Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Crise das charges se
torna questão diplomática

Leia abaixo os textos desta quinta-feira selecionados para a seção Entre Aspas.


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Folha de S. Paulo


Quinta-feira, 9 de fevereiro de 2006


CRISE DAS CHARGES
Folha de S. Paulo


Rice acusa Síria e Irã de incitarem protestos


‘A secretária de Estado americana, Condoleezza Rice, acusou os governos da Síria e do Irã de incitarem as violentas manifestações contra a publicação de charges do profeta Muhammad por jornais europeus que tomaram o mundo islâmico nas últimas duas semanas. Ontem, mais quatro afegãos foram mortos nos protestos, elevando para 11 o total de mortos no país nesta semana.


‘Não tenho dúvida de que o Irã e a Síria tenham saído da linha ao inflamarem as suscetibilidades [da população] e usá-las para seus propósitos’, disse Rice durante uma entrevista coletiva em conjunto com a chanceler israelense, Tzipi Livini, sem dar detalhes das acusações. ‘O mundo deve chamar sua atenção a esse respeito.’


Os EUA freqüentemente acusam o Irã e a Síria de protegerem e financiarem grupos terroristas.


Mais cedo, o presidente dos EUA, George W. Bush, adotara um tom mais baixo ao exortar governantes a agirem para estancar a violência. ‘Peço aos governos do mundo todo que contenham a violência, sejam respeitosos e protejam as propriedades e a vida dos diplomatas inocentes que servem no exterior’, declarou Bush.


Além do Afeganistão, as manifestações deixaram dois mortos na Somália e no Líbano. Representações diplomáticas da Dinamarca (onde as charges foram originalmente publicadas), da Noruega (que reproduziu os desenhos), da Áustria (que ocupa a Presidência temporária da União Européia) e da UE foram alvo de ataque na faixa de Gaza, na Indonésia, no Irã, no Líbano e na Síria -nos dois últimos, os edifícios que sediam a embaixada dinamarquesa chegaram a ser queimados.


‘Rejeitamos a violência como forma de expressar descontentamento com o que pode ser publicado por uma imprensa livre’, disse Bush. Mas ele fez uma ressalva crítica: ‘Com a liberdade vem a responsabilidade de ter consideração pelos demais’.


Há poucos dias, antes de os protestos ganharem cores mais violentas, a Casa Branca havia manifestado empatia com os muçulmanos ofendidos e criticado a publicação, no que foi amplamente interpretado como uma manobra de relações públicas em direção aos países islâmicos.


As novas declarações de Bush foram dadas depois que ele recebeu o rei Abdullah, da Jordânia, que também se manifestou. ‘Com todo o respeito à liberdade de imprensa, é óbvio que qualquer coisa que avilte o profeta Muhammad -que a paz esteja sobre ele- ou ataque a sensibilidade islâmica, acho eu, precisa ser condenada’, afirmou o rei, pontificando que aqueles que quiserem protestar ‘devem fazê-lo de maneira criteriosa e articulada e manifestarem seus pontos-de-vista de forma pacífica’. ‘Destruição e violência, especialmente quando culminam na morte de gente inocente, são inaceitáveis’, disse Abdullah. ‘O islã, como o cristianismo e o judaísmo, é uma religião de paz, tolerância e moderação.’


Bola de neve


A contenda começou com a publicação pelo jornal dinamarquês ‘Jyllands-Posten’, em setembro, de 12 charges que retratam o profeta Muhammad. A representação do rosto do profeta, por si só, é proibida pelo islamismo. Além disso, algumas das charges ligavam a imagem de Muhammad ao terrorismo, como uma que o mostrava usando um turbante em forma de bomba.


Num primeiro momento, os protestos se restringiram a líderes islâmicos locais. Mas as charges começaram a ser republicadas, e a discussão expandiu-se pelos países islâmicos, gerando uma contra-reação de órgãos de imprensa, sobretudo europeus, que passaram a reproduzi-las em nome da liberdade de expressão.


O ‘Jyllands-Posten’ já se desculpou publicamente, mas os manifestantes islâmicos pedem a retratação do governo dinamarquês. Este, por sua vez, afirma não poder se desculpar por algo publicado por um jornal sob os auspícios da liberdade de imprensa.


Os protestos têm seguido então como bola de neve. Ontem, no Afeganistão, cerca de 600 manifestantes voltaram a tentar invadir uma base americana em Qalat.


A multidão arremessou pedras e incendiou um carro de polícia. Os guardas reagiram a tiros, quatro pessoas foram mortas e 20 foram feridas, e membros do Taleban suspeitos de incitar a violência foram presos. Também houve uma tentativa menor de ataque à Embaixada da Dinamarca em Cabul. O Conselho dos Ulemás pediu o fim das manifestações.


No Paquistão, um protesto na cidade de Miranshah reuniu 3.000 pessoas aos gritos de ‘morte à Dinamarca’. No Irã, manifestantes atacaram a pedradas a Embaixada do Reino Unido em Teerã e voltaram a protestar diante da representação dinamarquesa.’


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Jornal satírico francês publica série de charges


‘O semanário satírico francês ‘Charlie Hebdo’ reproduziu ontem as 12 charges sobre o profeta Muhammad, originariamente publicadas pelo jornal dinamarquês ‘Jyllands-Posten’.


O presidente Jacques Chirac criticou a publicação, classificando-a de ‘provocação que pode perigosamente exacerbar as paixões’. Disse que ‘se deve evitar tudo que tende a machucar as convicções do próximo, sobretudo em questões religiosas’.


Afirmou ainda que ‘a liberdade de expressão deve ser exercida com responsabilidade’.


A França é o país europeu com a maior proporção de muçulmanos, imigrantes ou descendentes de origem norte-africana.


Entidades que representam a comunidade islâmica no país tentaram por vias judiciais impedir a publicação das charges. Mas a Justiça deliberou na terça-feira que a aceitação de uma censura feriria a liberdade de expressão e a Lei de Imprensa, de 1881.


O ‘Charlie Hebdo’ tem uma tiragem de 140 mil exemplares, diz a agência Reuters. Mesmo aumentando-a ontem para 400 mil, sua edição se esgotou em poucas horas nas bancas francesas.


É um recorde que o ‘Charlie Hebdo’ não alcançou nem com os atentados do 11 de Setembro, nem na morte do presidente François Mitterrand, assuntos que abordou com irreverência.


‘O exercício da liberdade de imprensa não pode ser considerado como uma provocação’, disse ontem Philippe Val, diretor do semanário. ‘Não se pode renunciar a esse direito só porque alguns são incapazes de suportá-lo.’


O jornal tem uma antiga tradição de humor engajado, com posições anarquistas ou de extrema esquerda. É o sucessor do ‘Hara-Kiri Hebdo’, fechado em 1970 pelo Ministério do Interior em razão de uma manchete considerada ofensiva ao presidente Charles de Gaulle, que acabara de morrer.


Além das 12 charges dinamarquesas, o semanário também produziu outras que criticam o cristianismo e o judaísmo. Em uma das caricaturas inéditas, o profeta Muhammad diz que ‘é difícil ser amado por idiotas’.


A polícia francesa montou um dispositivo de emergência para dar proteção aos redatores do semanário. Sua sede foi cercada por um cordão de isolamento, para impedir que muçulmanos radicais pratiquem algum atentado ou promovam manifestações e atos de violência.


As charges de Muhammad haviam sido reproduzidas na França pelo jornal ‘France Soir’. Isso custou o emprego ao então diretor de redação, Jacques Lefranc.’


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Dinamarqueses renegam charges sobre Holocausto


‘O editor-chefe do jornal dinamarquês ‘Jyllands-Posten’, que originalmente publicou as charges sobre Muhammad, negou que possa veicular charges sobre o Holocausto encomendadas por um jornal iraniano. O editor de cultura chegou a dizer ontem que iria analisá-las, porém voltou atrás. Ainda ontem, o editor de domingo do diário reconheceu ter recusado charges com Jesus Cristo anos atrás -segundo ele, eram de má qualidade.


Taleban oferece ouro por morte de chargistas


Um comandante do Taleban, grupo que organiza a insurgência afegã, ofereceu ouro pela morte de autores de charges de Muhammad, segundo a agência de notícias Afghan Islamic Press, sediada no Paquistão. O mulá Dadullah teria oferecido cem quilos de ouro a quem matar um dos chargistas ou cinco quilos do metal a quem matar um soldado dinamarquês, norueguês ou alemão -seus países, participantes da Otan, têm tropas no Afeganistão.’


Leila Suwwan


Cautelosos, EUA evitam reproduzir desenhos


‘A controvérsia das charges dinamarquesas tem sido objeto de cautela midiática e pragmatismo político nos EUA. Em meio a uma empreitada para melhorar sua imagem e revalidar as bandeiras de ‘liberdade’ e ‘democracia’ de sua política para o Oriente Médio, o governo americano buscou insular-se da onda de indignação religiosa e reagiu quando farejou o oportunismo político inimigo.


Ontem George W. Bush condenou a violência, mas com muitas ponderações sobre tolerância e liberdade de imprensa responsável. Coube à secretária de Estado, Condoleezza Rice, apontar o dedo diretamente para a Síria e o Irã, o primeiro por supostamente incitar o ataque à Embaixada da Dinamarca no Líbano e o segundo por reagir a pressões internacionais sobre seu programa nuclear.


‘Na Europa, o humanismo secular é ‘deus’, e as reações violentas têm sido usadas para justificar a ofensa inicial de que muçulmanos são violentos. O governo americano foi inteligente por não alimentar isso. A Al Qaeda agradeceria’, disse Chris Seiple, presidente do centro de estudos Institute for Global Engagement.


Nos últimos meses, os EUA têm feito esforço para reverter o antiamericanismo no Oriente Médio. Isso se alinha à posição da Chancelaria de dar apoio a Copenhague, condenar a violência e expressar desgosto com as charges e respeito à liberdade de expressão.


‘A questão por trás disso é que aqui há suscetibilidade quanto à profanação de coisas sagradas de qualquer religião. E o governo começa a entender que religião e Estado estão separados, mas a religião hoje tem lugar na Realpolitik global’, completou Seiple.


