Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Por que o acordo do Google com jornais franceses pode ser perigoso

 

Após muitas manobras diplomáticas e uma série de gestos para manter as aparências dos dois lados, o Google finalmente assinou um acordo com os jornais franceses e concluiu a longa batalha judicial sobre o uso de trechos de artigos no Google News, o que os franceses consideravam quebra de direitos autorais. Mas enquanto o gigante de buscas pode estar aliviado por deixar a situação para trás, existe uma discussão à vista: teria o acordo sido benéfico para a internet como um todo?

O veterano blogueiro de tecnologia Lauren Weinstein descreveu os perigos da situação em seu blog, classificando a posição do governo da França como “extorsão” e avisando do risco a longo prazo do Google concordar com demandas como pagar pelo simples ato de divulgar um link e um trecho de conteúdo:

“Existe pouca evidência que sugira que pagar um grupo fazendo exigências descabidas irá fazer mais do que aquietá-lo por um momento, e ele inevitavelmente voltará para mais. E mais. E mais. Pior ainda, ceder nessas situações mostra para outros grupos que você pode ser suscetível a essas ou a outras demandas, e essa mentalidade pode se espalhar desde ataques a grandes empresas até ataques a pequenas companhias, organizações e até indivíduos”.

Como Jeff Roberts apontou em outro post sobre o acordo, os jornais franceses originalmente queriam que o Google pagasse 100 milhões de dólares, que iriam para um fundo que poderia ser usado para qualquer fim, em vez de ir para a compra de anúncios ou outro empreendimento conjunto. Roberts também aponta que, com o acordo final, similar a outro na Bélgica, o Google manda a mensagem óbvia de que está preparado para fazer o mesmo com outros países, como a Alemanha.

Pressão

Isso pode fazer sentido para o Google, já que quer evitar processos e ter uma boa relação com os países da Europa. Mas, como sugere Weinstein, o acordo só irá encorajar os países a achar que, se pressionarem a empresa americana, conseguirão dinheiro.

O Google quer que esses pagamentos sejam vistos como uma ajuda aos jornais, motivo pelo qual o fundo é chamado de “apoio a iniciativas de publicações digitais” e por que a empresa enfatiza tanto a visão de uma parceria estratégica. Mas apesar dessa imagem construída pelo Google, o acordo é descrito por muitos como simples “pagamento por links”, e essa mentalidade é perigosa. Weinstein continua:

“As reclamações dos jornais franceses sobre o Google vão contra aquilo que é fundamental e esperado da Internet. Obter concessões financeiras do Google por atividades ordinárias de busca e linkagem manda uma clara e potencialmente desastrosa mensagem para o planeta, uma mensagem que pode condenar a rede de computadores que nos tomou tanto tempo para construir.”

Em outras palavras, o assunto é muito maior que o Google. Quanto tempo levará para editoras e jornais americanos defenderem a mesma ideia? E as outras empresas? O produtor de cinema Harvey Weinstein disse recentemente em entrevista que os EUA possuem legislação para tornar isso realidade, e o Google está dando impulso para esse tipo de pensamento.

É cruelmente irônico que uma companhia que gastou tanto tempo argumentando (corretamente) que trechos de livros poderiam ser utilizados em suas ferramentas, agora esteja pagando a jornais por, fundamentalmente, a mesma coisa. Trata-se de uma estratégia de conciliação míope.

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