Saturday, 23 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Em defesa da neutralidade da internet

O anúncio de que a presidente Dilma Rousseff pretende levar à assembleia da ONU (Organização das Nações Unidas) a proposta de neutralidade da rede (Internet) é um gesto de largo alcance.

Primeiro, pelo reconhecimento de que a Internet é uma questão global – embora tenha que se assegurar o poder soberano do país sobre as grandes corporações globais.

Segundo, a convicção de que neutralidade da rede é essencial para promover a isonomia e permitir a manutenção do atual ambiente de inovação e empreendedorismo e, principalmente, a pluralidade e liberdade de opinião que caracteriza a rede.

Ao longo de sua história, os diversos ciclos tecnológicos foram submetidos ao controle monopolista, seguindo o mesmo ciclo:

1. Surge uma inovação radical. Em um primeiro momento pequenos empreendedores se valem dela para criar novos modelos de negócios.

2. No momento seguinte um agente qualquer, amparado em poder econômico próprio ou associado a poder financeiro, passa a concentrar poder no novo mercado..

3. Com o poder consolidado, trata de sufocar a competição.

Isonomia tributária

Maior monopólio da história, a AT&T controlava a telefonia nos Estados Unidos e mantinha os Laboratórios Bell para prospectar o futuro. Organizou um contingente impressionante de PhDs, Prêmios Nobel, trabalhando em inovação.

No entanto, era colocada de lado qualquer inovação que pudesse ameaçar a tecnologia vigente.

A tecnologia de armazenamento de dados – os HDs – foi desenvolvida nos anos 30 por um engenheiro da Bell, Clarence Hickmann, que inventou um precursor das secretárias eletrônicas. Mas julgou-se que sua introdução afetaria as ligações telefônicas. Foi deixado de lado.

Outras inovações, como fibra ótica, telefone celular, máquinas de fax, a tecnologia DSL (de banda larga pelas linhas de cobre) foram engavetadas, para não colocar em risco o mercado convencional da AT&T.

Não há nada mais similar ao modelo soviético de planejamento do que o controle centralizado de setores por monopólios privados. Concentra-se todo o poder de inovação nos órgãos centrais que, pelo próprio acomodamento trazido pelo controle absoluto do mercado, deixam de inovar, perdem a sensibilidade das novas demandas e matam qualquer avanço que possa produzir um novo ciclo tecnológico.

Daí a importância do Marco Civil da Internet, atualmente em discussão.

Para evitar a formação de monopólios, há alguns pontos essenciais:

1. Não se pode permitir o predomínio das empresas de telefonia, selecionando categorias de usuários para o trânsito de dados. Por isso mesmo, nem se pensar em submeter o setor ao Ministério das Comunicações ou à Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações).

2. Para impedir o controle do mercado pelos grandes players internacionais – Google e Facebook – tem que se assegurar a neutralidade nos mecanismos de busca e também a interoperabilidade nas redes sociais.

3. Tem que se assegurar a isonomia tributária entre as tecnologias convencionais (TV a cabo, jornalismo, publicidade) com as grandes redes sociais.

4. Não se pode responsabilizar os grandes provedores por abusos cometidos por usuários. Pois significaria colocar em suas mãos o poder de censura.

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Luis Nassif é jornalista