Saturday, 16 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Em se plantando…

Abre-se o jornal e lá está, em tom de notícia exclusiva, a informação: pesquisa interna de um partido indica que seu candidato está caindo mais do que manga madura e perdendo a posição para seu principal adversário. A informação vai para o rádio, a internet, os blogs, os “recórteres” em geral. Só que não há lógica na coisa: se o partido faz uma pesquisa interna, com o objetivo de ajustar sua campanha, e essa pesquisa é desfavorável, por que diabos o próprio partido a divulgaria? As informações internas da campanha seguem a Lei de Ricúpero: o que é bom pode ser vazado, o que é ruim fica escondido.

OK, aí sai a pesquisa normal dos institutos, e verifica-se que a tal informação, além de ilógica, era também falsa. E daí? Daí que até agora se finge, nos meios de comunicação, que esse tipo de erro é cometido de boa-fé. Não, não é: certas informações, quando improváveis, têm de ser verificadas cuidadosamente, com cruzamento de fontes e tudo. Se eventualmente forem publicadas e se comprovarem falsas, cabe ao veículo de comunicação abrir a fonte, identificar quem é que está tentando fazer campanha eleitoral com a plantação de noticiário. Se nada disso foi feito, certamente o procedimento jornalístico foi falho.

Pesquisa influencia eleição? Em certas circunstâncias, pode influenciar diretamente o resultado, ampliando uma onda, ajudando a murchar uma posição. Normalmente, tem influência indireta, inflando ou reduzindo contribuições de campanha. Pesquisa honesta faz parte do jogo democrático; pesquisa desonesta deve ser combatida na Justiça, até para minar a credibilidade de quem eventualmente a faça. Mas números plantados não são nem pesquisa: são a demonstração de que um profissional ou veículo tomou partido, ou que cobre a eleição com descaso inadmissível para um evento de tamanha importância.

 

Que língua é essa?

Júlio César, o grande comandante romano, falava uma só língua – e tão bem que seus livros são até hoje usados nas aulas de latim. Churchill só falava uma língua, e ganhou o Prêmio Nobel de Literatura. Os meios de comunicação brasileiros contratam apenas gente que fale pelo menos duas línguas, estude uma terceira e tenha um quarto cheio de diplomas, de preferência internacionais.

Bem, este colunista acompanhou um grande jornal durante uma semana, sempre procurando uma única palavra: o verbo “agradecer”. Não houve nenhuma regência correta: agradecer alguma coisa a alguém. O que havia era “o agradeceu”, “Sicrano agradeceu Fulano”. “agradeceu-o”. E uma frase daquelas de demolir todas as regências, mas com outro verbo: “é um direito que os assiste”. São coisas que dão muita saudade dos revisores – cujo trabalho, a propósito, não era corrigir erros de português, e sim de tipografia.

Mas este não é todo o problema. Os meios de comunicação adoram usar termos parecidos como se fossem sinônimos. Por exemplo, se alguém tem aparência jovem, ou juvenil, usam “jovial” – que quer dizer “alegre” e não tem nada a ver com idade. Se um automóvel tem acabamento simples, dizem que é “simplório” – que quer dizer “tolo”. Um doce fino, exclusivo, é chamado de “especiaria” – que quer dizer “tempero”, não tem nada a ver com “especialidade”. E bagatela, claro, quer dizer bugiganga, coisa de pouco valor. Exceto nos meios de comunicação, onde se imagina que “bagatela” é uma fortuna daquelas capazes de seduzir baciadas de mensaleiros.

Há, nos meios de comunicação, quem fale muitas línguas. Mas não há jeito de escrever “cast”, que em inglês significa “elenco”, “equipe”: preferem “casting”, que é a formação de elenco. Quando alguém diz que fulano está no “casting” da emissora, gostaria de dizer que ele foi contratado – mas diz, na verdade, que ele está participando da escolha de quem será contratado.

O “button”, aquele botãozinho de lapela, é chamado de “botton”, “bottom”, de tudo, menos por seu nome tão simples. De botão, jamais: qual o charme de usar um objeto com nome tão brasileiro?

A melhor que este colunista viu nos últimos dias se refere às eleições: os partidos fazem pesquisa para uso interno, “tracking”. E saiu “trekking” – prática de esportes radicais. Tudo bem, não é preciso falar e entender várias línguas: é só não usá-las no lugar do velho e bom Português.

