Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

ABC às voltas com o moralismo

A batalha contra a indecência na TV americana ganhou mais uma controvérsia: 66 das 225 emissoras afiliadas à rede ABC se reusaram a transmitir o filme O resgate do soldado Ryan por conter muitas palavras chulas. Com isso, o filme, que poderia chegar a 10 milhões de telespectadores, foi assistido por apenas 7,7 milhões.

Para Ann Oldenburg [USA Today, 15/11/04], os números mostram a extrema precaução das emissoras com o conteúdo que levam ao ar. Depois do incidente com a cantora pop Janet Jackson no intervalo do Super Bowl e do recente episódio do cantor de rock Bono Vox, que foi condenado por usar palavrão na entrega do prêmio Golden Globe, a Comissão Federal de Comunicações (FCC, sigla em inglês) tem apertado o cerco contra as emissoras.

O caso de Janet, que mostrou o seio num dueto com o cantor Justin Timberlake, rendeu 542 mil reclamações à FCC, que aplicou multa recorde, num total de US$ 550 mil, às estações da CBS. Bono, repreendido pela postura, não recebeu multa.

Deborah McDermott, presidente da diretoria de afiliadas da ABC e da Young Broadcasting, que é dona de seis estações da rede, afirmou que ‘as emissoras estão preocupadas e cautelosas com o que levam ao ar’. Segundo Deborah, as estações da Young receberam toneladas de ligações de telespectadores querendo ver o filme de Steven Spielberg – às vésperas do Dia dos Veteranos nos EUA, houve muita discussão nas afiliadas sobre a conveniência da transmissão. Advogados foram consultados e a ABC tentou assegurar aos gerentes das estações de que pagaria eventuais multas. Contudo, um problema maior não poderia ser garantido pela rede: reclamações também podem colocar em jogo a renovação da licença de funcionamento das emissoras. ‘Nós queríamos passar o programa, mas de nosso ponto de vista isso seria contra a lei’, disse Deborah.

Grupos de observadores da mídia americana que lutam por maior restrição à obscenidade, como a Associação da Família Americana (AFA), são cada vez mais ouvidos pela FCC e pelo Congresso. Segundo Randy Sharp, da AFA, foram enviados e-mails aos associados do grupo contendo instruções sobre como reclamar do filme O resgate do soldado Ryan. ‘Eu acredito que de 10 mil a 15 mil reclamações tenham sido feitas no total’, disse.

No entanto, até a tarde de 12/11, a porta-voz da FCC disse que apenas ‘algumas’ reclamações foram recebidas. Segundo ela, não existe uma cena especifica para que uma determinação seja feita, ou uma multa estabelecida. O processo requer que as reclamações sejam revistas, que se faça uma investigação e que se dê um tempo para que as emissoras respondam. No caso da Janet Jackson, o processo levou sete meses para ser concluído.

Mais uma polêmica

Judy Battista [The New York Times, 17/11/04] reportou outro incidente que deu o que falar aos telespectadores americanos mais conservadores. Com a Liga Nacional de Futebol Americano ainda se recuperando do episódio com Janet Jackson transmitido pela CBS em fevereiro, no dia 15/11 foi a vez de a ABC causar polêmica.

Na abertura do programa Futebol de Segunda à Noite, a atriz Nicollette Sheridan (que atua na série de TV Desperate housewifes) apareceu vestindo apenas uma toalha na frente do jogador Terrel Owens, do Philadelphia Eagles, no vestiário vazio. Na encenação, a atriz tentava convencer Owens a não jogar naquela noite. Para tanto, tirou sua toalha. A câmera mostrou a parte superior das costas da atriz nua e o jogador sorrindo dizendo que os Eagles teriam que ganhar sem ele naquele dia.

No dia seguinte os dirigentes da Liga reclamaram, dizendo que a encenação era inapropriada para o público que assiste ao programa, que enviou centenas de reclamações. A ABC Sports, que também recebeu queixas, desculpou-se e declarou que concorda que a apresentação foi inapropriada.

É uma prática normal da ABC gravar esquetes de introdução ao programa, mas a Liga só vê as peças quando elas são transmitidas nas segundas-feiras. Depois do episódio com Janet Jackson, anunciou que aplicaria um delay (atraso) de cinco segundos em suas transmissões de futebol americano, para evitar constrangimentos.