Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Mídia, qual mídia?

Revelar, a fundo, a influência da mídia na civilização é uma prática antiga, antes executada principalmente por estudiosos sobre o assunto e intelectuais, porém que tem se tornado cada vez mais corriqueira entre os leigos, que arriscam análises simplistas na rede social. Esta popularização do debate, mesmo de forma superficial, pode ser o despertar de uma nova geração, que aguçou sua criticidade. Sem dúvida, é incontestável o poder de manipulação que estes meios promovem contra e a favor da liberdade de concretização do pensamento.

Quando penso na palavra mídia e sua interferência no mundo, a imagem visualizada é de um ser humano com um grande funil na cabeça absorvendo toda e qualquer injeção de produção midiática, seja por meio do rádio, da televisão, dos jornais, revistas, da publicidade, da internet… Na vida real, normalmente, é o que ocorre, pois, fazendo uma analogia ao funil, não há um filtro em sua terminação a ponto de triar o que deve e não ser aproveitado para construção do conhecimento. A absorção sem critério nos faz reféns, transforma nosso comportamento, gera ações e, estas, na sequência, se tornam hábitos, saudáveis ou não.

A mídia, como um todo, sem nenhuma discrição, propaga a apologia ao crime, à violência, à aquisição de drogas licitas e ilícitas, fomenta a erotização precoce, o sedentarismo, ao mesmo tempo em que impõe o estereótipo do corpo perfeito, além de incentivar o consumo demasiado – de alimentos, bebidas, vestuário, calçados e tudo que a publicidade nos convença a comprar. Dentro da grade ofertada pelos meios de comunicação de massa, minha percepção me leva a quantificar que mais da metade (numa perspectiva otimista) oferece conteúdo não-direcionado à edificação educacional, independente da faixa etária, já que o ser humano está constantemente em construção.

Ferramenta indispensável

As ofertas educacionais, quando bem aproveitadas pelos pais de filhos pequenos, constroem cidadãos conscientes e despertam neste público o senso crítico da necessidade de triagem. O plantio desta cultura nas crianças não é nada fácil. Seria preciso “desconstruir” muitos adultos, responsáveis por elas. O reality show do momento, as cenas de violência, sexo e traição nas novelas, o sensacionalismo dos telejornais e impressos, além de jogos eletrônicos brutais, por exemplo, estão na moda, são os assuntos entre os coleguinhas de classe no recreio da escola e no bate-papo das rodinhas de amigos. Concordemos ou não, é o que gera audiência, o que os socializam. E onde têm acesso a isso?

A liberação de conteúdo não vem a conta-gotas, mas de enxurradas que deixam de trazer uma das principais exigências dos menores: o clamor por limites. Quando qualquer assunto ou ato “proibido” surge em família, muitos pais se mostram “horrorizados” com os questionamentos dos menores, porém pouco fazem para a reversão desta ingestão negativa.

Somados à exploração comercial e social voltadas deste público tão vulnerável, estão incorporados os desejos desenfreados de consumo de seus responsáveis. Frustrados, os adultos acreditam que a aquisição de bens materiais pode suprir deficiências na educação e afetividade, o que definitivamente não ocorre.

A informação, em todas as suas formas, é indispensável para construção do conhecimento. Estar atualizado é uma “exigência de vida” nos dias atuais. O jornalismo e os programas educativos sustentam a arte de informar para transformar. Reverter hábitos dos adultos, torná-los mais decisivos de seu consumo midiático e investir no pequeno cidadão pode tornar a sociedade apta a, pelo menos, se questionar: mídia, qual mídia?

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Leandro Nigre é jornalista, pós-graduando em Mídias Digitais Interativas e editor de O Imparcial, veículo assistido pelo projeto Grande Pequena Imprensa