Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Casa Branca tem sistema de distribuição de furos

O governo do presidente Barack Obama é avaliado como um dos menos amigáveis para com a imprensa. A opinião geral da imprensa americana é que a Casa Branca prejudica o jornalismo independente ao limitar a cobertura de suas realizações e eventos. Jill Abramson, ex-editora-executiva do New York Times, declarou que esta é a administração mais reservada que ela já cobriu. Já o repórter James Risen, que sofre pressão para revelar a identidade de uma fonte, é mais direto: “Eu acho que Obama odeia a imprensa”.

Agora, há uma nova polêmica no ar. Em reportagem para o Washington Post, o jornalista Paul Farhi diz que o governo Obama tem “vazado” press releases para veículos e jornalistas escolhidos a dedo. Farhi afirma que ocorre uma espécie de estratégia de segmentação de mercado, a qual orienta a liberação de material a quem for mais conveniente.

Ele diz, por exemplo, que o New York Times tende a ser favorecido para assuntos de política externa e ligados à segurança nacional. Já o Wall Street Journal e a Bloomberg Newssão o alvo quando o tópico envolve a evolução das políticas econômicas. E o Washington Post é o favorito para questões orçamentárias e de agências governamentais. O site Politico é um dos preferidos para notícias sobre mudanças nas equipes do governo. E a Associated Press e o USA Today – a maior agência de notícias e o jornal de maior circulação do país, respectivamente – ficam com tudo o mais que sobrar.

Algumas publicações regionais também entram na lista. Durante os resgates da indústria automobilística, por exemplo, os jornais em Michigan e Ohio – sede de muitas das grandes fábricas de automóveis – foram, por vezes, cotados para anúncios da Casa Branca.

Assessores de comunicação de Obama também expõem viagens presidenciais ou iniciativas regionais, oferecendo informações exclusivas para veículos de comunicação nas proximidades dos eventos: a WCCO-TV (afiliada da emissora CBS em Minneapolis) foi uma que recebeu informações sobre um encontro do presidente com uma moradora local.

Enquanto isso, o restante da imprensa, incluindo jornalistas que a Casa Branca considera “especialmente difíceis” ou “ideologicamente hostis”, ficam a ver navios e são deixados para perseguir o “vazamento oficial” do dia por conta própria.

Times nega favorecimento

Quando David E. Sanger, o correspondente para assuntos de segurança nacional do New York Times, publicou uma reportagem bombástica sobre o papel do governo Obama em ataques cibernéticos contra o Irã, em junho de 2012, imediatamente houve desconfiança de que a pauta havia sido um “presente de ano eleitoral” da própria Casa Branca para o diário.

Sanger nega as acusações e diz que a apuração da reportagem levou um ano e dois meses; ele também justifica que, considerando que a reportagem indicava falhas graves no ataque cibernético dos Estados Unidos, seria estranho apontar o material como uma história de sucesso da administração Obama.

Em busca de notoriedade

Um ex-assessor de comunicação do presidente – que aceitou se pronunciar sob anonimato – confirmou ao Post os contornos básicos da abordagem segmentada, informando que há, sim, uma seleção das agências de notícias e de seu pretenso público na hora de enviar os releases, além de uma consideração das nuances e competências dos jornalistas envolvidos.

Peter Baker, um veterano na cobertura da Casa Branca pelo Times, diz que as táticas da administração Obama são bastante semelhantes às do governo de Bill Clinton. “No governo de George W. Bush não existia esse tipo de ‘vazamento’. A Casa Branca geralmente agia sob a premissa de que, se o presidente iria anunciar alguma coisa, não haveria porque revelar nada a ninguém de antemão e todo mundo iria ficar sabendo ao mesmo tempo”, explica.

Baker diz, no entanto, que o formato adotado pela equipe de Obama é mais vantajoso à Casa Branca. Como há um caráter de exclusividade nos vazamentos segmentados, pois nem todos os veículos receberam os releases, os jornais que foram agraciados tendem a dar mais destaque ao assunto; e aqueles que não receberam o material vão ecoá-lo durante dias depois, aumentando mais ainda a notoriedade do tema em questão.

Procurada pela reportagem do Washington Post, a Casa Branca se recusou a fazer qualquer comentário a respeito.