Existe uma enorme relutância em acreditar que as lições a tirar da regulação de uma indústria podem ser aplicadas a outras; e que podemos aprender sobre serviços financeiros a partir da eletricidade, ou de farmacologia a partir de empresas aéreas. Mas muitas vezes há paralelos relevantes.
Ninguém que tenha lido o inquérito do juiz Brian Leveson sobre os padrões da imprensa britânica pode por em dúvida que o comportamento de alguns jornais foi vergonhoso e que a Comissão de Reclamações sobre a Imprensa (PCC, sigla em inglês) se mostrou inútil. Mas o juiz adotou a posição do advogado que acredita que resultados ruins são decorrentes de procedimentos ruins e que a solução está em procedimentos melhores – uma perspectiva compartilhada tanto pelos que o criticam quanto pelos que o apoiam.
Há muitas semelhanças entre a reação em resposta à crise da imprensa de 2011 e à crise financeira de 2008. Em ambos os casos a exigência por melhores processos e novas regras passou longe do alvo. O verdadeiro problema não tinha a ver com regras e processos, e sim com o contexto político em que foram aplicados. O comportamento da imprensa que justificou a maioria das críticas foi o dos grampos telefônicos destinados a revelar a vida privada das pessoas no noticiário. Como observaram muitos comentaristas, essa atividade já era ilegal. No entanto, ela ocorreu, e aparentemente em grande escala. Os jornalistas envolvidos achavam que se sairiam bem e em grande parte estavam certos.
O barulho dos portões do estábulo
Até julho de 2011. O que mudou não foi a lei nem a regulação, mas o clima político. Até então, os políticos avaliavam uma relação de proximidade com setores da imprensa – e especialmente aqueles vinculados a Rupert Murdoch – como essencial para obter e manter cargos de relevância. Após essa data, um relacionamento de proximidade com os barões da imprensa tornou-se uma responsabilidade. Seguiram-se investigações bastante abrangentes sobre irregularidades jornalísticas e acusações.
A analogia com a regulação dos serviços financeiros britânicos aparece de novo. Em julho de 2012, o Banco da Inglaterra e a Autoridade de Serviços Financeiros insistiram e conseguiram a demissão de Bob Diamond do cargo de diretor-executivo do banco Barclays e exigiram do banco que fizesse algumas mudanças fundamentais em sua abordagem aos negócios. Isto não foi porque os reguladores tivessem obtido novas informações sobre o banco: o escândalo dos índices Libor e outros acontecimentos que foram alvo de críticas justificadas já eram de seu conhecimento há um bom tempo. Nem sua ação foi facilitada por mudança alguma nas regras ou na organização da regulação. O poder para demitir diretores de banco sempre existiu. A diferença estava na mudança na opinião política que se seguiu à revelação pública de um mau comportamento muito abrangente.
Mas nos serviços financeiros e na indústria jornalística são a mecânica e as instituições de regulação que chamam a atenção. Qual deveria ser a composição e a postura legal de um órgão que supervisiona a imprensa? A supervisão dos bancos deveria estar a cargo do banco central ou em outro lugar? Assim, percebemos regras que teriam evitado a crise mais recente se tivessem existido dez anos antes. A metáfora que persiste para a política de regulação é o barulho dos portões do estábulo sendo firmemente trancados depois do cavalo.
A independência do órgão regulador
O conteúdo dos manuais de regras, as sanções à disposição dos reguladores e a composição dos órgãos de regulação não são questões banais. Mas o principal motivo para que a imprensa e a regulação e dos serviços financeiros fossem indisciplinadas foi porque os líderes políticos quiseram que fossem indisciplinadas. Num dos casos porque foram intimidadas pelo perceptível poder da imprensa; e no outro porque defendiam uma opinião exagerada da importância econômica da indústria de serviços financeiros e da capacidade daqueles que a dirigiam.
A regulação sempre funciona num contexto político. E assim deveria ser. A regulação é o meio pelo qual se exige das grandes indústrias que esclareçam as preocupações com políticas públicas de uma ampla população e numa sociedade democrática é pela regulação que essas preocupações se manifestam. A independência deveria significar que os órgãos reguladores têm a liberdade de tomar decisões no dia a dia sem qualquer interferência política, e não que os órgãos reguladores têm a liberdade de definir por si sós os rumos da política a ser adotada.
Da catástrofe de Fukushima aos escândalos da imprensa, do acidente com o módulo espacial da nave Challenger à crise financeira, temos a tendência a culpar a máquina e os agentes pelos acidentes de sistemas. Mas a verdadeira responsabilidade geralmente está muito acima, opina John Kay [Financial Times, 9/1/13].
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