Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Show ensaiado por políticos, pela polícia e pela mídia

O brasileiro que nunca comprou ou vendeu um produto de contrabando que atire a primeira pedra nos personagens de Descaminho – O Sorriso do Gato, romance-reportagem que tem como pano de fundo o contrabando no Brasil e a redemocratização do país no início dos anos 1990. No relato, um homem relembra sua juventude, quando se junta a um dos vários grupos de contraventores que, a bordo de pequenos aviões, faz o trajeto entre Paraguai e Brasil, trazendo computadores banidos pela Lei de Informática, perfumes franceses e diversos produtos importados sem recolher impostos, o que caracteriza o crime de descaminho que dá nome ao livro.

Em um dos episódios, o autor relata uma megaoperação conjunta da Polícia e da Receita Federal a mando do novo secretário do primeiro mandato do recém-empossado Fernando Henrique Cardoso, que pretende “fechar os ralos da economia”. Na época, uma das formas de contrabando era por meio dos ônibus que saíam de São Paulo todas as terças e sextas com destino ao Paraguai. A blitz mostra a promiscuidade entre a mídia e a polícia e a atuação do policial que comanda a operação, cuja performance beira uma interpretação de novela para a televisão. Diversos narradores se alternam para contar a história, o que aproxima a narrativa de um documentário cinematográfico. O relato do episódio em questão se dá pela ótica de três personagens: um repórter policial consagrado, o policial que comanda a operação e sente-se a estrela da noite e uma pequena contrabandista que viaja em um dos ônibus e, apesar do medo, decide enfrentar as autoridades constituídas. Por detrás da ironia e do sarcasmo do autor está a sugestão de que parte daquilo que o espectador vê na televisão e nas páginas policiais dos grandes jornais não passa de um show ensaiado conjuntamente pelos políticos, pela polícia e pela mídia, em uma parceria tão antiga quanto nefasta cujo único propósito é manipular a opinião pública.

O escritor e roteirista Alexandre Gennari, nasceu em São Paulo e vive hoje entre a capital e a cidade histórica de São Luiz do Paraitinga. Em minibiografia na contracapa do livro, declara que, entre outras tantas atividades, foi também muambeiro, mas perguntado se é personagem no livro, Gennari nega. Criador do site WebwritersBrasil em 2001, festeja o vínculo do livro com a internet, com versão ebook, um single gratuito com o primeiro episódio, um book trailer no YouTube e página no FaceBook.

O contrabando no Brasil não acabou, apenas mudou de lugar e deixou de ser pauta no show do noticiário policial. Perdeu espaço para novas estrelas, como o tráfico por exemplo.

Sinopse

Este romance tem como pano de fundo o contrabando no Brasil e a redemocratização do país. Um homem relembra sua trajetória no contrabando – ele e seu chefe voam em um pequeno avião que é abatido pela Polícia Federal. A partir daí, ele volta ainda mais no tempo e relembra ascensão e queda do esquema para o qual trabalhou até o voo fatídico. Ao relembrar cada um dos personagens com quem trabalhou, reconstrói passo a passo o contrabando entre Brasil e Paraguai no início dos anos 1990 (redemocratização e abertura de mercado). Lembra-se das rivalidades entre os membros do grupo, da perseguição da polícia, da relação com um dos clientes (o maior contrabandista do país), especula sobre uma possível traição e conta a história de um grande amor. No final, revela a um personagem inusitado as consequências do abate narrado no início e o destino de cada um dos personagens.

O autor

Alexandre Gennari é escritor e roteirista. Viajou por grande parte do Brasil nos anos 1980 e viveu na Flórida nos anos 1990. Paulistano, vive hoje entre a capital e a cidade histórica de São Luiz do Paraitinga. Fez de tudo na vida. Foi coordenador de eventos, cartorário, vitrinista, marqueteiro, empresário, muambeiro e vendedor. Hoje, essas experiências servem de combustível para sua imaginação. Escreve profissionalmente desde 2000. Criou o site Webwritersbrasil em 2001. É autor de um livro de contos e de dois filmes: Ouço Passos no Escuro e Os sons do Divino e o Espírito Santo do silêncio, selecionado no Festival CineBrasil de Estocolmo, entre outros.

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[Jô Amado é jornalista]