 

Esplendor e sepultura

É festa, caro colega. Uma reportagem sobre os problemas do Palmeiras informa que outros times que estiveram em situação semelhante “há 14 rodadas do fim” foram rebaixados. Um jogador entrou em campo, não jogou nada e ainda levou amarelo. “O jogador ironizou o pouco tempo em campo, aferindo que só teve tempo de ser advertido”. Ou “mais um resultado negativo faria com que a situação se tornasse praticamente irredutível”. Será que queriam dizer “irremediável”? Talvez: “irredutível”, que não pode ser reduzido, ou que não pode ser movido, é que não podia ser.

 

O que é, o que é

1 – Ganso recusa sair pelos fundos e diz que deixa Santos de “cabeça erguida”.

2 – Flamengo tem maior do mundo

Pois é, pois é.

 

Coisas da vida

Às vezes é divertido ler o jornal. Por exemplo, uma notícia sobre Leo, o lateral esquerdo do Santos:

** “Léo soube das ofertas que já foram oferecidas (…)”

E, mais do que isso, ofertadas.

Ou uma notícia americana contando como o meia Marcelo Sarvas, jogador formado na base do Corinthians, junto com Ewerthon, Fernando Baiano e Gil, mas que nunca jogou no time profissional, é hoje uma estrela do time americano Los Angeles Galaxy. Diz o título, num grande portal:

** “Ex-revelação do Corinthians ganha status de homem sem preço”

Como é que um jogador se torna uma “ex-revelação”?

 

A hora da brincadeira

O deputado Valdemar Costa Neto, presidente nacional do PR, não brinca em serviço: quando lançou a candidatura de Tiririca, estava pensando em garantir a própria eleição, com as sobras de votos do grande puxador. Os eleitores brincaram em serviço: elegeram Tiririca com votação recorde. Mas os jornalistas não podem continuar com a brincadeira, elegendo Tiririca um dos melhores deputados do país, como o fizeram. Tiririca é um profissional excelente no seu ramo, comportou-se na Câmara com decoro e assiduidade (é um dos que menos faltam às sessões), não reclama de trabalhar.

Mas essas características deveriam ser comuns a todos os parlamentares; e não são, sozinhas, suficientes para formar um bom deputado. As ideias de Tiririca sobre os assuntos nacionais são ainda desconhecidas; suas propostas, também. Os caminhos que defende para o país, quais serão? Em suma, Tiririca é um deputado do que se chama de “baixo clero”, sem importância na ordem das coisas, destacando-se embora por seu comportamento até agora irrepreensível em termos de honradez. É um homem respeitável, mas não está entre os melhores parlamentares do país – nem poderia estar, já que pensar politicamente não é seu forte.

Talvez os jornalistas tenham feito o que fizeram para protestar contra as coisas que vêm acontecendo no Congresso (até mesmo o desmascaramento de pessoas que pareciam inatacáveis). Mas não se brinca com coisa séria.

 

O inesgotável

Por falar em brincar com coisa séria, o candidato do PMDB à prefeitura paulistana, Gabriel Chalita, está lançando outro livro (agora de poesia), De tudo que mora em mim. Chalita, 43 anos, já tem mais de 60 livros publicados. É graduado em Direito e Filosofia, mestre em Ciências Sociais e Direito, doutor em Comunicação e Semiótica, doutor em Direito. Ninguém chega à posição a que Chalita chegou sem ser muito inteligente; é também requintado, educadíssimo e, podemos supor, muito dedicado aos estudos. Mas publicar mais de 60 livros em 43 anos de vida e, ao mesmo tempo, graduar-se, pós-graduar-se, doutorar-se, e enquanto isso ser secretário da Educação de São Paulo, depois deputado, professor, e ainda candidato parece meio muito. Será ele um dos maiores gênios da História da Humanidade?

 

Direito do Trabalho

Reserve o dia 3 de outubro na agenda: das 19 às 22h, na Livraria da Vila (Alameda Lorena, 1731, SP), sai o livro O Direito do Trabalho Individual – Argentina, Brasil, Uruguai, organizado por Lúcia Vidigal Zimmermann, com a coordenação conjunta dos advogados especializados Sérgio Schwartsman, Horácio Gonzalez Mullin e Imaculada Gordiano, da Lexnet. A obra compara a legislação trabalhista brasileira (e o peso dos encargos sociais) à dos países vizinhos, sendo de grande utilidade para a busca de locais onde o custo com mão de obra pese menos nos gastos gerais.