Ao contrário da imprensa européia, os jornais e televisões americanos evitaram mostrar as charges do profeta Muhammad. Com exceção do ‘Philadelphia Inquirer’ e de um noticiário de televisão, todos consideraram a reprodução das imagens prescindível.


Para Jane Arraf, do Council on Foreign Relations e ex-correspondente da CNN em Bagdá, não se trata de haver maior sensibilidade ou tolerância religiosa nos EUA.


‘A maioria das pessoas nem sequer entendeu qual o motivo da ofensa. Mas aqui houve maior sofisticação editorial para ver que a simples reprodução seria um convite irresponsável para mais ofensas e violência’, disse.


O islã proíbe imagens do profeta Muhammad para evitar a idolatria. Além da representação gráfica, as charges européias causaram ofensa por associar religião a terrorismo, com uma imagem do profeta com um turbante-bomba.’


Olivier Truc


Extrema direita dinamarquesa cultiva uma xenofobia deliberada


‘DO ‘LE MONDE’, EM COPENHAGUE – Os idiomas são semelhantes, as histórias e culturas se misturam e estão, as três, impregnadas dos valores social-democratas e do Estado de Bem-Estar Social. Porém a Suécia, a Noruega e a Dinamarca vivem situações bem diferentes acerca da extrema direita.


Na Dinamarca, nada mudou desde a chegada ao poder do governo de liberais e conservadores, em 2001, ou desde os anos 90, quando os social-democratas ainda governavam. Foi naquela época que o Partido do Povo Dinamarquês, agremiação de extrema direita comandada por Pia Kjaersgaard, decidiu impor sua agenda à política nacional.


‘O Partido do Povo Dinamarquês não aceita que a Dinamarca se transforme em uma sociedade multiétnica’, afirma o partido em seu programa.


O caso das charges publicadas pelo jornal ‘Jyllands Posten’, a principal publicação da direita e a maior circulação entre os jornais dinamarqueses, precisa ser considerado em seu contexto.


‘Não é por acaso que esse problema estourou exatamente na Dinamarca. Nenhum outro país da União Européia é tão xenófobo e tão avesso ao islamismo’, afirma Bashy Quraishy, dinamarquês de origem paquistanesa que dirige a entidade Enar (Rede Européia de Combate ao Racismo).


Em 2000, um alemão e um britânico residentes na Dinamarca classificaram, em artigo para um jornal, o debate dinamarquês sobre a imigração de ‘sumário, desrespeitoso e insolente’.


Pia Kjaersgaard conseguiu banalizar opiniões xenófobas, como sua recente declaração segundo a qual os muçulmanos são como um ‘tumor canceroso’. A partir de 2001, seu partido, com 13% nas eleições legislativas de 2005, vem oferecendo apoio indispensável no Parlamento ao governo dos liberais e conservadores.


Seu sucesso pode ser explicado pelo papel desempenhado por alguns jornais, entre os quais o ‘Jyllands Posten’, na banalização dos clichês negativos sobre os muçulmanos, como afirma o Centro Dinamarquês de Defesa dos Direitos Humanos em relatório sobre o ano de 2005.


‘A história do drama das semanas recentes é a de um triunfo na política interna que se tornou catástrofe de política externa. É esse o cerne do problema’, diz Toeger Seidenfaden, diretor da revista ‘Politiken’, de centro-esquerda.


Em dezembro último, o escritor norueguês Dag Kullerud já apontava que o tom do debate se havia tornado bem mais agressivo na Dinamarca do que nos demais países escandinavos.


A Noruega tem um partido populista de direita cujo peso no Parlamento é ainda maior que o do dinamarquês, com 22,1% dos votos nas legislativas de setembro. No entanto a influência do Partido do Progresso não vem deixando marcas permanentes.


Na Suécia, a situação tem feições diferentes. ‘Hoje em dia, o papel de defesa de uma linha nacionalista expressa na forma de proteção ao Estado de Bem-Estar Social cabe ao partido de esquerda, aos ex-comunistas’, diz o cientista político sueco Stig-Börn Ljunggren. Tradução de Paulo Migliacci’


Olivier Roy


Charges expõem geopolítica da indignação


‘ESPECIAL PARA O ‘LE MONDE’ – O conflito sobre as charges dinamarquesas é freqüentemente apresentado como expressão de um choque de civilizações que se daria entre o Ocidente liberal e um islã que recusa a liberdade de expressão. É preciso muita ignorância e ainda mais hipocrisia para defender essa tese.


A liberdade de expressão já é limitada em todos os países ocidentais -pela lei e por um certo consenso social. O anti-semitismo é reprimido legalmente. As ofensas a outras comunidades, também. Em 2005, a Igreja Católica francesa conseguiu a proibição de publicidade que substituía os apóstolos por mulheres pouco vestidas na cena da Santa Ceia.


Trata-se exatamente daquilo que as associações muçulmanas estão pedindo hoje. Que jornais, na época, publicaram o comercial incriminado em nome da defesa da liberdade de expressão?


Existe um limiar de tolerância muito variável na opinião pública. Nenhum grande jornal publicaria caricaturas zombando de cegos, anões, homossexuais ou ciganos, mais por temor ao mau gosto do que por medo de represálias judiciais. Mas o mau gosto é aceito no caso do islã, pois a opinião pública é mais permeável à islamofobia. O que choca o muçulmano médio não é a representação do profeta, mas a existência de dois pesos e duas medidas.


Os protestos de muçulmanos na Europa, exceto alguns agitados ‘profissionais’, são, de fato, mais moderados e também constituem manifestações da liberdade de expressão. De modo mais geral, porém, eles também fazem parte daquele que, sem dúvida, é o grande debate hoje mantido no Ocidente: em que medida a lei deve defender um espaço do sagrado, quer se trate de blasfêmia, do negacionismo, da memória ou do respeito pelos outro?


O que remete a uma discussão mais geral: o que se enquadra na liberdade do homem, de um lado, e na ordem natural ou divina, do outro? Não surpreende que os religiosos conservadores -cristãos, judeus ou muçulmanos- coincidam cada vez mais ao tentar impor limites à liberdade em questões como aborto, casamento homossexual, bioética ou blasfêmia. Não surpreende que a conferência episcopal, o grão rabinato ou o consistório protestante tenham declarado compreender a indignação dos muçulmanos. Esse debate sobre valores não opõe o Ocidente ao islã -ele se dá no interior do próprio Ocidente.


De onde, então, vem a violência no caso das charges? Com relação a isso, é preciso não tapar o sol com a peneira. O mapa dos tumultos mostra que os países afetados pela violência são aqueles em que o regime e certas forças políticas têm contas a acertar com os europeus. A violência foi instrumentalizada por Estados e movimentos políticos que rejeitam a presença da Europa em algumas crises no Oriente Médio.


Promovemos um ativismo diplomático crescente, mas que não é sujeito a debate público. O fato de o regime sírio apresentar-se como defensor do islã seria risível se suas conseqüências não tivessem sido trágicas. Um regime que exterminou dezenas de milhares de membros da Irmandade Muçulmana estaria à frente da defesa do profeta? Aqui, trata-se de uma manobra puramente política para retomar o controle do Líbano, aliando-se a todos aqueles que se sentem ameaçados ou ignorados pela política européia.


No momento da intervenção americana no Iraque, era de bom tom opor à coalizão anglo-saxã uma ‘velha Europa’ continental que era hostil à intervenção americana, tendia a ser pró-palestinos e insistia na soberania dos Estados -às vezes, em detrimento da democratização. Desse modo, foi atribuída à França uma tradição gaullista de independência com relação aos Estados Unidos.


Em três anos, porém, a situação mudou muito. Os europeus se lançaram sozinhos num braço-de-ferro com o Irã em torno da questão nuclear e estão na primeira linha dos que denunciam Teerã ao Conselho de Segurança, enquanto os EUA se restringem a uma retórica prudente.


Devemos nos surpreender pelo fato de o Hizbollah e Teerã lançarem óleo sobre o fogo das charges? No Afeganistão, as forças da Otan -ou seja, tropas européias- estão substituindo os soldados americanos e estarão na linha de frente do combate aos integrantes do Taleban e da Al Qaeda. No Líbano, a França -logo, também a Europa- de repente assumiu uma posição muito dura com relação à presença síria, o que enfureceu Damasco.


E o regime sírio está se vingando, organizando, de maneira oculta, os ataques contra as embaixadas. Quem pode imaginar que uma manifestação espontânea e não controlada pudesse acontecer hoje em Damasco?


Mas é talvez nos territórios palestinos que a mudança é a mais gritante: após a vitória do Hamas, a Europa, de maneira conjunta e ordenada, impôs condições draconianas para continuar a enviar sua ajuda, enquanto muitos palestinos esperavam por uma neutralidade maior. Vêm daí as manifestações contra representações da União Européia em Gaza.


Longe de ser neutra ou ausente, a Europa, nos últimos três anos, vem adotando posição muito mais visível e intervencionista no Oriente Médio -ao mesmo tempo em que se aproxima dos EUA. Contrariamente ao que acontecia há três anos, Washington agora deseja uma presença européia maior, com a perspectiva de uma retirada progressiva do Iraque.


Essa exposição maior da Europa conduz a tensões com uma coalizão heteróclita de regimes e movimentos que, por sua vez, tomaram os muçulmanos europeus como reféns. Essa estratégia ofensiva era previsível desde os protestos de embaixadores árabes às autoridades dinamarquesas.


Os regimes árabes, na realidade, sempre se esforçaram para conservar os imigrantes na Europa como uma diáspora, mobilizáveis para as causas nacionais. Os países da África do Norte consideram os filhos de imigrantes nascidos na França como pessoas que automaticamente conservam a nacionalidade de seus pais.


Mas esse apadrinhamento pesado vem sendo cada vez mais mal aceito pela maioria dos muçulmanos da Europa. É interessante observar que as grandes organizações muçulmanas européias vêm, de fato, mantendo distância da polêmica em torno das charges . É nessa desconexão entre o islã da Europa e as crises do Oriente Médio que é preciso procurar a chave para a gestão das tensões inevitáveis e tratar os muçulmanos da Europa como cidadãos, como se faz com cristãos e judeus, mesmo que seja preciso lembrá-los, com freqüência, princípios da liberdade de expressão e da laicidade.


