Thursday, 12 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1317

O jornalismo e o valor da experiência

Muito interessante e oportuno o artigo “O lamento de um dinossauro“, de Mario Chimanovitch, publicado na Folha de S.Paulo e reproduzido neste Observatório. Tenho a impressão que seria muito importante pesquisas acadêmicas/científicas sobre a “juniorização” da profissão de jornalista ou mesmo das de congêneres da comunicação. O nosso setor parece ser o mais afetado por esse comportamento social, pois não vejo isso ocorrer com a mesma frequência, por exemplo, no Direito, onde a experiência é crédito, nem na Medicina, onde o acúmulo dos anos são fatores positivos.

Parece-me que, a cada ano, profissionais mais jovens ocupam a maior parte dos cargos no Jornalismo, inclusive na edição. É bem provável que a causa esteja nos valores mais baixos de remuneração e também no servilismo, que traz consigo a interessante subserviência absoluta para o patronato. 

Estou na casa dos 50 anos, e há alguns anos trabalhei num grande diário, onde praticamente eu e mais um punhado de gatos pingados estavam naquela faixa acima dos 45 anos. Será que esse panorama etário ocorre na mesma proporção em outros segmentos empresariais ou em outras carreiras de nível superior? Como docente de Comunicação, observo que o fenômeno não se repete na academia, embora a cada ano novos colegas mais jovens adentrem na carreira do ensino comunicacional. 

Mais leve

É interessante notar que as emissoras de TV, que há alguns anos quase não contavam com mulheres jornalistas mais maduras em seus vídeos, passaram a manter ou a recrutar jornalistas com mais idade, mesmo que isso não seja tão atraente esteticamente quanto, por exemplo, as jovens modelos-jornalistas. Seria interessante saber a razão desse reposicionamento.

Acredito que entre os diversos fatores desalentadores da carreira do jornalismo, como os baixos salários, estabilidade e volume de trabalho, aparece o futuro profissional. Vejo que quanto mais os profissionais acumulam experiência, mais se tornam prejudiciais para a maior parte dos coleguinhas. Excetuando os cargos de chefia sênior, onde muitos líderes contam com idades mais elevadas, dali para baixo as gerações mais tenras acabam ocupando todos os postos disponíveis. 

Quero enfatizar, porém, que há muitos jovens recém-formados extremamente capacitados para desempenhar suas funções. Alguns parecem ter, inclusive, talento natural para profissão, surpreendendo pela qualidade do seu trabalho, que mais parece o de um velho jornalista, mas há aspectos que merecem ser mais bem observados.

Dizem que a experiência é um farol que ilumina para trás; contudo, no jornalismo profissional, a labuta cotidiana ajuda a não cometer certos erros fruto do ludíbrio de algumas fontes mal intencionadas. Esse entendimento do trabalho muitas vezes só é conseguido com o aprendizado dos anos ou com a soma dos tijolos culturais com os quais se constrói o conhecimento do mundo. 

Ainda hoje vemos um grande jornal diário em São Paulo lutando para que seus focas aprendam definitivamente a fazer uma legenda, sem que caiam na redundância informativa. Observamos cada vez mais o jornalismo perdendo sua criticidade, a beleza dos textos e a capacidade de aprofundamento, dando lugar, por outro lado, a recursos mais modernos que tendem a facilitar a leitura, porém dificultam a densidade e a percepção intelectual dos fatos e das relações entre eles. O jornalismo tem ficado cada vez mais visual, humorístico e leve, e isso deve trazer consequências para o futuro da profissão.

Conselho de Nelson

A bem da verdade, jovens jornalistas trazem consigo valores que são importantes para a profissão – entre os quais o empenho, interesse, produtividade, capacidade de mudar e experimentar – ou conhecimento de novas tecnologias da informação, mas lhes faltam outras características para as quais só as calosidades do dedilhar das teclas podem contribuir.

Posto isso, acredito que seja muito importante para a profissão estudos que tratem desse tema polêmico e preocupante, pois o tempo tem uma velocidade invisível e quem é jovem hoje, amanhã ficará incrivelmente mais velho. O passar dos anos nos engana e os neófitos, os noviços, tendem a acreditar que sempre estarão nesta condição eternamente. No entanto, a experiência nos mostra que as mudanças acontecem com uma ligeireza impressionante nos dias atuais, principalmente com o advento da tecnologia da informação.

Talvez esteja na hora de testar cientificamente aquela máxima do Nelson Rodrigues. Quando perguntado pelo jornalista e amigo Otto Lara Resende sobre que conselho daria aos jovens, Nelson respondeu de imediato: “Envelheçam!”

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Belo jornalismo discriminatório– P.S.P.

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[Paulo Sérgio Pires é jornalista, publicitário e professor de Comunicação]