Uma surpresa: Uruguai e Argentina também têm legislação complexa e alta carga tributária. O livro ajuda os investidores a analisar os impactos trabalhistas e tributários em cada um dos países, facilitando (e tornando mais precisa) a tomada de decisões sobre onde localizar os novos empreendimentos.

 

Como…

De um grande jornal impresso, numa coluna de muito prestígio:

** “(…) com os recursos foram saudadas as dívidas”

Dívida é algo tão irritante que não deveria merecer saudações.

 

…é…

De um grande jornal impresso, de circulação nacional, comentando declarações de uma ex-ministra francesa que foi muito próxima do ex-presidente Sarkozy:

** “Rachida Dari (…) pediu à comunidade que não se deixe levar pela revanche. Para ela, os redatores interesses mercadológicos, e publicaram as charges em um ‘golpe editorial inoportuno’.”

Faltou alguma coisa, pelo jeito. Os redatores “atenderam”, “cederam a”, “renderam-se a”, por aí. Mas o melhor é o finalzinho da frase: que seria um “golpe editorial oportuno”?

 

…mesmo?

De um importante portal noticioso da internet

** “Foto polêmica entre empresário gay e Celso Russomanno causa polêmica nos meios LGBTs”

OK, OK. O que será uma foto “entre” uma pessoa e outra?

 

A não notícia

Hebe Camargo deixou a RedeTV! e toda a imprensa informou que havia pendências a saldar, por parte da emissora. E não foi só Hebe: muita gente deixou a RedeTV! por problemas de salários. Aí vem o título:

** “Após suposto calote em Hebe, associação pede intervenção de Dilma na RedeTV!”

Suposto? Vá lá, que não houve confirmação oficial. Mas não houve apenas o caso de Hebe: houve vários, muitos deles noticiados. A carta a Dilma Rousseff da “associação” (na verdade, a ABI, Associação Brasileira de Imprensa, velha combatente em prol da democracia) visou todos os atrasos. E – agora a notícia nova – a RedeTV! ameaça processar a ABI por ter representado à presidente. A advogada da ABI deve ser a criminalista Zulaiê Cobra Ribeiro.

 

E eu com isso?

E chega, que este país está ficando muito chato. Gente brigando por causa de partido político, veja só! Vamos brigar pelo que vale a pena: qual o melhor filme, qual a estrela mais bonita, qual a melhor cantora. Frufru, pois!

** “Demi Lovato muda o visual e fica loira com franja”

** “Paula Fernandes está com novo namorado”

** “Penélope Cruz exibe decote generoso em filmagem”

** “‘A bunda é minha’, diz Nívea Stelmann sobre carícias na praia”

** “Paloma festeja o aniversário de Thiago Martins”

** “Alessandra Ambrósio se abaixa e deixa seio à mostra em mercado”

** “Michel Teló e Thais: mãos dadas em evento”

** “Giovanna troca beijos com Arthur Aguiar”

** “Letícia Birkheuer badala entre vips em NY”

** “Bárbara Borges caminha agarrada ao namorado em praia do Rio”

** “Miss Goiás dá bafão, alfineta noiva de Latino e detona rival”

** “Panicat Babi Rossi diz que trabalhar de biquíni é bonito e não prostituição”

** “Grazi Massafera leva filha de três meses para viajar”

** “Amiga de Michel Teló, Graci Carvalho faz pose sensual no Congresso em Brasília”

 

O grande título

Bons títulos, bons títulos.

Comecemos com algo inusitado:

** “Fotógrafo captura pessoas dormindo nas ruas de Tóquio”

Até dá para entender o que quis dizer o tituleiro. Mas não foi o que ele disse.

Continuemos com um primor de titulo:

** “Ossada humana é encontrada em cemitério”

Dizem até que não foi a única.

E o grande título da semana, impecável:

** “Quem fica melhor com o pompadour loiro?”

Pois é: quem fica melhor com o pompadour loiro?

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[Carlos Brickmann é jornalista e diretor da Brickmann&Associados]