Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Imprensa árabe em momento de autocrítica

O brutal seqüestro da escola de Beslan chocou o mundo inteiro e levantou um incomum sentimento de autocrítica e instrospecção no mundo árabe. Em um dos comentários mais surpreendentes, o editor-chefe da emissora de TV al-Arabiya, Abdel Rahman al-Rashed, afirmou em artigo no jornal Al Sharq al Awsat que ‘é um fato certo que nem todos os muçulmanos são terroristas, mas é igualmente correto, e doloroso, afirmar que quase todos os terroristas são muçulmanos’.

‘A maioria dos suicidas que joga bombas contra ônibus, carros, escolas, casas e edifícios em todo o mundo é muçulmana’, escreveu ele, citando casos como o da execução de trabalhadores nepaleses no Iraque, o ataque aos conjuntos residenciais em Riad, na Arábia Saudita, os aviões russos que – acredita-se – foram derrubados propositalmente há algumas semanas, e o próprio 11 de setembro de 2001. ‘Que recorde patético. Que façanha abominável. Isso nos diz algo sobre nossa sociedade e nossa cultura?’, questionou o editor.

Como outros comentaristas, Rashed citou o caso do clérigo egípcio Yusuf al-Qaradawi, que possui um programa na rede de TV al-Jazira, onde expõe questões religiosas e incita a violência contra americanos e outros ‘ocupantes’ civis e militares do Iraque. ‘Como podemos acreditar nele quando ele nos diz que o Islã é a religião do perdão e da paz ao mesmo tempo em que a transforma na religião do sangue e da matança?’. Nesta questão, o editor foi acompanhado em coro pelo colunista do jornal kuaitiano al-Siyassa Faisal al-Qina’I, que escreveu que clérigos como Qaradawi, ‘em vez de defender o verdadeiro Islã, encorajam estas ações cruéis e apóiam decapitações, seqüestros e assassinatos’.

Jornais no Egito, como o al Ahram, e na Jordânia, como o al-Dustour, também se manifestaram contra o terrorismo na semana passada, chamando os recentes eventos na Rússia de um ‘crime contra a humanidade’. Na Arábia Saudita, o jornal Okaz publicou um texto escrito pelo colunista Khaled Hamed al-Suleiman com o título de ‘Açougueiros em nome de Alá’. Nele, Suleiman diz que ‘os propagandistas da guerra santa tiveram sucesso em distorcer a imagem do Islã’. O colunista afirma que ‘eles transformaram o Islã de hoje em algo relacionado a decapitações, seqüestros e explosões de pessoas. Colocaram nos olhos do mundo a imagem de que os muçulmanos são todos bárbaros e selvagens’, protestou. As informações são de John Kifner [The New York Times, 9/9/04].