Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Mais transparência nos debates do Post Live

Teria o The Washington Post sido demasiado íntimo do Instituto Americano de Petróleo (API, sigla em inglês) – o principal lobby da indústria de petróleo e gás –, que patrocinou duas mesas-redondas sobre política energética nas recentes convenções políticas na seção online Washington Post Live? E, quando publicou duas páginas com trechos dessas discussões, deveria o Post ter revelado quem patrocinou os eventos? Essas foram algumas das perguntas levantadas pelo veículo de centro-esquerda Fairness and Accuracy in Reporting, o que fez com que muitos de seus seguidores inundassem o ombudsman Patrick Pexton de e-mails contestando a maneira pela qual o Post tratou dos acontecimentos e publicou os trechos, comenta ele, em sua coluna de domingo [23/9/12]

O Post Live é um departamento da empresa The Washington Post Co. que produz eventos sobre questões nacionais dignos de notícia e discussões em mesas-redondas. Tais eventos constituem uma parte cada vez maior da indústria jornalística e uma fonte cada vez maior de receita, não só para o Post, como para outras publicações. Outras instituições também têm iniciativas semelhantes, como National Journal, Atlantic, Wall Street Journal e Politico. São eventos de entrada franca e muito populares entre empregados, lobistas, repórteres e funcionários do governo no Congresso, que procuram as opiniões mais recentes de especialistas em determinadas políticas.

A ausência dos ambientalistas

Esses eventos geram receitas por meio de patrocínios coletivos. As empresas entram com uma taxa e podem pagar pelo aluguel da sala do evento e refrigerantes. Em troca, põem seus logotipos por toda a sala, recebem agradecimentos do moderador quando o evento começa e são vistas pela audiência como participantes do debate. O API e o Post patrocinaram mesas-redondas em Tampa e em Charlotte sobre as diferenças nos planos energéticos do presidente Barack Obama e do candidato republicano Mitt Romney e o que isso poderia significar para o futuro da política energética.

Mas vale ressaltar alguns pontos:

>> Mary Jordan, a jornalista vencedora do prêmio Pulitzer que é responsável pelo Post Live, não consultou o API sobre quem deveria convidar. Ela e sua equipe fizeram os convites, escreveram as perguntas, mediaram as discussões e escolheram os trechos a serem publicados no jornal. O API, segundo Mary Jordan, não interferiu no trabalho editorial nem os outros patrocinadores de eventos do Post Live.

>> As discussões sobre energia tiveram mais dois patrocinadores, a rede de hotéis Hilton Worldwide e a Huawei, uma empresa de telecomunicações chinesa. O evento teve como co-anfitrião a organização sem fins lucrativos Bipartisan Policy Center, de Washington, que propõe políticas bipartidárias.

>> Entre os debatedores das mesas-redondas estavam parlamentares, especialistas em energia não partidários e representantes das indústrias de petróleo e gás. Os participantes não receberam cachê; foram voluntariamente.

A Fairness and Accuracy in Reporting levanta dois pontos importantes. “Os ambientalistas, ou quaisquer críticos da indústria de combustíveis fósseis, ficaram ausentes desse ‘debate’”, declarou o grupo. No caso de Tampa, isso foi definitivamente a verdade. Em Charlotte, o deputado Edward J. Markey, de Massachusetts, ambientalista renomado, compareceu. No entanto, nenhum representante dos principais grupos ambientalistas esteve presente a qualquer das mesas-redondas. Mary disse que convidou representantes de dois grupos famosos de ambientalistas, mas eles recusaram. Parte do problema, segundo ela, foi a época das convenções – muita gente estava de férias nessa época e muitos grupos decidiram não acompanhar as convenções deste ano.

O segundo ponto levantado por Fairness and Accuracy in Reporting é que, nas duas páginas publicadas pelo Post com trechos dos debates no dia 11/9, deveria constar o nome do API, em baixo da campanha pela energia, dizendo que patrocinou o evento. Na explicação que o jornal deu sobre o Post Live, deveriam constar os nomes dos patrocinadores coletivos, assim como uma frase dizendo que os patrocinadores no trabalho editorial dos eventos do Post Live. Mary diz que tem planos de fazê-lo no futuro, para trechos de debates a serem publicados.

Com o fracasso do modelo econômico para indústria midiática, a pressão para obter mais receita desses eventos de patrocínio coletivo é considerável. Mas quase sempre os participantes parecem defender opiniões pagas. Seria importante que as regras desses eventos fossem claras para os leitores e que os participantes viessem de um espectro mais amplo de opiniões. Os jornalistas trabalham com a transparência.