Saturday, 11 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1287

Em busca do conteúdo viral, mídia cai em pegadinhas

A verdade nunca foi um ingrediente essencial do chamado “conteúdo viral” que circula pela internet. Mas, na acirrada competição por leitores, sites de notícias estão cada vez mais borrando a linha entre fato e ficção, justificando esta falta de cuidado com a precisão como parte do jogo do jornalismo online.

Diversas histórias recentes divulgadas por sites de notícias internacionais, com milhões de visualizações, acabaram mostrando-se falsas. Entre elas, um relato no Twitter sobre uma briga em um aeroporto no Dia de Ação de Graças por conta de um atraso no voo; uma carta de uma criança para o Papai Noel que trazia um link para a loja virtual Amazon; e um artigo sobre pobreza que acabou arrecadando 60 mil dólares em doações. A falsa briga no Twitter, segundo seu autor, era um “conto de ficção”; a carta para o Papai Noel tratava-se de uma piada de um humorista; e o ensaio sobre a pobreza era mais um relato impressionista do que factual.

Os criadores das farsas na rede as descrevem como performances artísticas online, sem a pretensão de ser levados a sério. Mas os veículos de mídia que os publicaram acabaram por representar estes casos com um misto de emoção e entretenimento que atrai leitores digitais e também a receita publicitária.

O difícil equilíbrio

Na web, ao que parece, depois de publicar uma informação sem verificação, basta dizer que não sabia que ela era falsa e deixar para lá. “Você vê organizações de notícias dizerem ‘Se está acontecendo na internet, este é o nosso foco’”, afirma Joshua Benton, diretor do Nieman Journalism Lab da Universidade de Harvard. “A parte de descobrir se isso aconteceu realmente ou não é dever de outra pessoa”.

O problema é que os sites de notícias que publicaram estes casos fictícios, como Gawker, Buzzfeed e Huffington Post, não veem os contos virais como estando em desacordo com o conteúdo sério publicado paralelamente em suas páginas. Os editores desses sites reconhecem que é difícil equilibrar precisão com a necessidade de se agir rapidamente na era digital. “Estamos lidando com um grande volume de informações e é impossível ter o rigor que outras instituições possuem”, diz John Cook, editor-chefe do Gawker.

Mas Elan Gale, autor do tal conto fictício sobre a briga em um avião que chegou a atrair 1,5 milhão de visualizações para o BuzzFeed, não está convencido. Segundo ele, ninguém entrou em contato para verificar a história. “Meus seguidores sabem que o que eu faço é ficção. São as pessoas que publicaram essa história que estão enganando seus leitores”, defende-se. Segundo o BuzzFeed, seus repórteres tentaram entrar em contato com Gale pelo Twittter, sem sucesso.

Segundo Lisa Tozzi, diretora de jornalismo do BuzzFeed, o site deve continuar a acompanhar as últimas notícias das mídias sociais porque é “onde vivem nossos leitores”. Benton, do Nieman Lab, discorda. “Este jornalismo é somente o ato de apontar. ‘Ei, olhe ali, isto é interessante’”, afirma, resumindo a questão: a incerteza sobre a veracidade de uma história não é um obstáculo para a postagem dela.