Saturday, 20 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Governo continua a influenciar a mídia

Os espanhóis têm uma frase que descreve muito bem a atitude dos gigantes de mídia do país que aguardam a decisão do governo para a divisão das licenças de televisão digital: ‘calar-se como uma puta’, como informa a revista britânica The Economist [18/8/05].

Uma matéria sobre a morna recepção do primeiro-ministro espanhol, o socialista José Luis Rodríguez Zapatero, pelo primeiro-ministro britânico, Tony Blair, não foi publicada por um jornal espanhol. Zapatero reuniu-se com Blair para falar dos seus planos de criação de uma ‘aliança de civilizações’ que reúna países ocidentais e muçulmanos para combater a barbárie do terrorismo. Ao questionar os motivos da censura, o jornalista que escreveu a matéria teve como resposta de seu chefe que publicar um artigo que ofenda o governo socialista poderia interferir na decisão do primeiro-ministro de dividir as licenças da TV digital.

Em um país no qual os jornais que mais vendem são aqueles que falam de futebol, é a poderosa televisão que importa. O governo de Zapatero causou consideráveis divergências ao se mostrar tendencioso ao grupo de esquerda Prisa, de Jesús Polanco. O grupo é dono do jornal El País e administra, através da Sogecable, o Canal Plus, único canal pago de TV analógico.

Até a conversão do sistema analógico para o digital, planejada para ocorrer nos próximos cinco anos, o Canal Plus vai funcionar sem o decodificador exigido pelo governo, exceto para a exibição de alguns programas, como cobertura do futebol. As outras emissoras concorrentes reclamam que esta permissão faz com que a Sogecable fique em vantagem, porque terá a oportunidade de conquistar uma maior audiência antes do fim do sistema analógico ao manter seus assinantes.

O governo já deu sinais de que vai doar duas licenças para cada emissora já existente (Sogecable, Telecinco, Antena 3, Veo TV e Net TV), uma para uma emissora analógica ainda não escolhida, e duas outras em 2010. O Partido Popular (PP), de centro-direita, está preocupado que o Grupo Prisa esteja tornando-se um monopólio de rádio, televisão e jornal.

Os planos de Zapatero de terminar com a interferência do governo na televisão e no rádio estatais parecem estar longe de se concretizar enquanto a televisão estatal depender de doações de dinheiro e seu diretor-geral for escolhido por um comitê parlamentar. O assunto da distribuição das licenças de televisão digital ainda vai render até a próxima eleição (que acontecerá daqui a três anos). Durante este período, a mídia continuará a ser cautelosa nas críticas ao governo e Zapatero mostrará, assim como seus antecessores, que não foi sincero nas promessas de erradicar a influência do governo da mídia.