Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Acuados pelo medo

Uma pesquisa do Instituto Data Popular, realizada em 2013, aponta uma triste realidade da educação pública brasileira. Quatro em cada dez professores do estado de São Paulo já sofreram algum tipo de violência dentro da escola. Isso representa 44% dos docentes da rede pública paulista. As agressões são diversas. Vão desde mordidas a chutes, pontapés, insultos, dano ao patrimônio e bullying. De acordo com o levantamento, encomendado pela Apeoesp (o Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo), de um universo de 240 mil docentes, 20 mil afirmam que já sofreram violência física. Cerca de 90% dos agressores são alunos e 10% parentes, conhecidos e até mesmo outros professores.

Outra pesquisa mais recente, realizada em março deste ano, apontou para a ocorrência de alunos armados com estiletes, canivetes e facas dentro das escolas. Esta é a cruel realidade que os docentes são obrigados a enfrentar diariamente. Ameaçados, agredidos, violentados, ultrajados e intimidados por alunos cada vez mais violentos e desafiadores, os professores paulistas convivem com uma rotina de terror. Acuados pelo medo.

E é neste hostil ambiente escolar que o articulista de Veja Gustavo Ioschpe, em seu infeliz “Professores, acordem!”, publicado no dia 11/5 na versão online da revista, afirma existirem professores que, ao invés de trabalhar, simplesmente passam o tempo da aula lendo jornal ou “vadiando” nas redes sociais (no Facebook, ao certo). Uma cena que, certamente não faz parte do roteiro diário dos docentes. A realidade é outra!

Diante da violência indiscriminada, é grande o número de docentes afastados da sala de aula por problemas psiquiátricos, como a síndrome do pânico. A categoria está doente! E impotente, diante da impunidade. Já os agressores, em sua maioria estão a salvos sob a toga do ECA, que os tornam imunes a qualquer espécie de punição. O clima de violência nas escolas é reflexo de uma sociedade que parece trabalhar pela extinção da figura do professor. Aliás, a educação pública brasileira é uma instituição falida e sua estrutura esquizofrênica. Afinal, não há lógica em culpar o professor pela falta de qualidade do ensino. Isso é uma inversão de responsabilidades. O topo desta pirâmide são os governantes, não os docentes, como chega a inferir em seu discurso de ódio, o articulista de Veja.

Escolas e presídios

“Não deve haver, nos 510 milhões de quilômetros quadrados deste nosso planeta solitário, um grupo mais obstinado em ignorar a realidade que o dos professores brasileiros”, dispara o ilustre pensador, em sua diarreia literária. Diante desta e de outras afirmações, me questiono se o autor do texto realmente vive em algum ponto destes milhões de quilômetros quadrados deste solitário planeta. Afinal, como afirmar que os professores ignoram a realidade? Ao contrário! A categoria grita todos os dias aos quatro cantos sua lastimável rotina. São vozes de educadores desesperados, impotentes e violentados por colegas, pela sociedade, pelos alunos, pelo Estado. Sim, também gritam por melhores salários. Afinal, além de terem que enfrentar um cenário de guerra nas escolas, ainda têm a desvalorização salarial.

Mas para o articulista de Veja, salário não é importante. “O respeito da sociedade não virá quando vocês tiverem um contracheque mais gordo […]”, afirma Ioschpe. O autor chega ao acinte de falar que a educação brasileira recebe uma “enxurrada de dinheiro”. Uma falácia! Pois é de conhecimento público que o salário dos professores brasileiros é vergonhoso. Além disso, qualquer imbecil que não tenha vendido seus neurônios para o sistema corrupto, sabe que o Brasil gasta mais com presidiários do que com a educação. Um aluno brasileiro do ensino médio custa apenas R$ 2.300,00, em média, enquanto um preso chega a custar aos cofres públicos nove vezes mais, ou R$ 21.000,00 por ano.

Portanto, é preciso aumentar, sim, os investimentos em educação, como defende o pedagogo Francisco de Paula Melo Aguiar, doutor em Ciências da Educação e membro da Academia de Letras do Brasil. “É certo de que fazer um maior investimento nos chamados direitos sociais, para ter resposta justa e positivamente com a diminuição da despesa com segurança pública em todos os sentidos, dentro e fora dos presídios”, afirma o imortal. Sintetizando, investir em escolas, em educação de qualidade, é melhor que em presídios. Ou será que não?

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Genisson Santos é jornalista e comunicólogo