Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

O jornalismo precisa (cada vez mais) ser investigativo

No ano de 1996, o inspirador Gabriel García Márquez divulgou ao mundo, na 52ª Assembleia da Sociedade Interamericana de Prensa (SIP), um de seus mais lindos textos, que tem como título “A melhor profissão do mundo” e discute o jornalismo de maneira única. O texto tem vários pontos que merecem ser abordados, mas um deles, que chama a atenção, é a afirmação de García Márquez de que “todo jornalismo é investigativo por definição”. Apurar e investigar seriam sinônimos e o jornalista um grande agente capaz de levar à luz as informações ocultas à sociedade. Mas, será que todo jornalismo hoje consegue ser investigativo por essência? Será que todos os jornalistas realmente atrelam sua apuração, sua reportagem, a algo tão sério como uma investigação?

Não há como se negar que o jornalismo brasileiro tem seus representantes sérios, que antes de serem repórteres, editores, apresentadores, são cidadãos preocupados com a realidade política, economia e social do país, e capazes de atuar com dados, investigações para mostrar realidades severas, que muitos de nós desconhecemos. No meio de comunicação mais popular, que é a televisão, temos um desses representantes. Roberto Cabrini, com seu Conexão Repórter, exibido no SBT, já foi capaz de trazer temas importantes, de fazer denúncias sérias, correr riscos e ter muita dedicação em cada reportagem. Ainda contando edições na sua história, o programa Repórter Record Investigação, exibido na Record, que conta com a voz imponente de Domingos Meirelles, também vem seguindo os moldes do programa de Cabrini e trazendo denúncias e matérias de fôlego. E não dá para deixar de citar Tim Lopes, o repórter que infelizmente foi assassinado e mostrava as realidades mais carentes entrando na história das pessoas, e vivendo, ele mesmo, a vida sofrida de muita gente.

Mostrar realidades ocultas

Mas nem sempre é assim. Reportagens investigativas demandam coragem, dedicação, fôlego e, sobretudo, tempo. E quando o assunto é tempo para o jornalista atual, o problema está instaurado. Hoje, em muitos veículos, a quantidade vale muito mais do que a qualidade. Cada vez mais se exige muito conteúdo de uma redação que encolhe a cada dia e, em meio a toda essa correria, falta o tão sonhado tempo para uma reportagem investigativa de qualidade que faça valer o verdadeiro exercício jornalístico.

Outro empecilho para as reportagens investigativas saírem do ramo das ideias e se tornarem reais é a segurança. O jornalista que se aventura em uma investigação de corrupção, por exemplo, assume os riscos de desafiar autoridades, quase sempre perigosos. Para esse problema, alguns repórteres conseguem encontrar alternativas. O global Eduardo Faustini esconde sua real identidade, não aparece no vídeo e pouca gente o conhece realmente. Em troca do seu anonimato, Faustini oferece matérias que investigam a corrupção de cidades brasileiras e abusos de autoridade ao dominical Fantástico, da TV Globo. Mas, nem todos conseguem ter a segurança de Faustini. A maioria dos jornalistas assassinados hoje no Brasil foram mortos após realizarem reportagens que investigavam abusos ilegais nas mais variadas instituições. Sem proteção, esses jornalistas investigaram para jornais locais, pequenas rádios , e acabaram ameaçados, e por vezes, assassinados.

Se o jornalismo é, como García Márquez diz, “investigativo por essência”, que ele possa encontrar sua raiz cada vez mais nos veículos brasileiros. E que os repórteres que enveredam por este caminho sejam protegidos e apoiados pelas instituições em que trabalham. Só assim, o profissional da comunicação poderá cumprir seu papel social tão importante: o de mostrar realidades ocultas e o de, quem sabe, mudar o mundo.

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Aline Imercio é jornalista