Mas é preciso também que a opinião pública européia tome consciência desse envolvimento bem maior da Europa nos assuntos do Grande Oriente Médio, dos palestinos ao Afeganistão, pois ele vai resultar em uma exposição maior, tanto das representações diplomáticas européias quanto das ONGs e dos cidadãos comuns da Europa. É preciso assumir suas conseqüências. Mais uma vez, o que falta à Europa é um espaço de verdadeiro debate público.


Olivier Roy é diretor de pesquisas do Centro Nacional de Pesquisa Científica (França) e publicou ‘La Laïcité face à l’islam’(a laicidade diante do islã). Tradução de Clara Allain’


TV DIGITAL
Luís Nassif


A guerra de argumentos na TV digital


‘Temas técnicos e complexos, quando discutidos por meio da mídia, abrem margem a vários tipos de sofisma: ou se levantam aspectos secundários do tema, como se fossem centrais, ou se fazem afirmações que se perdem no meio do alarido e não são conferidas.


A discussão sobre a transposição do rio São Francisco teve muito disso. Alegava-se que as críticas decorriam da falta de conhecimento técnico dos críticos. Mas a maioria dos trabalhos técnicos condena o projeto, pelos aspectos ambientais e socioeconômicos.


Algo semelhante vai ocorrer com essa discussão em torno da TV digital. De cada um dos lados haverá blefes, afirmações não comprovadas para tentar reduzir as vantagens relativas do outro padrão. A melhor maneira de esclarecer os pontos é colocar os donos dos padrões frente a frente.


Na coluna de hoje vamos colocar algumas afirmações dos representantes do padrão japonês para análise pelos representantes do padrão europeu:


1) Espectro


Japoneses: seu padrão (o ISDB-T) atende a todas as exigências brasileiras, usando apenas o espaço de 6 MHz no canal de transmissão permitido pelo governo brasileiro. Já os europeus precisariam de um canal extra para isso.


Europeus: dizem que os japoneses blefam. Sustentam que o seu sistema (o DVB) é flexível na hora de montar os aplicativos. No canal de 6 MHz seria possível alocar HDTV (alta definição), SDTV (a terceira melhor definição) e TV portátil. O padrão japonês tem um canal específico para móvel ou portátil. Segundo os europeus, seu sistema é diferente, pois o SDTV já é móvel. Exemplo: uma emissora poderia transmitir em HDTV, em MPEG4, ao mesmo tempo transmitir em SDTV, em MPEG2 (mais barato), além de transmitir mais de nove canais de outro conteúdo para celular. Tudo isso em 6 MHz.


2) Exportação


Japoneses: dizem que 90% dos componentes dos ‘set top boxes’ (conversor) são os mesmos nos três padrões. Portanto um aparelho produzido no Brasil com tecnologia japonesa poderia ser exportado para a Europa ou os EUA mudando apenas um chip, o que não modificaria substancialmente seu custo.


Europeus: cerca de 30% do custo de um ‘set top box’ se refere às questões tecnológicas -e não apenas 10%, como dizem os japoneses. E as soluções eletrônicas são integradas. Não é como um brinquedo de montar, em que as peças são mudadas da maneira que quiser. Se a afirmação do padrão japonês fosse realmente viável, dizem os europeus, eles mesmos já estariam exportando para o resto do mundo.


3) Incorporação de tecnologia


Japoneses: estão dispostos a abrir o padrão para que os brasileiros possam agregar tecnologia nacional. O padrão tem o suporte da Arib (Association of Radio, Industries and Business), que reúne 269 empresas japonesas para desenvolver as tecnologias aplicadas no padrão de TV digital.


Europeus: os europeus sustentam que o padrão japonês é o mais fechado. Todas as empresas do consórcio são japonesas, enquanto o consórcio DVB possui mais de 270 membros que incluem emissoras, indústrias, operadores de rede, desenvolvedores de softwares e órgãos de regulação, inclusive muitas empresas que operam no Brasil.


Mais pontos dessa discussão estão no seguinte endereço: www.projetobr.com.br’


Folha de S. Paulo


Teles fazem lobby por TV digital


‘As empresas de telefonia fixa apresentaram ontem ao governo suas reivindicações na questão da TV digital. O ministro Hélio Costa (Comunicações) afirmou que as empresas querem garantir o transporte dos novos produtos que surgirão com a tecnologia.


É o lobby pelo modelo econômico chamado ‘convergência de tecnologias’, no qual o telespectador passa a ser usuário e a TV, um terminal de acesso de dados.


A questão da definição do modelo econômico é a razão do confronto entre as companhias de telefonia e as redes de TV, que dizem não ter como competir com o poderio econômico das teles.


Na reunião, a Telemar se manifestou favorável ao padrão europeu, que foi desenvolvido e é direcionado para um modelo em que as telefônicas são dominantes. As demais se disseram indiferentes.


Ficou definido que as empresas farão relatórios com suas posições para serem entregues à ministra Dilma Rousseff (Casa Civil). Antes da reunião, pela manhã, Costa reafirmou que o padrão japonês é o único que atende os requisitos desejados pelo governo brasileiro.


‘É o único que faz toda a transmissão de tudo que nós queremos, que é alta definição, portabilidade, mobilidade e interatividade, em 6 MHz’, disse Costa. Ele afirmou que adotar um padrão fora dos 6 MHz praticamente inviabiliza a indústria.


‘Os nossos aparelhos de TV digital serão todos feitos no Brasil em 6 MHz. Se você for trabalhar com 8 MHz, como é o sistema europeu, é um pouquinho mais complicado. A diferença é muito grande’, disse o ministro.


Como a intenção do governo é testar o sistema em junho e lançá-lo em setembro, na parte técnica sobraria o padrão japonês.


Mas, segundo o ministro, o presidente Lula pode preferir esperar mais seis meses antes da definição ou, por questões econômicas, escolher outro padrão.


‘Quem decide sobre tudo isso é o presidente da República. Minha função é colocar os dados na mesa dele e ele decide.’


Costa disse que, além do relatório técnico do CPqD (Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações), Lula vai receber um relatório político e econômico dos ministérios envolvidos na questão.


A definição do modelo econômico que será adotado no Brasil com a tecnologia da TV digital deve acontecer somente no final deste mês ou no início de março, segundo Costa informou na terça-feira. A decisão será tomada pelo presidente Lula após retornar da viagem à África.’


TODA MÍDIA
Nelson de Sá


Das Arábias


‘Lula foi à Argélia, que ‘já é o maior parceiro comercial do Brasil no mundo árabe’, com um ‘objetivo comercial’. Era o que se ouvia no ‘JN’ e outros -e era o que importava, por lá.


No enunciado da BBC Brasil, que entrevistou o ministro Luiz Furlan, ‘Lula chega à Argélia e meta é dobrar as exportações’.


Também nas agências pelo globo, que voltam a cobrir Lula extensivamente, só negócios.


No enunciado da britânica Reuters, ‘Brasil disputa projeto de obras de US$ 60 bilhões na Argélia’. De novo, Furlan era entrevistado e dava detalhes.


No título da espanhola EFE, ‘Lula chega a Argel para visita de alto conteúdo econômico’.


Foram na mesma toada a americana AP, a France Presse, a cubana Prensa Latina -e até a Agência Bolivariana de Notícias.


Mas chegou o final da tarde e nada de negócios na cobertura eletrônica, dos blogs às rádios.


Na submanchete do Globo Online e outros sites, ‘Lula não bebe há 40 dias, diz Furlan’.


Na brincadeira do ministro, era referência ao regime que fez Lula perder 12 quilos, mas os textos remetiam a Larry Rohter -o correspondente do ‘New York Times’ e sua insinuação de alcoolismo do presidente.


Aliás, nada como um regime presidencial para estimular o telejornalismo brasileiro. Da escalada do ‘Jornal da Record’, anteontem:


– Médicos criticam a dieta que fez o presidente Lula emagrecer 12 quilos.


EUA, BRASIL E O ETANOL


Segundo a Agência de Notícias Brasil-Árabe, criada na cúpula entre países árabes e sul-americanos, ‘a Argélia é grande fornecedora de petróleo ao mercado brasileiro’ e foi para reduzir o déficit resultante que Lula viajou até lá.


Como se livrar dos altos custos do petróleo: dos EUA à Europa, é a pauta recorrente desde o pronunciamento sobre ‘o estado da união’, de George W. Bush. Segundo a agência Reuters, em despacho reproduzido no site do ‘NYT’, será o tema da reunião do G8, no fim de semana. O objetivo expresso é criar mecanismos para estimular o investimento em alternativas de energia, como o etanol.


Nos EUA, continua a pressão para abrir o mercado ao etanol brasileiro. A questão estava anteontem no ‘Wall Street Journal’, na reportagem ‘Como o Brasil venceu o vício de petróleo’. De um especialista, de Washington:


– Não faz sentido taxar etanol de países amigos como Brasil quando não taxamos o petróleo da Arábia Saudita.


E estava lá a questão no ‘New York Times’ de ontem, na coluna do célebre Thomas L. Friedman, em meio a mais um duro ataque ao vice-presidente Dick Cheney:


– Por que esta administração permite a taxa de US$ 0,54 por galão sobre etanol importado? Sim, nós taxamos o etanol que é importado do Brasil, mas não o petróleo importado da Arábia Saudita, da Venezuela e da Rússia.


Para Friedman, a política de energia do país, hoje, não passa de ‘plano Marshall para terroristas e ditadores’.


Em tom diverso, falando da resistência dos produtores americanos, ‘Washington Times’ e ‘Financial Times’ também abordaram a perspectiva de importar do Brasil.


Mas nos EUA, antes de mais nada, falta infra-estrutura. Segundo reportagem no ‘Miami Herald’, a distribuição é o que mais ameaça a vontade de Bush de diminuir o ‘vício por petróleo’. Não se encontra etanol nos postos.


Ato contínuo, no meio do dia a agência AP distribuiu despacho noticiando que Ford e General Motors têm planos para a expansão dos postos de venda de etanol.


Em meio a tanta conclamação pela retirada da taxação do etanol, à noite apareceu a notícia, nos sites noticiosos do Brasil, de que os EUA sobretaxaram o suco de laranja.


