Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

O novo alvo do bilionário Warren Buffett

Depois da tempestade, nada como uma brisa leve para dissipar as nuvens pesadas que atormentam a mídia impressa nos Estados Unidos. E os primeiros raios de sol deram o ar de sua presença na quarta-feira (7/2), com um rumor de que o investidor multibilionário Warren Buffett estaria comprando uma participação na The New York Times Company.

A mera menção de Buffett é suficiente para atrair a atenção de qualquer investidor incauto, e desta vez não foi diferente. As ações da empresa editora do New York Times fecharam o dia em alta de quase 4%. Para uma companhia que uma semana antes havia anunciado uma depreciação de seu capital em 814 milhões de dólares, principalmente devido à perdas com o jornal The Boston Globe, a reviravolta é substancial [ver "A hora e a vez do New York Times"]. E o desempenho das ações comprova o fato, subindo quase 10% desde então.

Deve-se ressaltar porém que no momento a euforia é baseada em pura especulação, sustentada pela conotação quase mitológica do nome Warren Buffett sobre os investidores americanos. Ele é o segundo homem mais rico do mundo depois de Bill Gates, fundador da Microsoft. E por intermédio de sua companhia, a Berkshire Hathaway, Buffett construiu um diversificado portfólio de investimentos que não só sobreviveu, mas progrediu com a implosão da bolha da internet no início desta década, fruto de sua confessa aversão tecnológica.

"Estávamos errados"

Mas é justamente esta a dúvida que paira no ar. Perante uma indústria que luta pela sobrevivência frente à competição da internet, qual é a validade da visão financeira de alguém que sofre de fobia tecnológica? A realidade hoje enfrentada pela mídia impressa é bem diferente do frenesi irracional pela internet no fim dos anos 1990, e a competição pelas verbas dos anunciantes não é mais uma bolha de ar. Uma pesquisa divulgada pela American Advertising Federation no mesmo dia da boataria sobre Buffett revela, por exemplo, que 90% dos anunciantes americanos utilizam a internet para atingir sua audiência e, dentre estes, 72% planejam gastar um quinto de suas verbas publicitárias na internet.

O próprio Buffetf sofre as conseqüências da competição digital, mediante sua participação de 22% na Washington Post Company, cujas ações perderam um quarto de seu valor nos últimos dois anos. Mas a explicação para o seu interesse pela companhia não é o indiscutível prestígio de ter controle sobre um jornal como o Washington Post e ou a revista Newsweek. O que atraiu Buffetf foi a singela Kaplan Professional, uma companhia especializada na preparação de testes educacionais e que é a principal geradora de lucros do grupo.

Este exemplo demonstra em parte a filosofia financeira de Buffett. Ele não é um especulador, mas um investidor. Ele põe dinheiro em companhias com potencial lucrativo estável. E, principalmente, tem uma visão de longo prazo, mantendo sua participação constante tanto nos períodos de vacas gordas como nas fases de vacas magras.

Por outro lado, é possível que sua paciência com a magreza das vacas do Washington Post Company tenha finalmente esgotado. Em 2006, durante uma reunião dos acionistas da sua Berkshire Hathaway, Buffett declarou não estar mais interessado em jornais devido à redução no número de leitores. "Nós adoramos jornais como produto e achávamos que eram ótimas companhias com franquias à prova de bala. Estávamos errados", disse ele.

Ato de caridade

A questão ainda sem resposta é o que teria despertado seu possível interesse na New York Times Company. A empresa não tem a menor consistência na geração de lucros – muito pelo contrário, como o atestam as perdas com o Boston Globe. Existe a questão do prestígio, pois bem ou mal o New York Times é ainda um dos mais importantes formadores de opinião pública, não somente nos Estados Unidos como no resto do mundo. Mas com as ações com direito a voto e conselho diretor sob o controle quase absoluto do clã Ochs-Sulzberger, herdeiros da empresa, Buffett no máximo estaria relegado à função de figurante passivo, sem a menor influência empresarial ou editorial.

Mesmo a possibilidade da New York Times Company ser um investimento de longo prazo para Buffett não cola, em função das incertezas enfrentadas pela mídia impressa em geral. O próprio Arthur Sulzberger Jr., presidente do conselho diretor da empresa e publisher do New York Times, admitiu em uma entrevista recente ao jornal israelense Haaretz: "Não sei se estaremos imprimindo o Times em cinco anos. E sabe de uma coisa? Não me importa". Na seqüência, Sulzberger se justifica com a explicação de que os custos de publicação na internet são mínimos em comparação com o 1 bilhão de dólares que o grupo investiu na última modernização de seu parque gráfico.

O probleminha que Sulzberger sutilmente não aborda é a remota possibilidade de a empresa faturar na internet o suficiente para manter a qualidade de suas vastas operações jornalísticas, e que ninguém sabe quando isto poderá acontecer. Para os investidores, sobra a suspeita de que ou Buffett teria uma resposta para este dilema, ou, em última instância, está enfiando o dedo não sabe onde devido à sua ignorância no que diz respeito às novas tecnologias de informação.

Existe, porém, uma última possibilidade, familiar para os que acompanham os investimentos de Buffett. Ele simplesmente viu uma imensa pechincha nas ações da New York Times Company, que perderam quase 60% de seu valor nos últimos cinco anos. Para quem, em 2006, anunciou a doação de 85% da sua fortuna pessoal de 46 bilhões de dólares, o potencial de risco com a mídia impressa é insignificante – ou, na pior das hipóteses, um outro ato de caridade.