Wednesday, 24 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Tratamento cordial, apesar das críticas

O New York Times não está em sua mais áurea fase. Desde que revelou o programa secreto americano destinado a rastrear transações financeiras internacionais de supostos terroristas com informações de uma empresa conhecida pela sigla Swift (Society for Worldwide Interbank Financial Telecommunication), o jornal vem passando por uma onda de críticas, noticia James Rainey [Los Angeles Times, 24/7/06].

A Casa Branca considerou o artigo ‘ofensivo’ e ‘infame’. Legisladores republicanos pediram que os jornalistas do NY Times enfrentem acusações de espionagem. Comentaristas conservadores vão além: querem que os repórteres do jornal sejam barrados da Casa Branca. Alguns jornalistas do escritório do jornal em Washington protestaram contra o tom das críticas e afirmaram que temem que suas fontes do governo não queiram mais contato com o jornal.

Política e mídia

Para o ex-presidente da Associação dos Correspondentes da Casa Branca, Ron Hutcheson, o caso não modificou a relação entre políticos e a mídia. ‘Isto não sinaliza nenhuma grande quebra na relação simbiótica entre a Casa Branca e a imprensa’, opinou.

Elisabeth Bumiller, ex-correspondente da Casa Branca do NY Times que está de licença para escrever um livro sobre a secretária de Estado Condoleezza Rice, afirma que o governo Bush continua falando com os repórteres do jornal. ‘A Casa Branca também usa o NY Times para provocar os conservadores. É assim que funciona’, observou. David E. Sanger, repórter que também cobre a Casa Branca para o NY Times, tem opinião semelhante. Para ele, o jornal continua sendo importante no aparato de políticas exteriores, pois é muito lido por diplomatas em Washington e outras capitais no mundo. ‘Eles têm de lidar conosco, por causa do nosso leitorado em todo o mundo’, disse.

Outros jornalistas do NY Times, no entanto, acreditam que o caso Swift pode se tornar ainda mais problemático. Alguns boletins foram distribuídos em escritórios do Pentágono pedindo que seus funcionários não conversem com repórteres do jornal. ‘Há alguns lugares do governo nos quais nossos jornalistas têm mais dificuldades em realizar seu trabalho’, revelou Richard W. Stevenson, vice-diretor da sucursal em Washington. ‘É difícil avaliar quais contatos não estão sendo feitos por causa da publicação da matéria sobre o caso Swift’.

As críticas do NY Times ao governo Bush não são novas. Mas atingiram um novo patamar a partir de dezembro, quando os repórteres James Risen e Eric Lichtblau escreveram sobre o programa da Agência de Segurança Nacional de rastreamento de registros telefônicos. Os artigos recebem o prêmio Pulitzer na categoria de reportagem nacional, por terem ‘gerado um debate nacional sobre a fronteira entre a luta contra o terrorismo e a proteção da liberdade civil’. Aliados do presidente, entretanto, alegam que tais matérias prejudicaram a luta dos EUA contra o terrorismo.

Embora o Los Angeles Times e o Wall Street Journal tenham publicado matérias semelhantes sobre o Swift com apenas horas de diferença na rede, o New York Times foi a publicação que recebeu mais críticas do governo. Alguns especialistas da mídia alegam que isto ocorreu porque o diário nova-iorquino foi o primeiro a divulgar o fato. Já Hutcheson apresenta um outro motivo: ninguém simboliza melhor a elite da mídia no leste americano do que o NY Times.

Tratamento cordial

Mesmo com tantas críticas, as relações entre o jornal e o governo Bush ainda permanecem calmas. Artigos do NY Times não foram retirados do clipping que a Casa Branca envia à mídia diariamente. Assim que o caso Swift foi publicado pelo jornal, o porta-voz da Casa Branca Tony Snow reconheceu que o artigo era ‘equilibrado’. Duas semanas após a publicação do caso, Snow reafirmou que os repórteres do NY Times na Casa Branca ‘fazem seu trabalho de maneira justa e trabalham duro’.

A Casa Branca decidiu há muito tempo manter contato com todos os repórteres, mesmo os críticos ao governo, segundoTrent Duffy, ex-vice-secretário de imprensa de Bush. ‘Evitar contato é geralmente a pior atitude. Significa que você não terá chance de se explicar’, afirmou.

Mais um palavrão

Três dias depois de ter publicado a palavra ‘merda’ pela primeira vez em seu sítio – na reprodução da conversa do presidente Bush com o primeiro-ministro britânico Tony Blair durante jantar da Cúpula do G-8 em São Petersburgo no dia 16/7 –, o New York Times reproduziu novamente a palavra, mas agora na sua edição impressa de 21/7. A palavra apareceu na coluna de Thomas Friedman na internet e no dia seguinte na edição impressa, como noticia a Editor&Publisher [20/7/06]. ‘George Bush e Condi Rice precisam se conscientizar que a Síria não vai pressionar o Hezbollah – nas palavras imortais de Bush – para parar ‘com toda essa merda’, escreveu Friedman.