Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Por que o silêncio sobre os Panteras Negras?

A edição de quinta-feira (15/7) do Washington Post divulgou uma crescente controvérsia em relação à decisão do Departamento de Justiça americano de considerar pouco relevante uma ação por coação eleitoral aberta contra militantes do Partido dos Novas Panteras Negras. A matéria resumia os aspectos da questão, mas deixou muitos leitores com uma dúvida: por que o jornal demorou tanto a tratar do assunto? Há meses, leitores procuram o ombudsman, querendo saber por que o Post não vem dando cobertura ao caso. Esses telefonemas aumentaram recentemente, quando o New York Times e a Associated Press divulgaram matérias a respeito. A Fox News e os blogueiros de extrema-direita batem e rebatem na história, enquanto blogueiros liberais os acusam de tentar criar um escândalo.

E o Post, praticamente calado. O fato teve origem no dia das eleições de 2008, quando dois membros dos Novos Panteras Negras se encontravam junto a uma seção eleitoral, ambos em roupa paramilitar (o vídeo, no YouTube, já foi visitado cerca de 1,5 milhão de vezes) e um deles com um cassetete.

Processo exagerado

No início do ano passado, um pouco antes da saída do governo Bush, o Departamento de Justiça entrou com uma ação contra os dois homens e contra o partido e seu presidente. Porém, vários meses depois, quando o governo se preparava para ganhar a causa por abandono por parte dos indiciados – que não contestaram a ação –, o Departamento de Justiça de Barack Obama decidiu que a ação era um exagero e a restringiu ao homem com o cassetete, que recebeu como penalidade a proibição de mostrar qualquer tipo de arma num raio de 30 metros de qualquer seção eleitoral até 2012.

Os representantes republicanos chiaram. E, durante meses, obstruíram a confirmação de Thomas E. Perez, escolhido pelo presidente Obama, para a chefia da Divisão de Direitos Civis do Departamento de Justiça – enquanto procuravam respostas para o fato de a ação ter perdido a força inicial, apesar das objeções de alguns advogados do Departamento. A Agência de Responsabilidade Profissional do Departamento de Justiça abriu uma sindicância, ainda vigente.

Antes tarde do que nunca

A controvérsia subiu de tom no mês passado, quando J. Christian Adams, ex-advogado do Departamento de Justiça que ajudou a montar o caso, escreveu no jornal conservador Washington Times que a decisão de seus superiores de reduzir o espectro da ação fora ‘motivada por uma hostilidade ilícita em relação à aplicação da lei com equidade’. Segundo ele, existem no Departamento pessoas para quem ‘a lei não deveria ser usada contra delinquentes negros devido à longa história de escravidão e segregação’. Recentemente, Adams repetiu essas acusações num depoimento a uma audiência pública que o Post não cobriu. Na realidade, até a matéria da última quinta-feira (15/7), o Post nada publicara sobre o caso este ano. Em 2009, houve breves alusões em três matérias apenas.

Isso levou muitos leitores a acusarem o Post de uma postura dúbia. Um deles disse que se a controvérsia envolvesse John D. Ashcroft, Advogado-Geral da União (cargo correspondente ao de ministro da Justiça) do governo Bush, ‘haveria uma enxurrada de editoriais e matérias que se sucederiam por meses a fio’.

‘Para falar francamente, a coisa envolve ideologia e política partidária. Blogueiros liberais acusam Adams de ser um ativista de extrema-direita (ele me garantiu que sua única motivação é a de que as leis de direitos civis sejam aplicadas de forma neutra, no que se refere à raça)’, escreveu o ombudsman Andrew Alexander em sua coluna de domingo (18/7).

Cobertura justificada

O Post não deveria basear sua decisão de cobrir um fato em ideologias, nem deveria se sentir obrigado a dar matérias simplesmente devido ao bla-blá-blá da blogosfera – de direita, ou de esquerda. Neste caso, entretanto, a cobertura se justifica, diz Alexander, porque se trata de uma controvérsia que clama por uma clareza que o Post poderia fornecer. Se o Advogado-Geral da União (Eric H. Holder) e seu Departamento têm preconceitos de cor na aplicação das leis de direitos civis, deveriam ser cobrados. Se a sindicância da Comissão de Direitos Civis age de forma partidária, isso deveria ser revelado. Se Adams é, de fato, um ativista de direita, deveria ser desmascarado.

O editor Kevin Merida, que definiu a controvérsia como ‘significativa’, disse que preferiria que o Post tivesse abordado o assunto antes. A demora, segundo ele, deveu-se ao número limitado de funcionários e ao volume excessivo de outras notícias sobre o Departamento de Justiça.

Antes tarde do que nunca. Ainda há muita coisa a explorar.