Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

MIT divulga relatório sobre processo contra hacker

O Massachusetts Institute of Technology (MIT) divulgou na terça-feira (31/7) seu relatório ao presidente a respeito do envolvimento do instituto no processo contra Aaron Swartz. Em janeiro de 2011, ele foi preso depois de usar o acesso de uma visita à rede Ethernet do MIT para fazer o download de vários milhões de páginas de documentos do JSTOR, uma biblioteca digital de arquivos sem fins lucrativos. Os procuradores federais acusaram-no de vários crimes, mas principalmente da violação da Lei de Fraudes e Abusos de Computador (CFAA). No total, as acusações poderiam ter condenado Swartz a mais de 30 anos de prisão. Posteriormente, ele suicidou-se – e muita gente acredita que o fez devido ao peso de suas batalhas legais.

Algumas pessoas, como o presidente do MIT, L. Rafael Reif, comentaram que o relatório seria uma justificativa da “posição correta” da instituição naquela época. Taren Stinebrickner-Kauffman, ex-parceira de Swartz, classificou-o de uma “maquiagem da realidade”. Outros, como Andrew Leonard, do site Salon, consideraram o relatório uma prova de que o MIT traiu sua cultura hacker.

De que se trataria, afinal? Para Peter Ludlow, do The Chronicle of Higher Education, nada do já citado. Na realidade, o relatório é uma condenação profunda do fracasso mais amplo do MIT em desenvolver as necessárias ferramentas de interesse e pensamento crítico exigidas para um envolvimento em questões importantes vinculadas à tecnologia, ao direito e a uma política social.

Relatório tecnicamente neutro

Quando Swartz era alvo dos procuradores federais, o MIT assumiu uma posição de “neutralidade” em relação ao caso; não apoiaria a defesa nem a acusação. O problema com a simulação do MIT de ser um espectador neutro estava nas acusações relacionadas à CFAA. Entre outras coisas, essa lei considera crime o acesso não autorizado a uma rede de computadores. Mas o acesso feito por Swartz fora “não autorizado”? O relatório defende que, considerando a legislação vigente, a resposta parecer ser não.

Além disso, segundo o relatório, o MIT não “se perguntou” se sua política de acesso fora, na realidade, violada. A questão é importante porque “… essa política e essas regras foram escritas, interpretadas e aplicadas pelo MIT para atender à própria missão e objetivos do MIT – e não aos do governo”. Em outras palavras, o MIT estava numa posição que permitia emitir um juízo, o que não era o caso do governo. Não caberia ao governo interferir no caso.

O relatório também esclarece que, na melhor das hipóteses, o MIT foi neutro num sentido técnico: “Em consequência das diferenças nos poderes, na sincronização e nos objetivos das duas partes no caso, a neutralidade nas respostas não foi consistente com a neutralidade nos resultados.” O relatório destaca, por exemplo, que o MIT “poderia ter fornecido automaticamente à defesa uma cópia de todos os documentos solicitados pela acusação, ao invés de esperar por uma nova citação por parte da defesa. Da mesma forma, poderia ter oferecido uma entrevista pela defesa com todos os empregados entrevistados pela acusação”. E não o fez.

Os estudantes não compreenderam?

O relatório também destaca que o MIT repassou para a procuradoria de acusação várias comunicações eletrônicas interceptadas sem ter sido citado, o que a defesa argumentou “violar a Quarta Emenda e a Lei de Comunicações Armazenadas”. Poderia ser questionado se o MIT violou a lei ao interceptar e repassar os documentos, mas é totalmente orwelliano caracterizar tais ações como “neutras”.

No entanto, a crítica do relatório vai muito além dos problemas com os administradores. E a questão essencial começa com o seguinte, e espantoso, parágrafo:

“Ao avaliar se deveria ser mantida a posição de neutralidade do MIT, o departamento do Conselho Geral [Office of General Counsel – OGC] começou por questionar se Aaron Swartz estudava no MIT. Ao tomar conhecimento de que ele não era, a maioria das pessoas consultadas concordou que era apropriado manter a neutralidade. Do mesmo modo, a detenção e acusação de Aaron Swartz provocou poucas reações por parte da comunidade do MIT, inclusive estudantes.”

Em outras palavras, as ações da administração refletiram as opiniões da comunidade mais ampla. Mas aí chega-se a um problema mais profundo. Como é que os estudantes e os professores no MIT não compreenderam que este caso iria afetar suas vidas de uma maneira crucial? Todos eles poderiam ser detectados pela CFAA tanto em suas atividades profissionais quanto pessoais. (Por exemplo, poderia considerar-se uma violação da CFAA mentir sobre sua idade no site de encontros afetivos Match.com e o Departamento de Justiça argumentou, em seu caso contra Andrew Auernheimer, que é uma violação da CFAA reter páginas da internet que não são protegidas quando seu dono não pretende que elas sejam vistas.)

Perguntas para todas as instituições educacionais

Como é que aqueles estudantes não perceberam que o caso tinha a ver com eles? Posteriormente, numa entrevista, Hal Abelson, o principal autor do relatório, foi ainda mais claro a respeito desse ponto: “Uma das coisas que chamou minha atenção foi que não havia quase nada sobre os estudantes do MIT nesta questão. Não havia quase nada sobre os professores do MIT.”

Portanto, o relatório termina com várias perguntas que sugerem que a comunidade do MIT precisa conscientizar-se. Um grupo de perguntas que se destacam é: “O MIT tem a responsabilidade de preparar melhor os nossos estudantes para lutarem, com a ética das decisões que enfrentam, à medida que prosseguem em busca de novas tecnologias a serem usadas no mundo? Deveria o MIT proporcionar oportunidades aos estudantes para que compreendam melhor a maneira como tratar as consequências de suas decisões como parte de sua educação tecnológica?”

Supõe-se que as perguntas sejam retóricas e estejam sendo formuladas como uma maneira de dizer que o MIT não está preparando os estudantes de maneira adequada a tratarem destas questões. Em outras palavras, sugere-se que o MIT não está preenchendo algumas de suas responsabilidades educacionais fundamentais – falhas que, posteriormente, se irão refletir em decisões ruins por parte dos administradores do MIT.

É claro que as perguntas retóricas formuladas pelo relatório não são apenas dirigidas ao MIT; são perguntas para todas as instituições educacionais. Teriam os estudantes de nossa universidade se envolvido? Teriam compreendido que o caso afetava suas vidas de maneira significativa? Estarão eles preparados para enfrentar questões tão complexas no futuro? Caso não estejam, podemos esperar mais de nossas comunidades universitárias mais amplas?

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Peter Ludlow é professor de Filosofia na Northwestern University