PAZ


Contra o ‘JN’, o ‘Jornal da Record’ apela aos amadores, como nestas ‘imagens gravadas por militares’, com tiros e gritos; na manchete, elas ‘mostram que a missão de paz no Haiti é uma guerra’’


ELITE BRASILEIRA
Walter Salles


Os Idiotas


‘Praia de Lopes Mendes, Ilha Grande, domingo de manhã. Como é uma área de proteção ambiental, não há carros. Chega-se até ali caminhando por uma longa e bem-preservada trilha através da mata atlântica ou pelo mar, de barco.


Por causa das férias escolares, há muitas crianças na areia. De repente, o cenário se transforma numa cena de ‘Apocalypse Now’, de Francis Ford Coppola. Um helicóptero dá um rasante na praia. Depois chega outro, e logo mais um terceiro. Ferindo a lei, pousam ao lado da areia, perto de uma pequena igreja construída pelos pescadores da região -uma das únicas edificações da praia.


Os passageiros saltam. Você já os viu naquelas revistas que glorificam ‘celebridades’. Caminham pela praia, dão um rápido mergulho, mas não ficam. Logo partem para atazanar uma outra freguesia, não sem antes darem novos rasantes na praia. O negócio não é desaparecer na geografia de um lugar. O negócio é ser visto.


Não interessam as tradições do local. Interessa, ao contrário, trazer consigo o mundo em que essas pessoas vivem. É um pouco como George Bush, da primeira vez que foi a Roma, já na Presidência do país mais poderoso do mundo. Levou toda sua comitiva para comer no McDonald’s. Em Roma, como os americanos.


Ir à praia de helicóptero, no Brasil de hoje, não é uma exclusividade do litoral fluminense. Em Trancoso, na Bahia, um helicóptero pousou na semana retrasada em plena praia do Espelho, lançando areia sobre os banhistas que lá estavam. Saudável reação: foi apedrejado. Até na distante Barra Grande, península de Maraú, Bahia, helicópteros também começaram a pousar em área pública -as praias- pela primeira vez.


Num país em que o próprio presidente fala de leis que ‘pegam ou não pegam’, pousar de helicóptero em locais proibidos pela lei pegou. Não é à toa, aliás, que helicópteros são expostos na Daslu, ao lado de calcinhas subfaturadas. Estão na moda.


Há algo de sintomático nisso. Em primeiro lugar, a já cansativa confusão entre o público e o privado, que, no Brasil, a cada ano se acentua. Hoje, o que é privado é defendido a unhas e dentes, atrás de vidros blindados, em ruas com cancelas e seguranças. O que é público é constantemente conspurcado. Não importa se uma praia é área de proteção ambiental. Pousa-se ali porque se quer e (não) se pode.


Sintomática, também, é a ausência de fiscalização por parte das autoridades competentes. Retrato de um país em que alguém vai preso por roubar um alicate em um supermercado, mas um ex-governador de São Paulo com centenas de milhões de dólares em contas-fantasmas no exterior está solto, comendo pastel em Campos do Jordão.


Houve um tempo em que se falava do Brasil como a Belíndia. De um lado, a Bélgica; do outro, a Índia. A Índia continua aí, a cada esquina. Ou, talvez, não mais, já que aquele país tem crescido a taxas duas vezes maiores do que as nossas. Investe pesadamente em educação, o que não fazemos. Por outro lado, também não faz mais sentido falar de Bélgica, cuja elite é certamente mais responsável do que a nossa. Na falta da Belíndia, talvez seja o caso de se falar hoje de Bahriti. De um lado, o Bahrein -com toda a sua exibição de riqueza. Do outro, o Haiti. Convenientemente, as nossas forças armadas já estão por lá.


Um economista do MIT, Lester Thurow, sustenta a tese de que ‘o que falta na América Latina é elite. O que existe é oligarquia. As oligarquias desfrutam ou herdam o poder, mas não entendem as responsabilidades públicas inerentes a ele’. Ou seja: querem os privilégios, mas não os ônus. Querem a gravata da Gucci, mas não os impostos de importação, que se convertem em saúde, educação etc. Depois, reclamam da falta de segurança, da inoperância dos governos, apadrinham uma creche para apaziguar a consciência e, ato final, compram um helicóptero para sobrevoar os nossos Haitis.


São Paulo já é a segunda cidade com o maior número de helicópteros em operação no mundo, perdendo apenas para Tóquio, no Japão. Em parte, essa estatística se deve ao transito caótico das duas cidades, à extensão geográfica que ocupam, à falta de planejamento urbano. Presume-se, também, que muitos desses aparelhos sejam utilizados de forma correta -o que não elimina o problema criado pelos usuários que não agem dessa maneira.


Para finalizar: muitas vezes me perguntam por que o cinema brasileiro fala tão pouco de suas elites. A resposta é simples: porque não é fácil falar de classes dominantes tão caricatas. Pena que Buñuel não esteja mais entre nós. Nem Tomas Gutierrez Alea, cujo olhar cáustico também teria dado conta do recado. Sobra Lars von Trier, que fez um filme sobre um bando de pessoas que fazem de tudo para chamar a atenção. Chama-se ‘Os Idiotas’.


Walter Salles, 49, é cineasta, diretor, entre outros filmes, de ‘Central do Brasil’ e ‘Diários de Motocicleta’.’


TELEVISÃO / EUA
Andrew Ross Sorkin


Maior TV hispânica dos EUA estuda venda e atrai gigantes da mídia


‘DO ‘NEW YORK TIMES’ – A Univision Communications, companhia de mídia hispânica sediada nos Estados Unidos, está estudando um plano para vender seu controle acionário.


A direção da empresa se reuniu em Los Angeles e poderia anunciar seus planos ainda ontem. As ações da empresa subiram mais de 10% na Bolsa de Nova York.


Um leilão pela Univision, cujo valor de mercado é avaliado em cerca de US$ 10 bilhões, poderia gerar corrida entre os gigantes da mídia News Corp., Time Warner e CBS, na disputa por uma fatia do lucrativo e crescente mercado de língua espanhola. A gigante mexicana Televisa, que fornece programação à Univision, também pode se interessar.


A Univision contratou o banco de investimentos UBS para organizar o leilão, caso a venda seja aprovada.


Os atrativos de um grupo de mídia como esse são evidentes: o comprador ganharia acesso amplo e imediato ao mercado latino, que cresce rapidamente e representa poder aquisitivo da ordem de US$ 480 bilhões ao ano. A Univision controla a maior rede de TV hispânica dos EUA, além de rádios, gravadoras e serviços on-line. A segunda maior companhia de mídia hispânica dos EUA, a Telemundo, foi adquirida pela rede NBC, da General Electric, em 2001.


Mas a Univision é uma empresa muito maior que a Telemundo, com audiência cerca de quatro vezes superior.


Trata-se da quinta maior rede de televisão do país, atrás da Fox e à frente da rede Warner Brothers, e atinge 98% dos domicílios de fala hispânica nos EUA, por meio das 62 estações de televisão controladas pelo Univision Television Group.


Conhecida primordialmente por suas novelas, a rede também oferece programas noticiosos e esportes, com destaque para o futebol, e o programa que está em cartaz há mais tempo no horário nobre da televisão americana, o show de variedades ‘Sábado Gigante’.


Além da rede de televisão Univision, sua principal subsidiária, a empresa também controla a rede TeleFutura e o canal de cabo Galavision. Desde que adquiriu a Hispanic Broadcasting por US$ 3,3 bilhões em 2002, o grupo se tornou a maior rede de rádio hispânica dos EUA.


A Univision é comandada por A. Jerrold Perenchio, 75, que começou a carreira como agente em Hollywood e se tornou um nome de peso na revenda de reprises de séries televisivas. Ele descobriu o potencial dos programas de televisão em espanhol e, em 1992, comandou um grupo que incluía Emilio Azcarraga, criador do Grupo Televisa, na aquisição da Univision e de 13 estações de TV hispânicas controladas pelo grupo Hallmark, por US$ 500 milhões.


Perenchio, que não fala espanhol, também contribuiu pesadamente para as campanhas do presidente George W. Bush e do Partido Republicano. Ele controla cerca de 11% da Univision, enquanto o Grupo Televisa detém 10% das ações da companhia.’


JK NA GLOBO
Daniel Castro


Globo manda envelhecer atores de ‘JK’


‘Depois do festival de críticas à caracterização de personagens de ‘JK’, a Globo decidiu investir em maquiagem e vai acelerar o ‘envelhecimento’ dos atores Deborah Evelyn (Salomé), 39 anos, Caco Ciocler (Leonardo Faria), 34, e Dan Stulbach (Zinque), 36.


A passagem da segunda para a terceira fase da minissérie, há duas semanas, foi confusa. Num único capítulo, personagens como Sarah Kubitschek envelheceram demais: a atriz Débora Falabella, 26, deu lugar a Marília Pêra, 63. Já Salomé, que no ar atualmente tem por volta de 40 anos, está com a mesma aparência de quando tinha 18. O mesmo problema ocorre com Leonardo.


Os autores de ‘JK’, Maria Adelaide Amaral e Alcides Nogueira, explicam que criaram um ‘código teledramatúrgico’ para driblar a falta de elenco: personagens reais tiveram seus intérpretes substituídos; os fictícios, não _continuam os mesmos atores de quando eram adolescentes.


Mas a maquiagem falhou, gerando críticas até dos autores. A minissérie agora passará a ter uma caracterização mais rigorosa. Numa próxima passagem de tempo, Salomé ganhará mechas de cabelos brancos e Leonardo, bigode e cabelos grisalhos. Mas o enrugamento da pela dos atores ainda será suave. O maior desafio será com Zinque: ele é contemporâneo de Juscelino Kubtschek, e Dan Stulbach terá que ficar ‘compatível’ com José Wilker, 60.


OUTRO CANAL


Troco 1 A Globo sentiu o golpe do furo dado pelo ‘Domingo Espetacular’, que flagrou Suzane Richthofen (acusada de matar os pais) numa praia de São Paulo, reportagem que levou a Record a ficar dois minutos na frente do ‘Fantástico’ no último domingo.


Troco 2 A chefia do ‘Fantástico’ convocou uma reunião extraordinária da equipe na segunda-feira (dia de folga da maioria da produção do programa). Pediu uma reação urgentemente.


