Termos de uso são chatíssimos, mas por algum motivo estranho eu gosto deles. É preciso reconhecer que as empresas têm feito um esforço em aumentar as letras pequenas e tornar as regras mais claras para os usuários, mas sejamos francos, quase ninguém os lê. E, mesmo se você souber eles de cor, pode ser surpreendido por coisas que estão nas entrelinhas – e que podem acontecer sem estarem exatamente descritas.
Você sabe que o Facebook sabe onde estudamos na infância, onde conhecemos nossos namorados, que filmes gostamos de ver e as coisas que costumamos comprar. Mas você já se deu conta que a rede social pode saber os posts que nós apagamos antes de postar e as ligações que fazemos do nosso celular? Pois é.
No último ano, várias notícias colocaram em xeque as políticas de privacidade do Facebook. A rede social nega a maior parte das acusações – mas revisar a sua privacidade nunca é demais. Afinal, nós nem sempre sabemos que tipo de informações entregamos. E nem para que elas serão utilizadas.
>> O Facebook sabe quando você se autocensurou
Quantas vezes você escreveu algo no Facebook, mas desistiu de apertar o botão “publicar” na última hora? O Facebook quer saber. Para isso, um estudofeito por um doutorando e engenheiro do Facebook coletou informações não-publicadas de cinco milhões de usuários da rede social. Ele analisou todo tipo de interação abortada: comentários, posts em timelines alheias e atualizações de status não feitas. Segundo a Slate, não está claro como (e se) essa coleta de dados está descrita na política de privacidade da rede social.
Os termos de uso dizem que a empresa coleta informações não apenas quando você posta, mas também quando você visualiza ou interage. Mas não há menção sobre coleta quando você opta por não compartilhar. “Escrever e apagar um texto pode ser considerado um tipo de interação, mas eu suspeito que poucos de nós espera que esses dados serão salvos”, diz a reportagem, que afirma ainda ter tido a confirmação que o Facebook considera a autocensura um tipo de interação coberta pela política de privacidade.
Os autores do estudo em questão afirmam que não analisam o conteúdo do texto apagado, mas só ‘se’ a pessoa se autocensurou. O Facebook também afirma não coletar o conteúdo dos posts autocensurados. Mas, diz a reportagem, isso é tecnicamente possível e os próprios autores manifestaram esse interesse: “Nós chegamos a um melhor entendimento sobre como e onde a autocensura se manifesta em mídias sociais. Agora, nós precisaremos entender melhor o que e por que”, diz o resumo do estudo. O Facebook nega: “Privacidade e transparência são muito importantes para o Facebook e deixamos claro em nossa ‘Política de Uso de Dados’ quais informações temos acesso e como as utilizamos. O Facebook não coleta informações sobre o conteúdo que foi escrito e depois apagado antes de ser publicado.”
>> O Facebook sabe detalhes da sua vida através da sua navegação em outros sites
Para exibir publicidade segmentada – ou seja, mostrar exatamente o anúncio que vai te despertar uma vontade incontrolável de clicar –, o Facebook quer saber quem você é. Talvez não o seu nome, mas a sua idade, onde você mora, o que você gosta de fazer, se você tem filhos. Para traçar esse perfil, ferramentas de monitoramento rastreiam a navegação dos usuários – a partir daí, é possível traçar um perfil bastante fiel do consumidor. Você, até então, não tem nome – é só um número. Mas está devidamente rastreado. No fime Terms and Conditions May Apply, várias histórias ilustram como os usuários são monitorados. Há um caso, por exemplo, de um pai que só descobriu que a filha estava grávida porque ele recebeu em casa um cupom de desconto de uma loja para bebês – a loja identificou a potencial consumidora pela web e já começou a investir em marketing, antes mesmo que ela tivesse tempo de dar a notícia para a família.
>> O Facebook sabe detalhes sobre a sua lista de contatos, ligações e SMS no celular
Se você já parou para ler os termos de uso do aplicativo do Facebook para Android, verá que ele pode acessar contas (encontrar, modificar, adicionar e remover contas e senhas), sua localização, ler suas mensagens, baixar arquivos, repassar suas informações pessoais a terceiros, acessar e modificar seu calendário, ler e modificar seus contatos e ler seu histórico de navegações. O Facebook até explica e dá exemplos do uso dessas informações, mas não diz explicitamente para que cada uma delas é usada. Será que elas só são usadas para os fins declarados ou esses fins são só exemplos?
>> O Facebook pode saber o que você fala em chats privados – e usar essas informações?
Embora a rede social negue, há vários relatos de usuários passaram a ver anúncios relacionados a assuntos tratados apenas em mensagens privadas. A rede social inclusive enfrenta um processo nos EUApor interceptar conversar particulares com fins comerciais – mas afirma que a acusação não tem fundamento.
Enquanto a privacidade não é regulamentada, o que os usuários podem fazer é ter consciência sobre as informações que fornecem e saber que podem estar sendo monitorados muitas vezes sem saber. Um bom primeiro passo para ver o que está acontecendo é dar uma boa lida nas políticas de privacidade– e, quem sabe, pensar duas vezes antes de digitar algo por lá (mesmo se não for apertar o botão para postar).
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Tatiana de Mello Dias é editora de blogs do Brasil Post