Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Fotode bebê morto em Gaza é parte da verdade

Uma fotografia pode valer mais do que mil palavras, mas mesmo no máximo que revela, ela não conta a história inteira. “É a captura de um único momento, a versão da verdade em uma fração de segundo”, avalia o ombudsman doWashington Post, Patrick Pexton, em sua coluna [23/11/12]. No entanto, se for uma fotografia eficaz, ela é capaz de levar o observador para uma verdade mais ampla. Foi esse, com certeza, o caso da fotografia publicada na primeira páginada edição doPost de 15/11, exibindo a angústia de um homem segurando o corpo de seu filho de 11 meses, morto durante o bombardeio aéreo de sua casa, na Faixa de Gaza.

O fato de o homem ser palestino – não um terrorista, mas um jornalista – e de a bomba ter sido jogada por israelenses, no entender do ombudsman do Post, é quase secundário. A foto descreveu a perda e a dor, o custo horrível de vidas inocentes de ambos os lados da violência no Oriente Médio. Mas muitos leitores do Post viram com outros olhos. Um grande número de judeus reclamou com o ombudsman e os editores do jornal, dizendo que a foto era tendenciosa.

Mary Anne Golon, diretora de fotografia do Post, explicou que o objetivo de qualquer foto na primeira página, independentemente do assunto, é o de envolver o leitor, seja pela beleza, pelo sentimento ou pelo drama. “Naquela noite, quando pegamos as fotos do Oriente Médio para escolher, essa foto emocionou todo mundo”, disse Mary Anne. “Foi direto ao coração, aquele homem chorando a perda de seu filho bebê.” Então, a equipe do Post autenticou e checou os fatos por trás da foto da Associated Press. O bebê morto era verdadeiro. O bombardeio era verdadeiro.

Aparato militar

Muitos leitores perguntaram por que o Post não buscara o equilíbrio publicando a foto da dor daquele pai e uma de israelenses que teriam perdido parentes no bombardeio com mísseis lançados de Gaza. A questão é válida. A resposta é que o Post não pode publicar fotos que não existem. Nenhum civil israelense fora morto pelos mísseis de Gaza desde 29/10/11, mais de um ano antes. As primeiras mortes de civis israelenses devido aos mísseis lançados de Gaza em 2012 só ocorreram em 15/11/12, quando o Hamas, grupo que controla a Faixa de Gaza, começou a lançar mísseis mais precisos e mortais em resposta à ofensiva israelense que começara na véspera. Na noite de 14/11, não havia fotos recentes de perdas israelenses. Assim mesmo, numa página interna da edição de 15/11, o Post publicou a foto de uma mãe israelense procurando refúgio, num abrigo contra bombardeios, com seus filhos pequenos.

É possível, portanto, concordar que o bombardeio de mísseis a partir de Gaza é condenável e tem por objetivo aterrorizar civis israelenses. É preocupante e é traumático. Porém a imensa maioria dos mísseis lançados de Gaza tem o efeito de uma picada de abelha no traseiro dos israelenses. Esses mísseis não são teleguiados, são erráticos e carregam cargas explosivas bastante pequenas. Normalmente, caem em áreas abertas, causando poucos danos ou ferimentos.

Além dos mísseis serem fracos, os mecanismos de defesa de Israel são fortes. No sul do país, existe uma longa rede de abrigos contra bombardeios e o novo Domo de Ferro, parcialmente construído com financiamento americano, provou ser o melhor sistema antimísseis já desenvolvido. As Forças de Defesa de Israel representam, de longe, o mais poderoso aparato militar na região, equipado com praticamente todas as armas de que dispõem as forças armadas americanas.

Parte importante da verdade

A Faixa de Gaza, por outro lado, é quase inteiramente urbana e com população muito densa; as bombas matam civis independendo da precisão com que são lançadas. Na Operação Chumbo Fundido (Mivtza Oferet Yetsuka, em hebraico), a ofensiva lançada por Israel no final de 2008 e início de 2009 contra os mísseis de Gaza, foram mortos de 1.200 a 1.400 palestinos, cerca da metade deles pertencentes ao Hamas ou a outros grupos de resistência na região; a outra metade era de civis. Já do lado de Israel, só morreram três civis e dez soldados. No conflito recém-suspenso, que Israel chamou Operação Pilar de Defesa, fontes do Ministério da Saúde palestino avaliam que foram mortas de 100 a 133 pessoas em Gaza, incluindo militantes. A Anistia Internacional avalia o número de mortes em Gaza em 66. Do lado de Israel, morreram quatro civis e dois soldados.

A foto da primeira página na edição de 15 /11 do Post pode não ter contado a história inteira do conflito na Faixa de Gaza, mas contou, com certeza, uma parte importante da verdade.