Cotovelo Jornalistas da Record não escondem insatisfação com a Polícia Civil de São Paulo. Avaliam que a instituição tem privilegiado a Globo (como no desfecho de um seqüestro, no ‘JN’ de sábado).


Desemprego 1 O canal pago People+Arts exibia anteontem o último episódio da terceira temporada da versão americana de ‘O Aprendiz’ (com Donald Trump), veiculado nos EUA em maio de 2005. Eis que no final, justamente quando seria revelada a vencedora (Kendra), o ‘reality show’ simplesmente saiu do ar.


Desemprego 2 O People+Arts só informa que houve uma falha técnica e que reprisará o episódio domingo.


Músculos Para dar média de 52 pontos anteontem, a novela ‘Belíssima’ mostrou elasticidade no Ibope: entrou no ar com 39 pontos e saiu com 58.’


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O Globo


Quinta-feira, 9 de fevereiro de 2006


CRISE DAS CHARGES
O Globo


EUA: Síria e Irã incitam radicais


‘Pela primeira vez desde o início da crise provocada pela reação de muçulmanos à publicação de charges com o profeta Maomé, o governo americano endureceu o discurso e acusou ontem governos de países islâmicos de estarem manipulando a questão. A secretária de Estado Condoleezza Rice disse que Síria e Irã estão incitando a violência em protestos diante de embaixadas ocidentais em países árabes. No Afeganistão, morreram pelo menos mais três manifestantes, elevando o número de vítimas até agora para 14 desde o fim de semana.


– Irã e Síria passaram dos limites e estão inflamando sentimentos e usando isto para seus próprios propósitos. O mundo deve chamar a atenção deles em relação a isso – disse Condoleezza. – Há governos (de Síria e Irã) que estão utilizando esta oportunidade para incitar a violência.


Significativamente, ela fez as declarações ao lado da chanceler de Israel, Tzipi Livni. Terça-feira, o líder supremo do Irã, o aiatolá Khamenei, disse que as charges foram um trabalho de Israel, indignado com a vitória do Hamas nas eleições palestinas. As caricaturas, porém, foram publicadas na Dinamarca quatro meses antes do pleito. No mesmo dia, um jornal ligado ao governo iraniano lançou um concurso de charges sobre o Holocausto.


– Nada justifica o incêndio de instalações diplomáticas ou ameaças a embaixadas – disse Condoleezza.


Algumas das mais radicais manifestações foram realizadas em Irã e Síria, países com os quais EUA e Europa têm tido sérias divergências. A Síria é criticada pelo envolvimento no Líbano e acusada de permitir a entrada de armas para rebeldes no Iraque. O Irã reativou seu programa nuclear, contrariando a ONU.


O presidente Bush pediu calma e disse que a liberdade de imprensa deve ser usada com responsabilidade:


– Apelo aos governos de todo o mundo que dêem um fim à violência, que sejam respeitosos, que protejam as propriedades, as vidas dos diplomatas inocentes – afirmou.


Ao lado de Bush estava o rei Abdullah II, da Jordânia, que também pediu calma, mas disse que as charges são ofensivas ao Islã.


Protestos em Bósnia e Cisjordânia


Em Qalat, no Afeganistão, manifestações mais uma vez terminaram em mortes. Centenas de pessoas queimaram um carro da polícia e tentaram invadir uma base americana. Policiais afegãos atiraram, matando três pessoas. Em três dias morreram 12 manifestantes no país (as outras duas vítimas foram em Líbano e Somália).


Centenas de pessoas protestaram ontem diante da sede dos monitores internacionais em Hebron, na Cisjordânia. Em Lahore, no Paquistão, três mil radicais incendiaram dois cinemas. Em Sarajevo, na Bósnia, bandeiras de países europeus foram queimadas.


O semanário satírico francês ‘Charlie Hebdo’ publicou ontem as charges, além de outras caricaturas sobre o islamismo e outras religiões. Uma delas, sob o título ‘Maomé cansado dos radicais’, mostra o profeta com o rosto nas mãos e chorando enquanto diz: ‘É difícil ser amado por idiotas.’


Em editorial, o editor Philippe Val diz que ‘quando extremistas extraem concessões de democracias em questões de princípio, por chantagem ou terror, as democracias estão com os dias contados.’


O presidente francês, Jacques Chirac, criticou o semanário:


– Condeno todas as óbvias provocações que podem inflamar paixões. A liberdade de imprensa deve ser exercida com responsabilidade.


Val se disse chocado com as declarações de Chirac.


A tiragem de 160 mil cópias se esgotou em horas e os editores já anunciaram a impressão de mais 310 mil.


Nos EUA, os editores de um jornal de Nova York se demitiram ao serem impedidos de publicar as charges pelos donos. O ‘New York Press’ publicaria uma reportagem sobre a crise.’


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Assassino de padre na Turquia queria se vingar de charges


‘ROMA e ANCARA. O jovem de 16 anos que matou a tiros um padre italiano que celebrava uma missa no domingo na Turquia teria sido recrutado por um grupo extremista islâmico para cometer o crime como vingança pela publicação da charges do profeta Maomé. Caso tal fato seja comprovado, seria o primeiro assassinato ligado às caricaturas.


De acordo com a advogada Mahya Usta, que assistiu ao depoimento de Ouzhan Akdil na polícia, o assassino confesso disse que cumpria um pedido de um grupo extremista muçulmano da cidade de Trebizonda, onde o padre foi assassinado.


O padre Andrea Santoro, de 61 anos, foi morto quando se preparava para terminar a missa. Akdil se aproximou dele, gritou ‘Alá é grande’ e deu dois tiros no sacerdote, que morreu na hora. Akdil foi preso terça-feira.


Ministro italiano pede que Papa lidere cruzada contra Islã


O Papa Bento XVI disse ontem que o padre Andrea era um ‘silencioso e corajoso servidor do Evangelho.’


– Que o sacrifício de sua vida contribua para a causa do diálogo entre as religiões e a paz entre os povos – disse Bento XVI.


A Santa Sé também divulgou uma carta que foi enviada pelo padre Andrea para o Vaticano cinco dias antes de ser morto. Ele pedia que o Papa, em sua viagem à Turquia programada para novembro, visitasse sua paróquia em Trebizonda.


Apesar da exortação ao diálogo e à paz de Bento XVI, o ministro da Reforma da Itália, Roberto Calderoli, pediu que o Papa liderasse uma cruzada contra o Islã. Em entrevista ao jornal ‘La Reppublica’ ele disse que ‘os islâmicos mudaram sua estratégia: antes usavam só terroristas, agora movem as massas e atacam embaixadas. O Papa deve intervir como fizeram Pio V (1566-1572) e Inocêncio XI (1676-1689)’. Pio V liderou a coalizão ocidental que venceu a batalha marítima de Lepanto contra os otomanos, em 1571, e Inocêncio XI exortou os Estados alemães e a Polônia a acabarem com o cerco otomano a Viena, em 1683.


Calderoli é da Liga Norte, partido de extrema-direita aliado do premier Silvio Berlusconi.’


Anne Applebaum


Dois pesos e duas medidas para os EUA


‘O problema começou na Dinamarca, um país distante do qual sabemos pouco. Envolve charges, uma forma de arte que associamos a humor leve. Deflagrou tumultos em Surabaya, Teerã, Peshawar e Somália, lugares onde não há muitos americanos. Talvez isso explique o nosso silêncio em relação à violência, à raiva e às mortes detonadas por uma dúzia de cartuns dinamarqueses retratando o profeta Maomé. Entretanto, a controvérsia expôs correntes políticas menos atraentes nos EUA também:


Schadenfreude – ou melhor, aquela sensação de certo alívio de que são os europeus o alvo dos tumultos. Também senti isso ao ler sobre tumultos diante de uma base norueguesa da Otan no Afeganistão. Em 2005, em Oslo, ouvi um norueguês dizer que ‘os EUA são o país mais perigoso do mundo’. Mas também vi a nota do Departamento de Estado dizendo que ‘incitar ódio religioso ou étnico dessa maneira é inaceitável’. Os jornais europeus não estavam incitando o ódio. Estavam mostrando o ponto de vista de suas leis. Vamos parecer melhores ao mundo muçulmano agora que os europeus parecem piores?


Hipocrisia da esquerda cultural. Dúzias de jornais americanos, incluindo o ‘Post’, disseram que não publicaram os cartuns porque preferiam ‘evitar ataques gratuitos a símbolos religiosos’. Justo – mas é verdade? Um excelente paralelo foi a barulheira que se seguiu à publicação em 1989 de uma fotografia de Cristo crucificado mergulhado numa jarra de urina. A foto levou a denúncias no Congresso e protestos.


Na época muitos dos jornais americanos que agora se recusam a publicar as charges dinamarquesas publicaram a foto. O fotógrafo Andres Serrano desfrutou de seus 15 minutos de fama, aparecendo até na cobertura de moda do ‘New York Times’. A moral: enquanto ficamos preocupados em ofender fiéis de países distantes e subdesenvolvidos, não nos importamos em ofender fiéis em casa.


Hipocrisia da blogosfera de direita. Lembram-se da controvérsia sobre a ‘Newsweek’ e o Alcorão? Em 2005, a ‘Newsweek’ publicou denúncias de desrespeito ao Alcorão na Base Naval da Baía de Guantánamo, não comprovadas por investigação do governo. No exterior, políticos muçulmanos exageraram a reportagem, como agora exageram a história sobre as charges. O resultado foram tumultos e violência.


Conservadores americanos não culparam políticos ou clérigos mas a ‘Newsweek’ de (acidentalmente) incitar a violência no mundo islâmico: ‘A ‘Newsweek’ mentiu, pessoas morreram.’ Comentários sugeriam que a revista não apenas estava errada, como errara também ao investigar a conduta dos soldados americanos. Por lógica, os blogueiros deveriam agora atacar o jornal dinamarquês. Estranhamente, não ouvi dizerem: ‘O ‘Jyllands-Posten’ insultou, pessoas morreram.’ A moral é: defendemos a liberdade de imprensa se ela significa o direito de cartunistas dinamarqueses retratarem Maomé; mas não defendemos a liberdade de imprensa se isso significa o direito da mídia de investigar o governo americano.


