Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Analistas militares e conflito de interesses

Em abril do ano passado, o New York Times publicou uma reportagem investigativa sobre um programa de relações públicas do Pentágono que tinha como objetivo inserir militares aposentados como analistas de assuntos de guerra em TV e rádio, a fim de obter uma cobertura favorável ao governo do ex-presidente George W. Bush na guerra ao terror. O artigo revelou que o programa acabava beneficiando tais analistas, já que muitos deles tinham relações com empresas ligadas ao Departamento de Defesa. Além disso, eles também tinham acesso atípico a informações confidenciais do Pentágono.

Há pouco mais de uma semana, o gabinete do inspetor-geral do Departamento de Defesa concluiu que o programa não violou as políticas e regras do Pentágono e que os investigadores não encontraram um caso sequer no qual informações ou contatos foram usados para obter ‘vantagens competitivas para suas companhias’. Na opinião de Steve Capus, presidente da emissora NBC News, a conclusão ‘destrói a premissa’ do artigo do NYTimes. Clark Hoyt, ombudsman do jornalão, discorda [25/1/09].

A matéria original, assinada pelo jornalista David Barstow, questionava se o programa era apropriado, mas não o acusava de ser ilegal ou contra as regras. Se nenhum militar que fez comentários na TV obteve vantagem de algum cliente comercial, não foi por falta de tentativa. Um exemplo é o do coronel aposentado John C. Garrett, analista da Fox News e lobista de uma empresa que representa companhias militares, que disse no artigo que o acesso que obteve por meio do programa de informação o ajudou a identificar oportunidades de negócios para seus clientes.

‘Decepcionante’

Segundo o senador democrata Carl Levin, presidente do comitê de Serviços Armados do Senado, o relatório do Departamento de Defesa foi ‘decepcionante’. O documento revelou, por exemplo, que um general aposentado havia sido excluído do programa porque criticou a conduta da guerra no Iraque, e que um funcionário do programa de relações públicas chegou a pedir ao Pentágono que mantivesse uma equipe de analistas ‘amigáveis e de confiança’. Ainda assim, o inspetor-geral disse não ter encontrado ‘evidências suficientes’ de que o Pentágono estava tentando recompensar comentaristas favoráveis e punir os críticos. Levin afirmou ter expectativa de que outros dois relatórios que devem ser divulgados em breve – feitos pela Comissão Federal de Comunicações e pelo Government Accountability Office, agência que avalia atividades do poder executivo – ‘sejam mais objetivos e criteriosos’.

Steve Capus questionou a atitude do NYTimes ao escalar Barstow para escrever também sobre o relatório do gabinete do inspetor-geral, alegando que se tratava de um conflito – já que ele foi autor da primeira matéria. Na opinião de Hoyt, isto não se aplica, pois o relatório não colocava o repórter em questão e, em geral, repórteres investigativos costumam escrever as suítes de suas pautas. A NBC não ficou satisfeita com o artigo de abril do NYTimes, pois houve predomínio de fotos da emissora e da MSNBC, com destaque para seus analistas mais conhecidos, como Barry R. McCaffrey – excluído do Pentágono por criticar o modo como o ex-secretário de Defesa Donald Rumsfeld conduzia a guerra no Iraque.

Matthew Purdy, editor da seção de reportagens investigativas do jornalão, afirmou que as fotos tinham a intenção de mostrar a ubiqüidade dos analistas na TV e que o artigo deixava claro o papel deles. No texto, não é citado que McCaffrey criticou Rumsfeld, apenas que ele trabalhava como consultor pago em diversas companhias militares.

Longa investigação

O que os leitores não sabem, diz Hoyt, é que a matéria de abril seria a primeira de uma série, junto com um outro artigo focando apenas em McCaffrey. Este último foi publicado apenas em novembro, e sugeria que o militar fazia parte de uma equipe de generais aposentados com interesses comerciais em ser analistas de TV e rádio. O artigo citava uma carta escrita por McCaffrey ao general David Petraeus, então comandante americano no Iraque, em nome de uma pequena empresa que tentava vender tanques blindados. Na mesma semana, ele elogiou o general na CNBC e testemunhou no Congresso a favor de mais tanques blindados no Iraque.

McCaffrey ficou irado com o artigo, embora tivesse recusado diversos pedidos de entrevista de Barstow, que também escreveu a matéria em questão. O repórter afirma que não teve intenção de acusar McCaffrey de fazer algo ilegal ou antiético. Ele queria apenas revelar potenciais conflitos de interesse.