Wednesday, 18 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

Quem soube sabe?

O momento é de transformação na indústria da comunicação. Surgem novas mídias, novos formatos e vetores. O “modus operandi” do mercado se altera, veículos tradicionais perdem lugar para a novidade, tradições arrefecem. Ameaças e oportunidades se misturam.

O aumento da penetração da TV paga faz a quantidade de canais se expandir de forma acelerada. Emissoras de TV aberta perdem espaço para canais segmentados. Tendência que só se intensificará.

Inserida nesse ambiente está a TV Cultura, que, a partir do próximo mês, contará com novo presidente-executivo. Sua marca é lembrada com carinho e possui atributos valiosos. Mas sua programação é morna e pouco relevante.

A palavra aqui é vitalidade. Não há. Ao passar pelo canal, percebemos que tecnicamente tudo é bom e correto, os apresentadores, os cenários, as chamadas, a organização da grade. Mas falta vida, falta atrair, é burocrática. A TV Cultura envelheceu mal. Precisa atualizar-se.

Investimento produtivo

O ponto de partida seria o próprio nome: TV Cultura. Num significado menor, cultura confunde-se com erudição, distante da maioria. Num significado mais amplo, cultura é o ambiente ao redor e a maneira pela qual aprendemos a percebê-lo. No último, cultura e comunicação se entrelaçam –é por intermédio da cultura que ocorre a comunicação.

Entendida assim, a palavra cultura nos indica que a TV Cultura poderia propiciar novos olhares. Cabe sugerir que o caminho seria abordar temas atuais e relevantes de um ponto de vista inusitado e não convencional, de forma a abrir novas perspectivas para a sua audiência, fugindo do lugar-comum e da análise superficial, sem cair no erudito inaccessível ou folclórico desinteressante. Um desafio.

Sem cair na armadilha da quantidade versus qualidade, pois boa programação atrai bons números de audiência. Há que se propor movimentos mais contundentes na programação. Alguns passos já foram dados. A aproximação com a produção independente, o lançamento de formatos e o uso da segunda tela são boas iniciativas, mas é pouco.

Por que não pensar na BBC? Uma TV pública que é exemplo para o mundo, experimenta e inova com excelentes resultados. Atualiza-se com velocidade, pois preocupa-se com sua audiência, em ser relevante e em comunicar o que acredita interessar ao seu público entendido de forma ampla. Mais do que uma TV, a BBC é uma marca forte com atuação multiplataforma.

Contentar-se com números de audiência que surgem depois da vírgula é pouco. Os recursos do Estado estão alocados e serão gastos. A TV Cultura não pode ser um desperdício, e o momento não é para timidez.

Polo de vanguarda

O audiovisual é setor estratégico e em forte transformação. Cabe à Fundação Padre Anchieta participar de forma ativa desse desenvolvimento. O audiovisual ajuda na construção das identidades. É importante que o Estado contribua para uma construção rica. Assim, colaborará na criação de cidadãos mais autônomos e conscientes.

A TV Cultura deve voltar a ser polo vanguardista na produção midiática, o canal em que surgem novos e importantes formatos de comunicação. Não há tempo a perder.

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André Mantovani, 49, é consultor e mestre em comunicação e semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Foi presidente da MTV Brasil e vice-presidente de gestão da Fundação Padre Anchieta