Naturalmente algo de bom pode sair dessa história. Se nada mais for, a controvérsia deve pelo menos acabar com a teoria ingênua de que ‘quanto mais eu aprendo sobre o outro, menos nós brigamos’. Aos poucos, o mundo islâmico está aprendendo que não respeitamos a religião do mesmo jeito que eles. Devagar estamos aprendendo que eles pensam diferente sobre a palavra escrita e a foto impressa. E de alguma forma tenho a sensação de que esse novo conhecimento não será o início de entendimento, mas inspiração para mais violência.


ANNE APPLEBAUM é colunista do Washington Post’


Vivian Oswald


Dinamarca acusa grupo de clérigos islâmicos


‘COPENHAGUE. Longe do fim, a crise desencadeada no mundo muçulmano após a publicação das 12 charges de Maomé pelo jornal dinamarquês ‘Jyllands-Posten’ continua provocando faíscas num cenário altamente inflamável. Um dia depois de o primeiro-ministro da Dinamarca, Anders Rasmussen, pedir calma e reiterar que nem o governo nem o povo dinamarquês tiveram a intenção de ofender os muçulmanos, a ministra de Imigração e Integração, Rikke Hvilshoj, destacou que deixará um grupo de imãs fora das discussões sobre a integração de minorias no país. Eles seriam considerados o estopim da fúria despertada contra a Dinamarca.


Políticos, especialistas e a própria mídia local atribuem a estes personagens boa parte da responsabilidade pelos recentes episódios de violência contra as embaixadas dinamarquesas em países do Oriente Médio, que acabaram levando à morte de 14 pessoas.


Embora as charges tenham sido publicadas em 30 de setembro do ano passado, só agora, mais de quatro meses depois, as reações tomaram vulto e se espalharam pelo mundo. À época, foram registradas algumas manifestações no país e houve pedidos de explicações por parte de embaixadores do mundo muçulmano. Mas o que dizem os políticos é que teria sido após a viagem de alguns imãs pelo mundo árabe – onde teriam retomado o assunto e mostrado as caricaturas – que se propagaram e intensificaram as reações.


– Acho que agora vemos claramente que não é nos imãs que devemos depositar nossa confiança se quisermos que a integração na Dinamarca funcione – disse a ministra.


Segundo seu porta-voz , Thomas Harder, o governo só vai conversar com quem estiver disposto a discutir a integração.


– O governo convidou alguns imãs para uma reunião em setembro do ano passado, mas eles não quiseram comparecer. Essa discussão só vai acontecer com aqueles que estiverem interessados na integração. E existem vários grupos que querem, de várias origens. São dinamarqueses como quaisquer outros que não querem ver as suas bandeiras queimadas no exterior – disse ele ao GLOBO.


No dia 10 de janeiro, um jornal norueguês reproduziu os desenhos aos seus leitores. Cerca de 20 dias depois, foi registrada a primeira reação contra o escritório da União Européia (UE) na Faixa de Gaza exigindo uma retratação. No dia 1 de fevereiro, publicações em França, Alemanha, Itália e Espanha também reproduziram as caricaturas, levantando uma discussão sobre a liberdade de expressão. A partir daí, foi desencadeada uma reação em cadeia em vários países muçulmanos.


Jornal desmente que publicará charges


Em meio a uma crise que tem despertado um debate apaixonado, o ‘Jyllands-Posten’ negou a informação da rede de TV americana CNN – atribuída ao editor de Cultura do jornal, Flemming Rose – de que seriam publicadas as caricaturas do Holocausto anunciadas por uma publicação iraniana em represália aos desenhos do profeta Maomé.


O jornal dinamarquês ‘Information’ publicou declarações da deputada Pia Kjaersgaard, conhecida por sua posição antiimigração. Ela afirmou que ‘todos os líderes muçulmanos devem respeitar o fato de eu não acreditar em seu livro sagrado ou em seu profeta.’’


TV DIGITAL
Mônica Tavares


Teles fixas poderão produzir conteúdo


‘As empresas de telefonia fixa Telemar (que atua em 16 estados), Sercomtel, de Londrina (PR), e CTBC, do Triângulo Mineiro, poderão produzir conteúdo para a TV digital desde que tenham autorização da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). A princípio, elas atendem à Constituição e têm 70% de seu capital total e votante nacional. Ao ser perguntado se elas poderiam produzir conteúdo, o ministro das Comunicações, Hélio Costa, afirmou:


– Possivelmente podem. Se são nacionais em 70%, mediante aprovação da Anatel e obedecida a cláusula 222 da Constituição.


No entanto, segundo ele, as empresas com forte participação estrangeira, como Brasil Telecom e Telefônica, podem apenas transportar conteúdo (oferecer suas estruturas físicas, como cabos de fibra óptica).


Depois de se reunir com as empresas de telefonia, o ministro disse que elas querem garantir seu espaço, principalmente no que diz respeito à utilização dos novos produtos da TV digital. Um destes é a interatividade, que permite ao consumidor escolher os programas que quer ver ou pedir o replay de um gol. O ministro avaliou que será muito mais simples e prático fazer isso por meio da telefonia fixa. A interatividade é considerada fundamental pelo governo porque permitirá a inclusão digital, com acesso à internet pela televisão.


Segundo Costa, as empresas de telefonia fixa, como um setor, não revelaram preferência por qualquer dos padrões (japonês, americano e europeu), mas a Telemar indicou que seria importante usar o europeu. Outro ponto discutido foi o marco regulatório da TV digital, que estabelecerá, por exemplo, como será feita a veiculação e a cobrança de anúncios.


As empresas de telefonia fixa apresentarão um documento com os seus pontos de vista sobre a TV digital. Hoje haverá uma reunião com as operadoras de celular. Costa disse ainda que não existe prazo para o presidente Lula, após receber as propostas, definir o padrão de TV digital a ser implantado.’


***


Deputado quer esticar o prazo para definição do padrão de TV digital


‘O Congresso Nacional, com apoio da indústria eletroeletrônica, quer esticar ainda mais o período para a definição sobre o padrão de TV digital que será implantado no Brasil. Um dia depois de o Ministério das Comunicações anunciar que vai prorrogar o prazo final de 10 de fevereiro por 30 dias, o deputado Walter Pinheiro (PT-BA) apresentou ontem projeto de decreto legislativo adiando, sem data certa, a definição da tecnologia.


A intenção é abrir a discussão sobre o tema. Na justificativa, o parlamentar destacou a importância da medida, que significará incentivo à indústria eletrônica, cultural e à inclusão digital no país. Por isso, os parlamentares querem realizar seminários para aprimorar o debate.


Para ele, as tecnologias sob análise (padrões europeu, japonês e americano) têm potenciais diferentes em relação à geração de emprego, aos novos modelos de negócios das empresas e à democratização do uso da radiodifusão no Brasil. Ele destacou ainda que o mercado brasileiro tem 47 milhões de domicílios que dependem de TV terrestre (antenas externas) de um total de 51 milhões. Por isso, disse, a discussão precisa ser ampliada para o conjunto da sociedade.


O presidente da Associação Nacional de Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos (Eletros), Paulo Saab, concordou que é necessário abrir mais o processo. Ele disse ainda que o usuário precisa ser considerado:


-A indústria está insatisfeita, não está sendo ouvida.


O ministro das Comunicações, Hélio Costa, rebateu as duramente as críticas feitas por Paulo Saab:


– Ou ele não ouve ou está querendo brincar com as minhas funções. Além de ser desagradável, é mal-educado. Se quer defender os interesses da empresa dele (Phillips), que faça, mas não envolva o governo, cuja posição é defender o interesse público – disse Costa.’


INTERNET
Vladimir Goitia e Nelson Vasconcelos


AOL deixa o Brasil


‘SÃO PAULO e RIO. A AOL publicou ontem anúncios em jornais do país informando que vai encerrar sua operação no Brasil no próximo dia 17 de março. Depois dessa data, o acesso à internet pelo provedor AOL Brasil não estará mais disponível. Também sairão do ar o conteúdo do portal e serviços como blog, salas de bate-papo e mensagens instantâneas. A AOL faz parte da Time Warner, o maior grupo de mídia do mundo, que administra a rede de televisão CNN e os estúdios Warner Bros, entre outras empresas. Já a AOL Latin America – responsável pela subsidiária brasileira – é uma joint-venture entre a AOL americana, o grupo venezuelano Cisneros e o Banco Itaú.


O único serviço que a AOL manterá no país depois de 17 de março é o e-mail, cujas contas permanecerão ativas até 31 de julho, mas apenas para quem tiver migrado para o portal Terra. Em dezembro, o Terra comprou a base de assinantes da AOL Brasil. Pelo acordo, pagará entre US$ 760 mil e US$ 1,9 milhão à AOL Latin America. O valor final da transação dependerá do número de assinantes da AOL Brasil que migrarem para seu serviço de acesso. Fontes próximas ao provedor afirmam que são cerca de 150 mil clientes.


Para quem acompanha o mercado brasileiro de internet, o fechamento da AOL Brasil era questão de tempo. Primeiro porque a AOL Latin America entrou em processo de concordata em junho passado e, desde então, conseguiu vender suas operações na Argentina e no México. Além disso, mesmo investindo pesadamente em marketing durante um bom tempo, a AOL Brasil nunca conseguiu ganhar de verdade o coração do internauta brasileiro.


Presente no país desde novembro de 1999, foram pouco mais de seis anos colecionando decepções – a primeira já na campanha de lançamento do provedor, quando a empresa distribuiu milhares de CD-ROMs que invariavelmente provocavam problemas nos computadores de quem os instalava. A repercussão foi péssima, para alegria da concorrência.


Com sua saída do país, a AOL Brasil repete o destino de outros grandes grupos internacionais que, desde o fim dos anos 90, tentaram ganhar o mercado brasileiro de internet. A Starmedia, por exemplo, foi uma das empresas que encontraram por aqui um cenário bem menos afável do que o prometido naquela época, quando se acreditava que a internet seria imprescindível para todos os cidadãos, gerando lucros altos em pouco tempo. Não foi bem assim.


A propósito, quem não deverá reclamar muito do fim da AOL latina será seu principal executivo, Charles Herrington, que vai receber US$ 999 mil referentes a bônus e à sua saída da operação.


