Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Perdão presidencial a jornal pode ser manobra política

O Equador não costuma atrair muita atenção internacional, diz artigo da Economist [3/3/12]. A situação mudou no ano passado, no entanto, quando o presidente Rafael Correa decidiu ir aos tribunais para afundar um dos principais jornais do país e, de quebra, intimidar o resto da imprensa nacional. Correa processou o jornal El Universo e um de seus colunistas por causa de um artigo que alegava que o presidente havia ordenado que soldados atirassem contra um hospital durante um motim da polícia em 2010. O artigo, diz a Economist, era de fato irresponsável, mas a reação do governo pareceu exagerada, provocando uma onda de críticas e protestos entre organizações de mídia e grupos em defesa dos direitos humanos nas Américas.

Em fevereiro, a justiça condenou o colunista Emilio Palacio e os proprietários do jornal, os irmãos Carlos, César e Nicolás Pérez, a três anos de prisão, e determinou multa equivalente a R$ 17 milhões. A surpresa veio no fim do mês, quando Correa anunciou que perdoaria os condenados. E a paz reina novamente no Equador. Será?

Controle

Segundo análise da Economist, não é bem assim. O objetivo de Correa é construir um império de mídia estatal. Ele já afirmou que, em seu país, empresas privadas de mídia devem ser a exceção, e não a regra. Uma nova lei equatoriana proíbe que veículos de imprensa expressem apoio a candidatos em eleições. Junto com a Venezuela, o Equador apoia uma proposta para enfraquecer a Relatoria de Liberdade de Expressão da Organização dos Estados Americanos – o grupo de trabalho criado pelos dois países propõe que a relatoria seja proibida de receber financiamento externo e exige um código de conduta rígido, que limitaria sua atuação.

O artigo que fez com que Correa levasse o jornal El Universo à justiça era de fato tendencioso. E algumas críticas do presidente à mídia privada são válidas – alguns veículos de imprensa equatorianos já caíram na armadilha de agir como substitutos da fraca oposição política do país. O problema é como Correa age: apesar de insistir que estava processando o jornal como cidadão, ele apareceu no tribunal com todo o séquito presidencial. Em outro caso, Correa garantiu que dois jornalistas investigativos que escreveram um livro sobre os negócios de seu irmão com o governo fossem condenados.

Crescimento

Até agora, a maioria da população equatoriana não se incomodou com o enfraquecimento da liberdade de expressão no país e com a clara derrubada da separação de poderes sob o governo de Correa. Chama mais atenção no país o rápido crescimento econômico. Graças ao aumento no preço do petróleo, o orçamento do governo cresceu 163% desde que o presidente assumiu a presidência, em 2007. A pobreza diminuiu, e bancos estatais têm feito empréstimos com taxas baixas, o que estimula a construção. Estradas e pontes foram reformadas, e há novas clínicas de saúde.

Ainda que o populismo socialista de Correa seja mais moderado, ele usa algumas das táticas do venezuelano Hugo Chávez para governar – como uma nova constituição permitindo dois mandatos presidenciais consecutivos. E a aparência de estabilidade pode ser, em parte, apenas aparência, diz a Economist: ministros entram e saem com frequência, há uma troca grande nas regras de impostos, e o crime cresceu significativamente após duas reformas policiais fracassadas.

A questão, afirma a revista, é por quanto tempo o crescimento e a satisfação da população podem ser sustentados. As pesquisas mostram que, se fosse hoje, a eleição presidencial reelegeria Correa. Na falta de um opositor forte, o presidente deve acreditar que seu único obstáculo para continuar no poder é a mídia. Seu perdão ao El Universo, se este for o caso, pode se provar uma manobra tática já de olho no próximo mandato.