Nos dias 17 e 18 de novembro, quase uma centena de presidentes de Tribunais de Justiça de todos os tipos e de todos os cantos do Brasil estiveram reunidos em Porto Alegre para o 5º Encontro Nacional do Judiciário. Fora breves notas, quase irrelevantes, nos jornais da capital gaúcha, a imprensa ignorou por completo o evento. Nos grandes portais de notícia do centro do país (UOL, Terra, Folha, Estadão, entre outros), o encontro simplesmente não aconteceu.
Qual a explicação? A princípio, uma reunião tão ampla de magistrados, que também são os grandes gestores do Poder Judiciário do país, deveria chamar a atenção da sociedade. Posso pensar em alguns temas sobre os quais a imprensa poderia questionar os desembargadores, ministros e seus bem informados assessores: a crescente influência do Judiciário em questões do cotidiano dos brasileiros, como a pesquisa das células-tronco e as uniões homoafetivas; os recentes “diagnósticos” do Judiciário que, embora divulgados por instituições tão diferentes quanto o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), batem nas mesmas teclas de morosidade e alto custo operacional; as declarações da corregedora do CNJ, Eliana Calmon, lançando uma nuvem de suspeita sobre os magistrados; o projeto aumento de salários de servidores e magistrados e a forma pela qual o governo federal vem conduzindo as negociações no Congresso Nacional.
Pouca repercussão dos juízes
Há quase uma década, as expressões “judicialização da política” e “ativismo judicial” entraram na pauta das grandes redações. O movimento empreendido pelo Judiciário em áreas antes privativas dos poderes Legislativo e Executivo tem criado desconforto na classe política. As decisões ligadas ao processo eleitoral, cujo caminho inevitável passa pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e pelo Supremo Tribunal Federal (STF), são as que mais suscitaram críticas. Os exemplos são variados, mas com destaque para a verticalização das coligações, a definição do número de vereadores e o projeto da Ficha Limpa. A imprensa acompanhou o processo de longe e de forma torta, amplificando as posições dos dirigentes partidários e se mostrando incapaz de vasculhar os bastidores dos tribunais. Devido à enorme repercussão destas discussões na vida dos brasileiros, como explicar o desinteresse por se escutar magistrados como Cezar Peluzo, presidente do STF, ou Ari Pargendler, presidente do STJ? Pois ambos estiveram no centro da maioria dos debates mais relevantes ocorridos no âmbito do Judiciário. Ambos, também, estiveram em Porto Alegre, junto com assessores de alto nível. Mas nada falaram fora do tradicional discurso protocolar porque nada fora deste discurso lhes foi perguntado.
Imagino, com preocupação, que o deslocamento do eixo decisório de questões eminentemente políticas possa estar pendendo para o Judiciário, pois este é o Poder menos observado, o que menos precisa se justificar perante a sociedade. Ninguém cobra um ministro do STF da mesma forma que cobra um senador ou um deputado federal, por mais poderosos que os parlamentares possam ser. Protegidos pelo anonimato a que a mídia os relega, os juízes se sentem mais livres para tomar decisões que, a princípio, caberiam a outras esferas. Não estão de todo errados, já que alguém tem que decidir sobre certos assuntos – no vácuo deixado pelo Legislativo e Executivo, cabe à sociedade contar com outro Poder para fazer avançar questões decisivas para o seu dia-a-dia. Porém, a ser verdade que a ascendência dos togados sobre temas mais próprios à política se deve à pouca repercussão de seus atores junto à sociedade, temos mais um interessante problema a ser debitado na vasta conta da “juventude” de nossa democracia.
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[Rodrigo de Aguiar Gomes é servidor público federal, Porto Alegre, RS]