(*) Especial para o GLOBO’


O Globo


Microsoft entra no mercado de antivírus


‘SEATTLE (EUA). A Microsoft Corp. decidiu lançar seu próprio programa antivírus, para concorrer com os tradicionais produtos de Symantec Corp. e McAfee. A gigante do software informou que o programa, batizado de Windows OneCare Live, será lançado em junho deste ano. O serviço será por assinatura e auto-atualizável.


A companhia minimizou o risco de uma briga com as fabricantes de software de segurança, afirmando que nenhuma delas oferece o pacote completo: antivírus, firewall (barreira) e anti-spyware (programa-espião), além de ferramentas de backup e manutenção.


– Hoje no mercado não há ninguém nessa categoria – disse Dennis Bonsall, diretor do Windows OneCare Live.


A assinatura do programa, que poderá ser feita pela internet, custará US$ 49,95, para até três computadores, atendendo a pequenas empresas.’


CINEMA & JORNALISMO
Luis Fernando Verissimo


Filmes cruzados


‘Numa das cenas reais da comissão do senador McCarthy em ação no filme ‘Boa noite e boa sorte’ aparece Roy Cohn, assessor da comissão, interrogando, e acuando, uma acusada. Cohn depois seria um dos responsáveis pelo caso criado entre McCarthy e o exército americano porque andou pela Europa investigando comunistas nas representações diplomáticas do país na companhia de um jovem oficial, provavelmente seu amante, que não tinha a devida autorização do exército. Ou algo assim. O caso contribuiu para que McCarthy caísse em desgraça mas nada parecido aconteceu com Cohn, que se tornou um dos mais poderosos advogados de Nova York, famoso tanto pela falta de escrúpulos como pelo sucesso defendendo patifes ricos. Ele morreu, de Aids, em 1986.


Roy Cohn era uma figura repulsiva e fascinante, e Tony Kushner o transformou no personagem principal da sua peça ‘Angels in America’. Judeu e homossexual como Cohn, Kushner viu no personagem um bom catalisador dramático para o que chamou de ‘uma fantasia gay sobre temas nacionais’, a loucura dos anos oitenta, de ganância e culpa, promiscuidade e castigo, revolucionários e reacionários ao mesmo tempo, resumida num patife específico, que também servia para reflexões sobre o judeu e o homossexual na América. A fantasia de Kushner incluía visitações de anjos e um encontro de Cohn, agonizante, com o fantasma de Ethel Rosenberg, cuja execução como espiã ele teria instigado no começo da sua carreira como promotor em Washington.


Tony Kushner é um dos autores do roteiro de ‘Munique’ e não se sabe quanto da sua participação também é uma fantasia sobre o tema, e quanto da ambigüidade do filme é dele. ‘Munique’ também é uma reflexão sobre o judeu no mundo, sobre o sacrifício de um legado moral pela sobrevivência e diferenças entre o ético e o certo. A posição conhecida de Kushner nas questões do Oriente Médio é bem mais à esquerda do que a de Spielberg. Até que ponto estas preocupações eram dele e prevaleceram no roteiro? Algumas coisas do filme são fantasiosas, ou inexplicáveis. Com todos os recursos postos ao seu dispor, mesmo na clandestinidade, por Israel, por que o grupo recorreria informações àquela misteriosa organização francesa, presumivelmente (pelo menos pela quantidade de filhos) católica? O crítico Anthony Lane, da ‘New Yorker’, escreveu que a cena da execução da moça perfumada do bar é a coisa mais gratuita que o Spielberg já fez. Podem ser coisas do Kushner. Mas todos os melhores diálogos do filme certamente também são.’


REQUIÃO vs. GAZETA
O Globo


Requião ataca jornal do Paraná em 30 outdoors


‘CURITIBA. O governador do Paraná, Roberto Requião, através do PMDB, sua legenda partidária, decidiu atacar o jornal ‘Gazeta do Povo’, um dos mais tradicionais veículos de comunicação do Paraná. A população da capital e do litoral foi surpreendida com 30 outdoors espalhados pela cidade com a inscrição semelhante a uma bula de remédio ‘PMDB adverte: Gazeta do Povo mente’.


A reação da direção do jornal ontem veio na capa, com um editorial que aponta o motivo inicial do desgosto do governador: reportagem revelando a poluição das praias do Paraná, principalmente denunciando a precariedade do saneamento básico no litoral na alta temporada.


‘A reação do governador não chegou a surpreender. Não foi a primeira nem será a última vez que aqueles que pensam de maneira diversa de S. Exa. são alvejados pela retórica descabida de ofensas’, diz o editorial. Ontem, nenhuma resposta partiu do governador. A direção do jornal estuda medidas legais cabíveis.


A direção do PMDB no Paraná, a quem foi atribuída a autoria dos outdoors, alegou que a publicação dos cartazes foi decidida em conjunto com o governo estadual. O presidente nacional do PMDB, Michel Temer, afirmou que vai cobrar uma resposta do governador.’


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O Estado de S. Paulo


Quinta-feira, 9 de fevereiro de 2006


CRISE DAS CHARGES
O Estado de S. Paulo


Rice acusa Irã e Síria pela violência


‘REUTERS, AFP, AP, EFE E THE GUARDIAN, WASHINGTON – A secretária de Estado dos Estados Unidos, Condoleezza Rice, acusou a Síria e o Irã de estimularem deliberadamente os violentos protestos no mundo islâmico contra a publicação por parte da imprensa européia de caricaturas do profeta Maomé, que ontem deixaram mais 4 mortos no Afeganistão.


Segundo a chefe da diplomacia americana, Irã e Síria estão usando o incidente com claro propósito de inflamar sentimentos antiocidentais no mundo islâmico. Condoleezza fez essa declaração pouco depois de um apelo do presidente George W. Bush aos governos dos países islâmicos para conter a onda de violência e notícias sobre novos e graves distúrbios no Afeganistão.


O presidente americano conclamou os países islâmicos a conter a onda de violência desatada pela republicação das 12 caricaturas do profeta Maomé. E também a defender a integridade dos diplomatas e a propriedade privada. Bush disse que os governos devem agir com determinação e respeito para pôr fim aos graves distúrbios que ameaçam a vida de pessoas inocentes. Ele dirigiu o apelo ao receber, na Casa Branca, o rei Abdala, da Jordânia.


Os Estados Unidos suspeitam de que grupos terroristas islâmicos, como a Al-Qaeda, de Osama bin Laden, e a Jihad Islâmica, estejam instigando e coordenando as manifestações de protesto que assolam o mundo muçulmano – em particular o Afeganistão. Segundo fontes do Departamento da Defesa, uma ampla investigação, em conjunto com serviços secretos de países aliados, está em pleno andamento.


DISTÚRBIOS


Pelo terceiro dia consecutivo, as forças de segurança afegãs dissolveram ontem à bala uma manifestação, matando 4 pessoas e ferindo pelo menos 20. Desta vez, na cidade de Qalat, província de Zabul (sul do país). A multidão dirigia-se a uma base militar americana na região, quando a polícia interveio.


‘Manifestantes portando armas de fogo atacaram e incendiaram quatro postos de gasolina e feriram com pedradas vários agentes que tentavam contê-los’, disse o general Abdul Razaq, comandante das forças de segurança afegãs na província, tentando justificar a sangrenta reação dos policiais. Eleva-se agora a 12 o total de afegãos mortos desde segunda-feira, quando começaram as tentativas de ataque e invasão das instalações militares estrangeiras no país, incluindo um QG da Organização do Tratado ao Atlântico Norte (Otan).


O presidente Hamid Karzai lamentou a republicação das caricaturas de Maomé na Europa, classificando-a de ‘insulto para mais de um bilhão de islâmicos’. Mas lamentou os ataques contra os soldados europeus mobilizados no Afeganistão. ‘Eles nada têm a ver com isso’, destacou Karzai. ‘Estão aqui para ajudar-nos a estabilizar e reconstruir o país.’


Preocupado com o agravamento da crise, o Conselho de Ulemás do Afeganistão reuniu-se ontem em Cabul e pediu à população que expresse sua indignação contra o ato de blasfêmia pacificamente, lembrando que o Alcorão condena a violência.


Atacada, missão internacional deixa Hebron


A missão internacional encarregada de evitar conflitos entre os 500 colonos israelenses e os cerca de 150 mil habitantes palestinos de Hebron, na Cisjordânia, decidiu deixar temporariamente a cidade. Isso porque vários de seus integrantes são europeus e sua sede voltou a ser atacada ontem por dezenas de furiosos palestinos que protestavam contra a republicação das caricaturas de Maomé. Os manifestantes arremessaram pedras e coquetéis molotov contra o edifício da Presença Temporária Internacional em Hebron. ‘Ninguém ficou ferido, mas, por medida de segurança, vamos sair da cidade’, disse o chefe da missão, Arnstein Overkil.’


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Hackers muçulmanos atacam sites ocidentais


‘LONDRES – Mais de 600 websites da Dinamarca foram invadidos nos últimos dias por hackers islâmicos em protesto contra as charges do profeta Maomé publicadas pela imprensa européia. A informação é da empresa de monitoramento online Zone-H, que também detectou invasões em mais de mil sites israelenses e de países ocidentais.


De acordo com a Zona-H, o número de ataques é recorde para uma polêmica religiosa. Em entrevista à BBC, o fundador e administrador da Zone-H, Roberto Preatoni, disse nunca ter visto tantos ataques motivados por uma questão religiosa em um espaço de tempo tão curto. ‘O mais interessante nesse caso foi a rapidez com que a comunidade se mobilizou’, disse ele.


Com o monitoramento de canais de bate-papo em que é comum a participação de hackers, a Zone-H identificou a formação de grupos de ativistas de vários países que teriam se unido para tornar as invasões mais eficientes. Os grupos envolvidos são da Turquia, Arábia Saudita, Omã e Indonésia. Muitos deles já eram conhecidos, mas outros emergiram recentemente.


Ainda segundo a Zone-H, o conceito de uma ‘Nação Islâmica’ transcontinental nunca foi tão ‘digitalmente claro’ como hoje. ‘Na verdade, trata-se de uma União Islâmica sem fronteiras e distante das amarras governamentais’, diz uma reportagem sobre os ataques divulgada ontem no site da empresa.


