Thursday, 18 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Especialistas defendem movimento europeu por internet livre

Após as revelações de Edward Snowden, ex-funcionário da Agência de Segurança Nacional dos EUA (NSA), sobre como o governo de seu país monitora a internet, a ideia de que existem comunicações privadas na rede passou a ser vista como ficção; a já frágil confiança na web global como veículo de comunicação e armazenamento de dados foi duramente atingida. Embora muitos não compartilhem do ponto de vista e não concordem com as atitudes de Snowden, existe um interesse comum em encontrar um modo de restaurar a confiança nas comunicações online. Um estudo escrito por Georg Mascolo, ex-editor-chefe da revista alemã Der Spiegel e professor visitante da Universidade de Harvard, e Ben Scott, conselheiro do Instituto de Tecnologia Aberta da New America Foundation e diretor do programa European Digital Agenda da Stiftung Neue Verantwortung, aborda como isso poderia ser feito.

As informações de vigilância na rede vazadas por Snowden não foram novidade para muitas pessoas envolvidas no mercado de tecnologia ou especialistas em legislação referente à tecnologia. Se é algo legal, tecnicamente possível e disponível, está sendo realizado por muitos países. A falta de reação da maior parte dos governos – com poucas exceções, como Brasil e Alemanha – sugere que ninguém ficou surpreso com as revelações. Os documentos apresentados por Snowden ajudam a demonstrar o que os governos toleram, em segredo, uns dos outros.

Se Snowden queria proteger a internet aberta e livre da vigilância massiva com suas revelações, isso talvez nunca esteve tão em risco. Na realidade, os dados vazados por ele podem, diz o estudo, ter piorado a situação. Agora, há muito reconhecimento e concordância de que o atual equilíbrio entre segurança e liberdade afastou-se dos valores democráticos. Mas não houve respostas para os direitos dos cidadãos na internet. Muitos países simplesmente nada fizeram; outros – especialmente Brasil e capitais da Europa – questionaram a “soberania tecnológica”. Para os que defendem a liberdade da internet, nenhuma das duas reações é positiva.

Rumo a uma nova política mundial

Hoje, a lógica das agências de inteligência – “não confie em ninguém” – contamina a internet e degrada seu valor social e econômico para o mundo. Mascolo e Scott destacam três componentes importantes desse processo. Primeiro, é preciso haver um debate público sobre essas questões. Segundo, devem ser construídos conjuntamente padrões comuns na rede. Em terceiro lugar, a Europa deve liderar esse processo e apresentar um caso unificado aos EUA. As ameaças do Brasil têm o espírito de uma indignação justa, mas não produzirão a política correta ou mudança a nível internacional. A Europa, se conseguir ser organizada, tem influência geopolítica e incentivos corretos para liderar um movimento.

Para começar, dizem os professores, a Europa deve colocar suas próprias cartas na mesa. Já se sabe muito sobre a NSA, mas os sistemas de inteligência europeus continuam desconhecidos. Não se pode protestar sobre um sistema de vigilância americano que tem como alvo estrangeiros se o seu governo estiver fazendo o mesmo. Um novo estudo apontou que Europa e EUA seriam bem parecidos em relação à legislação e à política de vigilância.

A vigilância não vai desaparecer: é uma ferramenta fundamental da aplicação da lei e combate ao terrorismo. Mas seu crescente poder na era da internet deve ser limitado. A Alemanha, defendem Mascolo e Scott, é uma escolha lógica para liderar esse trabalho devido à sua própria história com o totalitarismo no século 20 e por seu forte apoio cultural à privacidade e limites do controle estatal sobre a liberdade individual. Com recentes relatos de que o telefone da chanceler Angela Merkel teria sido monitorado pela NSA, as pressões políticas por respostas crescerão.

A Europa poderia se organizar em torno de uma nova política de práticas restritas de vigilância para ser aplicadas sobre todos os cidadãos da União Europeia – na verdade, fazendo cumprir o que já é teoricamente obrigação sobre a proteção da privacidade no âmbito da Convenção Europeia dos Direitos Humanos.

Se a União Europeia se unir em relação ao novo padrão, a indústria global da internet seria uma aliada – liderada pelos titãs do Vale do Silício. Juntos, teriam forças para, com os grupos da sociedade civil nos EUA e no mundo, forçar uma mudança em Washington.

>> Leia o estudo, em inglês, aqui.