Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Rita Celia Faheina

‘Os meios políticos do Continente, sobretudo os sulamericanos, do Sul, estão de olhos voltados para o Uruguai onde, neste domingo, realizaram-se eleições presidenciais, apontando para vitória do candidato da Frente Ampla, de esquerda, o ex-guerrilheiro tupamaro José Pepe Mujica’. Assim começava o editorial do O POVO da última segunda-feira, 26. Com o título ‘Esquerda na América Latina’, antecipava o resultado das eleições uruguaias, quando, na mesma edição, havia matéria informando que o pleito só será decidido em segundo turno, marcado para o próximo dia 29 de novembro.

O editorial é a palavra oficial do O POVO, define e expressa a opinião da empresa e não poderia ter cometido esse erro. Proclamar a vitória do candidato uruguaio quando haveria uma segunda votação? E o pior é que, antes da página onde se publica o editorial (pág. 6) havia a informação correta (pág. 2) sobre a disputa entre José Pepe Mujica e o ex-presidente Alberto Lacalle, do Partido Nacional daquele país, no segundo turno.

Leitores ligaram sem entender o que tinha acontecido para o editorialista (responsável pela redação do editorial) ter anunciado que Mujica era o novo presidente uruguaio. No texto dizia que ‘a vitória de José Nujica (o nome saiu assim mesmo grafado de forma errada) reforça a tendência verificada nos últimos tempos, na América Latina, de sufragar os partidos que se opuseram aos regimes ditatoriais e defenderam uma política alternativa ao neoliberalismo’.

Informava ainda que ‘o candidato vitorioso, apesar de ser de esquerda, tem um perfil político conciliador, pretendendo seguir o mesmo modelo econômico de seu antecessor, baseado na combinação de mercado e fortes investimentos sociais promovidos sob a orientação do Estado, com vistas a um desenvolvimento sustentável…Seu referencial é o governo do presidente Luis Inácio Lula da Silva’. No final do texto afirmava: ‘Seja como for, os resultados das eleições uruguaias apontam um futuro de justificadas esperanças para o país’.

A professora e jornalista Adísia Sá, membro do Conselho Editorial (grupo de 15 representantes da sociedade civil convidados pela presidência do O POVO para definir os códigos e princípios da empresa), disse que nunca tinha visto, no editorial, uma notícia se antecipar aos fatos. A ombudsman emérita do O POVO exigiu uma explicação.

No comentário interno fiz a mesma exigência e perguntei, como os leitores, quais as razões que levaram o editorialista a se adiantar aos fatos, divulgando uma desinformação. Solicitei que fosse dada, na edição do dia seguinte, uma explicação aos leitores. Será que o editorial tinha sido escrito antes do fim do primeiro turno das eleições? E o editor que estava no plantão no fechamento da página não leu o texto para corrigir?

Nenhuma resposta me foi enviada, no dia seguinte, pelos editores, assim como nenhuma explicação foi publicada para os leitores, sobre o erro, na edição da última terça-feira, 27. Isso apesar de ter sido publicada matéria com o título ‘Uruguai vai ter o segundo turno dia 29 de novembro’ na página 24 (Mundo). Informava, no início do texto, que o ex-guerrilheiro José Mujica, candidato da coalizão de esquerda no poder, a Frente Ampla, ganhara o primeiro turno da eleição presidencial no Uruguai com 47,49% dos votos. Mas teria de concorrer numa segunda votação contra o liberal Luís Lacalle, que tivera 28,53% do total de votos, no último domingo.

Voltei a cobrar explicações sobre o erro do editorial no comentário interno e através de e-mails enviados aos editores e ao editor-sênior, jornalista Valdemar Menezes, responsável pela redação do editorial. Só então recebi respostas e, finalmente, providências foram tomadas.

Na quarta-feira, 28, O POVO publicou um ‘Erramos’, no rodapé da página 7 (poderia ter saído com mais destaque na mesma página em que se publica o Editorial) pedindo desculpas aos leitores pelo erro. Admitia que o editorial dava como certa a vitória do candidato da Frente Ampla, de esquerda, o ex-guerrilheiro José Pepe Mujica, à presidência do Uruguai no primeiro turno. Mesmo vencendo a primeira etapa da eleição, Mujica disputa o segundo turno com o liberal Luís Lacalle, do Partido Nacional.

O que diz o editorialista

O jornalista Valdemar Menezes enviou, por e-mail, a seguinte explicação: ‘A publicação do editorial sobre as eleições uruguaias do jeito que saiu foi um erro lamentável. Quando tive de concluí-lo, ainda não tinha a definição se haveria o segundo turno. Como não podia esperar – e tinha um compromisso inadiável – pedi ao colega que estava na chefia da Redação para adequar o texto: se até a hora que ele fosse sair percebesse que o texto necessitava adequações, ele o fizesse. Ele se comprometeu. Infelizmente, não o fez, o que foi desastroso. Acho que aprendemos com a lição. Para os leitores, infelizmente, não havia mais conserto’.

Esperamos que os editoriais do O POVO não sejam mais redigidos antes da confirmação dos fatos.’