Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Livro analisa crise no jornalão

O ex-repórter da Newsweek Seth Mnookin lançou nos EUA, na semana passada, o livro Hard News: The Scandals at The New York Times and Their Meaning for American Media (Notícia quente: os escândalos no New York Times e seus significados para a imprensa americana). Quando se fala em escândalos do Times, o nome de Jayson Blair costuma ser o primeiro a ser lembrado.

Mas ao contrário do que possa se pensar, o repórter plagiador não é o personagem principal da história contada por Mnookin, e aparece apenas na página 101 de um total de 260 páginas. O livro é, na verdade, sobre o ex-editor-executivo do jornal Howell Raines: como ele chegou ao posto número um do Times, como dirigia o jornal e como criou o ambiente que permitiu que Blair pudesse agir da maneira como o fez.

O escândalo de Blair e a conseqüente queda do Times foram histórias muito bem cobertas pela imprensa. Na ocasião, o jornal dedicou quatro páginas inteiras de uma única edição ao caso; Raines escreveu um artigo. Meses depois, foi a vez do próprio Blair escrever um livro. Na bibliografia de Mnookin aparecem 18 artigos de Howard Kurtz no Washington Post, 18 de Keith Kelly no New York Post, e outros 18 do próprio autor.

Os méritos do livro são dois, como afirma Jesse Oxfeld em artigo para a Editor & Publisher [8/11/04]. O primeiro é resumir uma infinidade de material sobre o caso entre duas capas. O segundo, e principal, é dar ao leitor, pela primeira vez, a visão, opinião e análise de quem esteve por dentro da história. Mnookin entrevistou mais de 100 pessoas para escrever Hard News. O livro só não é mais completo porque peças-chave do caso – como o próprio Raines, o ex-secretário de redação Gerald Boyd e o publisher do jornal, Arthur Sulzberger – se recusaram a falar.

Arrogância e mentiras

Em um trecho do livro, o autor fala sobre a humilhação sofrida pelo Times em 2002, quando Raines travou uma verdadeira cruzada contra o Campeonato de Golfe da cidade de Augusta, que se recusava a admitir jogadoras mulheres. O editor-executivo, porém, insistiu que a cobertura concorresse ao prêmio Pulitzer. ‘Um veterano do Times e amigo de longa data de Raines diz: ‘fiquei horrorizado. Foi naquele momento que percebi como a redação estava fora de controle. Era anarquia… a arrogância de Raines estava realmente o cegando’’.

Em outro trecho, Mnookin fala sobre a personalidade indefinida de Jayson Blair durante o tempo em que trabalhou para o Times – segundo ele, o repórter plagiador sofria uma espécie de ‘complexo de Zelig’ . ‘Diversas pessoas próximas a Blair neste período afirmaram posteriormente que ele era um tanto fantasioso; parecia incapaz de desenvolver uma personalidade própria, e tentava se parecer com as pessoas ao seu redor’, afirma o autor, para depois exemplificar: ‘Na faculdade, depois de escrever sobre abuso sexual, ele anunciou repentinamente que era uma vítima deste tipo de abuso. Quando a nave espacial explodiu, ele disse que seu pai trabalhava na NASA. Quando o governador George Ryan, de Illinois, perdoou todos os prisioneiros que estavam no corredor da morte em seu estado, Blair contou que seu tio estava no corredor da morte. Depois do 11 de setembro, é claro, ele afirmou que tinha um primo no Pentágono. E quando Howell Raines casou com uma polonesa, Jayson Blair arrumou uma namorada polonesa.’