A crônica esportiva brasileira consagrou a expressão “pisando na bola” como uma ação natural de um aprendiz de jogador que acaba se espatifando no chão ao tentar dar uma de equilibrista em cima da redonda. Foi exatamente isso o que ocorreu no programa jornalístico de maior audiência da TV brasileira, o Bom Dia Brasil, da TV Globo, na sexta-feira (27/9), na matéria sobre os apagões de energia elétrica. O jornalismo praticado na nona potência mundial, especialmente numa emissora que está entre as cinco mais equipadas do planeta não pode ser igual ao da Guatemala nem da Bolívia, sem demérito para os coleguinhas desses países.
Os brasileiros mais conscientes, em grande parte, acostumaram-se a só sair de casa de manhã durante a semana depois de assistir ao Bom Dia Brasil. Esse comportamento, por si só já deveria ser suficiente para o jornalismo da emissora ter uma noção mais precisa do seu grau de responsabilidade pública para com a informação. Por isso, a questão dos apagões não pode ser tratada amadoristicamente, como ocorreu sexta-feira.
O telespectador ficou com algumas impressões como: 1) o país está às vésperas de ter novos apagões; 2) esses apagões poderão se estender a todo o país; 3) os investimentos previstos vão superar os apagões dos estados mais prejudicados; 4) bastam os investimentos previstos para os problemas serem superados; 5) a matriz energética brasileira se limita à fonte hidroelétrica (que abastece as áreas citadas na matéria).
Cadê as energias eólica e solar?
Enfim, não se pode falar em apagões sem mencionar a questão principal por trás deles: a incompetência governamental na administração da matriz energética brasileira.
Reajuste das tarifas à vista; pressionado pelos apagões, governo vacila sobre matriz energética… O governo brasileiro está como barata tonta em meio a um tiroteio. Os protagonistas responsáveis são os apagões que vem ocorrendo com uma frequência cada vez mais irritante em diferentes regiões do Brasil. E isso já vem repercutindo no humor do torcedor internacional que pretende assistir às Olimpíadas e aos jogos da Copa de 2014.
Sem cuidar da questão global que é a matriz energética, o governo prefere focar apenas na questão conjuntural. Por causa da falta e da escassez de água nos reservatórios e da falta de chuva nas cabeceiras dos rios e hidroelétricas fechadas, o governo resolveu financiar a produção de energia através do sistema térmico, onde o megawatt/hora custa R$ 1.000,00 contra os R$ 100,00 do megawatt da energia hidroelétrica. Os 65 fornecedores de energia, na ponta da distribuição, estão felizes: o governo banca a conta inicial e quem paga a conta principal são os consumidores. Será inevitável o aumento da tarifa de energia nos próximos dias. Estamos de pêsames, mas pelo menos não ficaremos às escuras.
Por quanto tempo pagaremos pela incompetência governamental? Cadê as energias eólica e solar? Não se compreende como o Brasil pode desperdiçar tantos ventos e tanto sol com um problema energético dessa ordem. Até se justifica essa opção obrigatória pelo uso das térmicas: porém essa decisão ainda é tardia porque já interferiu negativamente na produção industrial do país no primeiro semestre. Sobre isso, o governo não diz uma palavra sequer para não assustar ninguém nem causar alvoroço nos políticos.
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Reinaldo Cabral é jornalista e escritor