Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

O pano de prato e a desigualdade social

Fátima Bernardes ganhou um pano de prato no programa Encontro com Fátima Bernardes de quinta-feira (11/9), quando a pauta homenageava A Grande Família e falava de pessoas “que adoram viver no subúrbio” – como Lineu, Nenê, Tuco, Bebel, Agostinho e agregados. “Adorei meu presente! Olha só, gente, vai direto para a minha cozinha”, disse ela às câmeras após desembrulhar o presente, no palco, ao vivo.

O mimo foi enviado por Sheila, uma moradora de Rocha Miranda, no Rio, que recebeu a reportagem em casa para mostrar “como vive uma família suburbana”. Foi embrulhado no mesmo papel da cesta de frutas artificiais enviada a ela pela ex-apresentadora do Jornal Nacional. “Sheila, exatamente. Não pode desperdiçar o papel. Minha mãe fazia muito isso: não rasgava o durex, tirava a fita com bastante cuidado e depois até passava o papel”, comentou Fátima.

Durante o programa, o subúrbio foi mostrado como lugar animado, onde se valorizam hábitos como dar um pratinho de bolo no fim da festa e onde “é feio não levar um presentinho” à dona da casa na primeira visita. É possível que muitos telespectadores, vendo a casa de Sheila, decorada com bibelôs e toalhinhas de crochê, tenham imaginado a casa de Fátima Bernardes e se perguntado: quando começou a desigualdade entre nós?

A vaidade e o desprezo

O pensador suíço Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) diz, em Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens (1753), que a instituição da propriedade e das leis foi determinante para a hierarquização social moderna. “Sendo quase nula a desigualdade no estado de natureza (quando o homem vivia na floresta), deve sua força e seu desenvolvimento a nossas faculdades e aos progressos do espírito humano, tornando-se, afinal, estável e legítima graças ao estabelecimento da propriedade e das leis”, escreve.

A propriedade, segundo Rousseau, surgiu no momento em que os homens, nômades, passaram a se interessar por determinado pedaço de terra, ter algum desejo sobre ele e, por isso, demarcá-lo como seu. O passo seguinte foi o surgimento da lei, criada para resguardar a propriedade, uma vez que “o que certas pessoas possuem os outros não podem desejar”.

No texto, Rousseau diz que a vida em comunidade nasceu das demarcações de terra e observa que a vida em grupos fez aparecer a vaidade e o desprezo: “Aquele que cantava ou dançava melhor, o mais belo, o mais forte, o mais astuto ou o mais eloquente passou a ser o mais considerado (…). Dessas primeiras preferências nasceram, de um lado, a vaidade e o desprezo, e de outro, a vergonha e a inveja.”

Rousseau pregava o amor à natureza e a paixão pela liberdade. Entendia que, desse modo, todo indivíduo seria capaz de lutar contra o poder e defender os animais, as florestas e a vida.

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Jeferson Bertolini é repórter e doutorando em Ciências Humanas