Lei deve ampliar previsões de direito de resposta?
O direito de resposta está na Constituição. Tendo em vista a revogação da Lei de Imprensa pelo Supremo, em 2009, seria normal a notícia da tramitação de projeto para regulamentar as regras do jogo.
Mas o texto aprovado pelo Senado Federal recentemente e remetido para a Câmara dos Deputados (projeto de lei nº 141/2011) é uma ameaça à liberdade de expressão, ao direito de crítica e ao jornalismo independente.
É verdade que o Senado expurgou barbaridades do projeto original, de autoria de Roberto Requião.
Entre as propostas fascistas de Requião estava a possibilidade de o juiz, para garantir a publicação da resposta, determinar a “remoção de pessoas e coisas” (o editor do jornal? O servidor?), a “aquisição de equipamento” (uma gráfica?) e a “suspensão das atividades do veículo de comunicação social”, com força policial, por até 90 dias. Lembra o Estado Novo. No texto aprovado, sobrou o silencioso e sinistro poder de “adotar as medidas cabíveis”.
O que o projeto pretende é, sob o manto aparentemente imparcial do Poder Judiciário, criar embaraços para a circulação de notícias e opiniões.
Estabelece que a retificação espontânea, com “os mesmos destaque, publicidade, periodicidade e dimensão do agravo”, não impede o exercício do direito de resposta. Assegura, assim, um direito desnecessário. “Excepcionalmente”, diz o projeto, pode ser exigida “edição extraordinária”. Para ser concedido o direito de resposta, basta a “verossimilhança da alegação”.
Em tese, direito de resposta existe contra a publicação de fato inverídico ou ofensa (calúnia, difamação e injúria). O texto amplia temerariamente o cenário: permite direito de reposta também para atentados contra intimidade, reputação, conceito, nome, marca e imagem da pessoa física ou jurídica “identificada ou passível de identificação”.
Fixa a competência do juiz do “domicílio do ofendido” ou o lugar onde o “agravo tenha apresentado maior repercussão”. O ofendido escolhe. Pela antiga Lei de Imprensa, era o local onde se situa o veículo de comunicação. E não era à toa.
Na contramão
Vamos imaginar duas hipóteses. O presidente do Senado, com vários domicílios, pode escolher Murici, em Alagoas, cidade politicamente dominada pela família há décadas, onde o juiz provavelmente é gente amiga. O senador Requião pode escolher uma das muitas pequenas cidades do Paraná, onde o “agravo” terá “maior repercussão” e assim se beneficiar de eventual juiz amigo.
O texto assegura algo sem lógica jornalística: a publicação da resposta no “mesmo espaço”. Nenhum jornal sério abriria o precedente, por exemplo, de publicar uma resposta no espaço reservado aos editorais.
O projeto chega a proibir despacho liminar para impedir o cumprimento de sentença arbitrária. Um magistrado de segunda instância pode suspender liminarmente uma ordem de prisão, mas não poderia suspender a decisão que defere direito de resposta. Tem de levar o caso para o colegiado.
Direito de resposta imposto pelo poder público deveria ser algo excepcional. A Folhaabriga com absoluta naturalidade, não apenas visões críticas em torno do seu noticiário e dos seus erros, mas também manifestações de quem se vê atingido. Collor e José Dirceu encontraram em suas páginas espaço aberto e franco para se defender, independentemente de lei e juízes.
O Supremo declarou a mais plena liberdade de imprensa no Brasil, mas os parlamentares, como se de fato não tivessem isenção para legislar sobre a matéria, estão sempre empenhados em proibir, censurar e, sobretudo, em tentar se proteger.
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Luís Francisco Carvalho Filho, 55, é advogado e articulista da Folha