Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Presidente faz campanha contra ampliação de grupo de mídia

A concentração de mídia é um tema sensível na América Latina, onde vários governos de esquerda acusam a imprensa de tentar prejudicar suas administrações. Alguns presidentes chegaram a aprovar leis para dividir conglomerados e limitar sua influência. Para alguns críticos, trata-se de uma tentativa de amordaçar uma imprensa livre.

A polêmica mais recente deu-se no Peru, com a compra pelo Grupo El Comércio, no ano passado, da maior parte das ações da Empresa Periodística Nacional S.A., conhecida como Epensa, pelo equivalente a 40 milhões de reais. A aquisição, que aumentou de 50 para 70 o percentual do grupo no mercado de jornais peruanos, foi criticada por alguns grupos preocupados com o impacto na liberdade de expressão e na diversidade de opiniões.

O debate foi intensificado por uma declaração do presidente Ollanta Humala, logo no início do ano, acusando o Grupo El Comércio de ameaçar a liberdade de expressão no país. O El Comércio rejeita as acusações. “É vergonhoso termos um grupo que praticamente é dono de toda a mídia. É perigoso”, disse Humala, que pediu ao Congresso para debater a concentração de mídia.

Os veículos do Grupo El Comércio desempenham um papel importante na agenda política do Peru. Antes da polêmica aquisição, o grupo já era proprietário do El Comércio, um dos jornais mais antigos do país, com circulação diária de 94 mil exemplares. O jornal publica conteúdo do Wall Street Journal em espanhol.

Relação tumultuada com presidente e concorrentes

O grupo também é proprietário do jornal de economia Gestión e do tabloide Trome, considerado o maior jornal em espanhol do mundo, que registrou tiragem de 700 mil exemplares na primeira metade de 2013. O grupo tem outros jornais, além de duas emissoras de TV e outros negócios. A compra da Epensa aumentou o alcance do El Comércio fora de Lima, com a aquisição de outros dois jornais populares, o Ojo (300 mil cópias vendidas na primeira metade de 2013) e o Correo (circulação diária de 164 mil). O país tem uma população de 30 milhões de pessoas.

A relação do presidente com a mídia não é das melhores. Durante a campanha presidencial, em 2011, os partidários de Humala acusaram o El Comércio de fazer uma cobertura favorável à oponente dele, Keiko Fujimori, filha do ex-presidente preso Alberto Fujimori. O ex-presidente ainda responde a acusações de suborno a proprietários de mídia nos anos 1990 em troca de uma cobertura favorável durante sua administração. Ele nega as acusações.

Principal concorrente do El Comércio, o grupo de mídia La República Publicaciones tem feito campanha para que seja cancelada a compra da Epensa. Em novembro, um grupo que inclui o diretor do La República e outros jornalistas conhecidos abriram uma ação contra o El Comércio alegando práticas de monopólio.

O La República, que tem uma linha editorial de esquerda, diz ter 17% do mercado de jornais do país. O grupo tentou comprar a Epensa para tentar contrabalancear o mais conservador El Comércio. O escritor Mario Vargas Llosa, que ganhou o Nobel de Literatura em 2010 e apoiou Humala durante as eleições presidenciais de 2011, retirousua coluna do El Comércio durante a campanha presidencial devido a acusações de que estava “manipulando informação”. Sua coluna é agora publicada noLa República. Llosa é crítico de governos que tentam censurar a liberdade de expressão e classificou o domínio do mercado peruano pelo El Comércio de uma “potencial ameaça à democracia”.

Contra lei que prejudique a liberdade de expressão

Para o executivo-chefe do El Comércio, Cesar Pardo, os comentários de Humala levantaram temores de que seu governo venha a promover uma legislação que pode prejudicar a liberdade da imprensa ao limitar a propriedade de mídia. “É um grande risco, porque toda lei que foi aprovada para controlar a concentração da propriedade da mídia foi feita com um pretexto para o bem comum, mas acabou por censurar os meios de comunicação”, disse Pardo, acrescentando que com TV, mídias sociais, rádio e internet é impossível dizer que não há diversidade de opiniões no país.

Diversos oponentes de Humala manifestaram apoio ao Grupo El Comércio, como a ex-candidata Keiko e o ex-presidente Alan Garcia. O Instituto para Imprensa e Sociedade, grupo de defesa da liberdade de expressão com sede em Lima, declarou que, mesmo que a concentração de mídia seja um risco potencial para a liberdade de expressão, o governo deve ficar fora do debate.