais da coroa poderiam receber o poder de determinar aos jornais e emissoras a remoção temporária de material potencialmente prejudicial, mesmo que publicado há anos. Caso seja adotada, essa proposta significaria que os jornais poderiam ser processados por desacato ao tribunal devido ao material disponível em seus sites – mas publicado muito antes que um réu fosse detido ou acusado.

Comentários se confrontaram com a lei

É possível que a questão chegue a um ponto crítico em 2013. No ano passado, Adrian Fulford, juiz do tribunal da coroa de Southwark, determinou que o Daily Mail e o Daily Telegraph retirassem de suas edições as matérias sobre Simon Harwood – oficial da Polícia Metropolitana que foi declarado inocente do assassinato do vendedor de jornais Ian Tomlinson –, alegando que o material poderia influenciar a decisão dos jurados. Fulford é o juiz que preside o julgamento, previsto para este ano, da ex-editora-executiva da News International, Rebekah Brooks, acusada de perverter os rumos da justiça.

“Seria desnecessário, desproporcional e oneroso introduzir determinações de tribunal que exigissem concretamente que a mídia local identifique e remova material de seus arquivos”, disse Santha Rasaiah, diretora da Newspaper Society, que representa mais de mil jornais regionais e locais no Reino Unido. Santha acrescentou que já existe regulação para evitar julgamentos criminais de imprensa, inclusive a Lei de Desacato ao Tribunal, de 1981, e o código de prática da Comissão de Reclamações sobre a Imprensa (PCC, sigla em inglês).

David Burgess, vice-conselheiro-geral do Independent e do London Evening Standard, disse que o que deveria ser enfatizado são as orientações judiciais aos jurados no sentido de não procurarem material fora do tribunal. “O foco não deveria ser nas determinações do tribunal para controlar arquivos. A abordagem sensata, quando se procura garantir um julgamento justo, são as orientações judiciais firmes e claras ao júri para que não faça buscas independentes na internet”, acrescentou Burgess. “Somente em casos muito incomuns é que essas instruções deveriam se apoiar, ou ter como suplemento, determinações do tribunal. Além do mais, ao afirmar que uma publicação em arquivo cria um risco substancial de que o curso da justiça seja seriamente dificultado ou prejudicado, o candidato deveria ser obrigado a demonstrar por que as orientações judiciais ao júri não seriam eficazes em cada caso individual”, afirmou.

A consulta sobre desacato ao tribunal vem num ano em que os comentários sociais no Twitter e no Facebook se confrontaram diretamente com a lei. Os jogadores de futebol Rio Ferdinand e Joey Barton publicaram uma série de tuítes sobre o julgamento do zagueiro do Chelsea John Terry, que foi considerado inocente da acusação de racismo contra Ferdinand, em julho.

Novas restrições

David Banks, consultor de direito de mídia e coautor de Essential Law for Journalists, descreveu as propostas como “não realistas”. “É a legislação acreditando que pode isolar o Reino Unido do resto da internet, o que é simplesmente impossível. Estas propostas vão criar um enorme peso para os jornais no Reino Unido ao mesmo tempo em que ignoram aquilo que se pode acessar na internet. Os poderes dados aos juízes britânicos poderiam não ter qualquer efeito nos sites com sede no exterior”, disse.

Banks acredita que a resposta seria educar os jurados sobre a importância de se manter o foco sobre as provas que são ouvidas no tribunal, e não conduzir pesquisas na internet. Ele disse, ainda, que o advento das redes sociais, inclusive o Facebook e o Twitter, tornou novas restrições de desacato ao tribunal pelos jornais ainda mais problemáticas. Informações de Josh Halliday [The Guardian, 4/1/13].