Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

A importância das ONGs em defesa dos profissionais de imprensa

Em meu tempo como repórter e editor, os jornalistas passaram de uma espécie protegida a alvo. Na década de 1950, os rebeldes de Fidel Castro no interior de Cuba davam salvo-conduto aos jornalistas norte-americanos para que estes pudessem contar sua história ao mundo.

No início deste século, um comando da al-Qaeda assassinou brutalmente um colega meu, filmando o crime para fazer um vídeo de propaganda. Nos últimos anos, na Rússia, no México e nas Filipinas, e em muitos outros lugares, repórteres são espancados e assassinados com impunidade para calar seu trabalho e intimidar outros a adotar a autocensura.

Esse apetite por sangue contra nós exige que tenhamos uma reação e o denunciemos, como faria qualquer outra categoria profissional sofrendo um ataque mortal. Na realidade, o tema central desta conferência [Making the Protection of Journalists a Reality: Time to End Impunity] é como fazer isso da melhor maneira; destacá-lo e fazer a impunidade retroceder; apelar para leis antigas e aprovar outras novas.

Há uma diferença importante em nosso papel profissional quando divulgamos atrocidades em que vítimas são nossos irmãos. Nosso trabalho é dar informações justas e honestas. Quando o Egito detém repórteres sob o pretexto de que eles colaborariam com a Irmandade Muçulmana, por mais que consideremos isso absurdo, temos o dever de pelo menos levantar esse ponto em nosso questionamento. Quando rabiscamos ou gravamos citações de seus editores e produtores, temos que questioná-los com o mesmo cuidado e ceticismo com que fazemos com outros atores desses dramas.

A defesa dos jornalistas que correm riscos

Então, o que fazemos? Como podemos caminhar ao mesmo tempo dos dois lados da rua?

Uma resposta é que devemos cuidar de nosso trabalho: enfatizar a informação obtida de fontes que o nosso senso profissional considera fidedignas e descartar aquela que vem de fontes que não o são.

Em segundo lugar, devemos lembrar que é importante cobrir de modo agressivo os ataques à imprensa, não só em nome da solidariedade profissional, mas por causa das ameaças que esses ataques representam para a sociedade como um todo. Uma sociedade mal informada é menos democrática; seu governo é menos responsável.

Finalmente, e pelo menos tão importante, devemos fazer a nossa parte para garantir que existam defensores dos interesses dos jornalistas com credibilidade e que estão atentos para casos em que um comentário breve, mas profundo, pode ser fundamental.

Essas pessoas podem enfatizar que, mesmo quando são cooptados numa operação militar, os repórteres estão ali para dar seu testemunho, e não para pegar em armas; que o jornalista que foi visto conversando com um militante suspeito estava fazendo uma reportagem, e não passando informação sobre a passagem da próxima patrulha; ou que o processo pelo qual as autoridades conseguiram acesso aos registros telefônicos do jornalista foi legalmente suspeito e que os registros deveriam ser destruídos ou devolvidos ao citado repórter.

Uma defesa bem informada e sofisticada dos jornalistas que correm riscos pode vir de suas próprias organizações jornalísticas, mas muitas vezes – principalmente para blogueiros ou freelancers que não pertencem a organização alguma – vem de grupos como o Comitê para a Proteção dos Jornalistas, o Comitê de Repórteres pela Liberdade de Imprensa, o Centro pela Liberdade da Mídia ou a Repórteres Sem Fronteiras.

Questão de vida ou morte

Essas entidades precisam de nosso apoio e do apoio das plataformas para as quais trabalhamos, ou das instituições que se beneficiam do trabalho dos jornalistas, como os desenvolvedores de software e hardware, as operadoras de cabo e as teles, os mecanismos de busca e as redes sociais.

A partir de minha experiência como ex-presidente do Comitê para a Proteção dos Jornalistas e atualmente membro da direção do Comitê de Repórteres pela Liberdade de Imprensa, está mais difícil levantar dinheiro junto às organizações jornalísticas tradicionais pelo simples motivo de que, considerando tudo o que gastaram em seus negócios, dispõem de menos verbas. Mas as outras instituições vêm contribuindo – em alguns casos, muitíssimo bem – e devem ser incentivadas a fornecer apoio, como algumas já vêm fazendo.

Só porque as organizações jornalísticas apoiam grupos que lutam pela liberdade de imprensa (e os jornalistas, naturalmente, simpatizam com isso), isso não significa que os jornalistas devam acessar tais grupos com menos ceticismo do que fazem com qualquer outra fonte. Fazer um jornalismo investigativo do trabalho dos grupos que lutam pela liberdade de imprensa melhora a qualidade de sua pesquisa e protege os grupos de seus próprios erros.

Pode parecer estranho citar ou divulgar os comentários de organizações a que ajudamos a levantar dinheiro, mas é preferível que essas vozes existam e sejam suficientemente sólidas e bem informadas para influenciar o público. Esta pode ser uma questão de vida ou morte para nossos corajosos colegas que reportam as notícias.

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Paul Steiger é diretor-executivo, editor e cofundador da ProPublica. O artigo acompanha a conferência Making the Protection of Journalists a Reality: Time to End Impunity [“Tornando a proteção de jornalistas realidade: hora de dar fim à impunidade”, em tradução livre], realizada esta semana em Londres.