Para protestar contra a publicação das caricaturas, os hackers substituem as páginas originais por mensagens pró-islâmicas.


Os atacantes se dividem em dois grupos. Os mais calmos apenas protestam e xingam. Os mais exaltados defendem uma resposta violenta contra quem publicou as charges. As investidas, de acordo com o Zone-H, são feitas tanto por indivíduis como por grupos de muçulmanos. Em um dos ataques identificados pela Zone-H, o hacker ‘DarlBlood’ incita o boicote a produtos dinamarqueses pela comunidade islâmica. Muitos manifestantes, no entanto, chegaram a fazer ameaças de atentados suicidas. Isso é o que dizia, por exemplo, uma mensagem postada em um fórum dinamarquês por um grupo que se autodenomina ‘Brigadas Islâmicas da Internet’.


Segundo a Associated Press, nas últimas duas semanas os servidores do Jyllands-Posten também foram alvo de ciberterrorismo. Em uma das tentativas, hackers muçulmanos conseguiram tirar o portal do ar temporariamente.’


Leda Balbino


Livro e comediante incitaram jornal da Dinamarca a questionar autocensura


‘Ao finalizar o livro infantil O Alcorão e a vida do Profeta Maomé, o escritor e jornalista dinamarquês Kare Bluitgen teve dificuldades em encontrar um desenhista que aceitasse ilustrar o livro. A justificativa mais freqüente era o temor de represálias de extremistas islâmicos. Quando finalmente encontrou alguém que aceitasse o trabalho, Bluitgen não incluiu seu nome no livro: o cartunista só aceitou colaborar sob a condição de anonimato.


A experiência de Bluitgen foi um dos motivos que levaram o editor de cultura do jornal dinamarquês Jyllands-Posten, Flemming Rose, a indagar se havia um sentimento de autocensura em seu país e na Europa. Rose constatou que esse temor estava disseminado, já que o comediante dinamarquês Frank Hvam havia declarado que ousaria urinar sobre a bíblia, mas não sobre o Alcorão. E em toda Europa não se encontravam tradutores para um livro de Ayan Hirsi Ali, roteirista do filme Submission, do cineasta holandês Theo Van Gogh. Em 2004, Van Gogh foi morto em represália pela forma como retratou o tratamento dado às muçulmanas.


Foi por esses motivos que Rose resolveu lançar o desafio de retratar Maomé. Doze desenhistas aceitaram a proposta, e as charges foram publicadas em setembro. Quando eles apareceram em um jornal norueguês este ano, os protestos se espalharam pelo mundo.’


Marc Bassets


ENTREVISTA: ‘Não imaginamos que haveria violência’


‘LA VANGUARDIA, COPENHAGUE – O imã Ahmed Abu Laban é um dos homens mais odiados da Dinamarca. O líder religioso muçulmano é considerado no país escandinavo um dos principais responsáveis pela reação internacional contra as caricaturas do profeta Maomé publicadas em setembro no jornal dinamarquês Jyllands-Posten.


Em setembro, quando sua organização começou a protestar contra as caricaturas, o sr. imaginou que isso acabaria com embaixadas e consulados dinamarqueses em chamas?


Não esperávamos chegar a essa situação. Sabíamos que os muçulmanos reagiriam, mas não podíamos prever a dimensão, a intensidade. E nunca imaginamos que haveria violência. O que esperávamos era que nos dessem mais atenção cultural: professores, pensadores, universidades, para organizar debates e seminários.


O sr. lamenta ter organizado, no ano passado, a viagem de uma delegação a países árabes para explicar o caso das caricaturas?


Deixe-me corrigi-lo. Éramos um grupo de organizações, um comitê. Assim, transformar-me no orquestrador de tudo não é correto. Porque Maomé é querido e respeitado por todo muçulmano. Em relação à pergunta, o que eu deveria lamentar? Se a violência tem um efeito negativo sobre a questão, sim, devo lamentar. Tratamos de iniciar um debate frutífero. Se a violência prejudica nossa causa, devo lamentar. Mas, se continua havendo um mal-entendido entre os lados, devemos argumentar em favor de nosso ponto de vista.


Alguns dizem que agora ninguém se atreveria a desenhar Maomé novamente. Poderíamos entender que a violência foi útil para seu ponto de vista.


Para uma mentalidade atéia – e todos são livres para crer ou não -, Maomé é uma fantasia. Para estes, Maomé não existe como pessoa, é uma espécie de ilusão. Portanto, que se esqueçam dele. Creio que será bom se, no futuro, as pessoas refletirem com seriedade antes de fazer mais caricaturas.


Não farão mais caricaturas porque têm medo.


Os homens não podem viver sem temor e tampouco sem satisfações. Tememos ficar sem gasolina na estrada, tememos ficar sem pão para comer… O temor é normal, não é negativo.


No sermão da sexta-feira passada, o sr. disse que, de seu ponto de vista, Maomé é sagrado, enquanto para a imprensa dinamarquesa a liberdade de expressão é sagrada. Isto é interessante, mas o sr. vive na Dinamarca, onde a liberdade de expressão é sagrada. Muitos dinamarqueses dirão que o sr. deve aceitá-la.


Se um rei o convidasse a seu palácio de cem aposentos e lhe dissesse: ‘O sr. é meu convidado durante uma semana e poderá usar todos os aposentos, menos um. Poderá usar 99’, em uma semana o sr. não teria tempo de passar pelos 99, e por isso não se sentiria limitado. Assim, se nos esquecermos dos profetas de Deus (ao fazer caricaturas), não perderemos nossa liberdade de expressão.


Se a imprensa dinamarquesa pode rir da rainha e do papa, por que não pode rir de Maomé?


Uma vez o papa de Roma convidou um grupo de religiosos, entre eles muçulmanos. E ordenou que não fosse servido vinho em respeito aos muçulmanos. Desse modo, comportou-se de uma maneira muito civilizada. Agradou-lhe oferecer hospitalidade a seus convidados para não incomodá-los.


Dou este exemplo porque, se os dinamarqueses querem pintar sua rainha ou qualquer celebridade, é problema deles.


Na Constituição dinamarquesa e em constituições de outros países europeus, fala-se de liberdade de culto e direitos humanos. Assim, que façam todas as caricaturas que desejarem, mas esqueçam-se de Maomé. O que há de errado em aceitar isso para a mentalidade dinamarquesa? Que efeito teria sobre a liberdade de expressão?


Não seria uma liberdade de expressão completa. Seria possível falar de todo mundo, menos do profeta.


Em alguns casos a liberdade de expressão pode ser limitada por lei. Em casos de ofensa. Portanto, caricaturar ou pintar o profeta Maomé poderia incluir-se nesta categoria. A lei diria, por consenso da maioria, que pintar qualquer profeta de Deus é uma ofensa.


O jornal ‘Jyllands-Posten’ e o governo pediram desculpas pelas possíveis ofensas. É suficiente?


Em minha opinião, é suficiente, mas como podemos convencer as pessoas (nos países muçulmanos)? Concordamos que existe uma falta de comunicação e uma falta de compreensão. Estamos dispostos a cooperar para que as pessoas no Oriente Médio entendam a situação.


Muitos não entendem por que ocorre tal reação contra as caricaturas e não há nenhuma reação semelhante contra os terroristas que matam em nome do Islã.


Os muçulmanos se irritariam com o sr. dizendo que se trata do típico critério duplo europeu ocidental. Por que nos decepcionaram quando sofríamos ditaduras, apoiando essas ditaduras que serviam a seus interesses no Oriente Médio, e agora, quando fazemos o mesmo para protestar contra as caricaturas, vêm com essa pergunta?’


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Jornal trará as charges do Holocausto


‘AP, COPENHAGUE – O editor responsável pela publicação das charges de Maomé no jornal dinamarquês Jyllands-Posten, Flemming Rose, disse ontem que publicará as caricaturas sobre o Holocausto que vencerem o concurso do diário iraniano Hamshahri. Esse jornal abriu um concurso sobre um tema considerado tabu no Ocidente, como resposta às charges. ‘Estamos tentando um contato com o jornal iraniano para publicar as charges no mesmo dia’, disse Rose à TV americana CNN.’


TV DIGITAL
Gerusa Marques e Isabel Sobral


Setor privado também tem divergências sobre a TV digital


‘A falta de consenso no governo sobre a escolha do padrão de TV digital adiou por 30 dias a decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A nova data para a definição do modelo, que deveria ser anunciado até amanhã, foi formalizada ontem por meio de decreto publicado no Diário Oficial da União. Ficou para 10 de março. O ministro das Comunicações, Hélio Costa, argumentou que ‘é uma decisão política, técnica e econômica’. ‘Não é tão rápida’, disse.


A dificuldade de consenso também é observada no setor privado. Ontem, divergências de ordem tecnológica e comercial, além da questão de prazo para a definição do padrão, ficaram explícitas num debate na Câmara. O presidente da Casa, Aldo Rebelo, reuniu no plenário representantes das emissoras de TV, da indústria de televisores, das operadoras de telefonia celular e de entidades da sociedade civil. No final, ficou claro que a escolha está mais para os modelos japonês e europeu.


Os quatro ministros que compõem o comitê da TV digital – Hélio Costa, Dilma Rousseff (Casa Civil), Antonio Palocci (Fazenda) e Luiz Fernando Furlan (Desenvolvimento) – analisam três aspectos: tecnológico, comercial e político. Lula receberá um relatório em que cada aspecto é analisado.


Se o Brasil quer fazer a melhor escolha técnica, os estudos apontam para o japonês. Mas é necessário pensar em um potencial de mercado de exportação para as indústrias brasileiras de televisores e, nesse quesito, o europeu leva vantagem, pois é usado em mais de 50 países.


O padrão americano também se credencia comercialmente por causa da extensa pauta de negociações entre Brasil e Estados Unidos, mas só é usado lá e no Canadá. Do ponto de vista político, é preciso considerar o desejo das emissoras de TV, que já mostraram preferência pelo sistema japonês.


Os radiodifusores defenderam uma solução rápida. O presidente da Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), José Inácio Pizani, disse que o padrão japonês ‘é o mais evoluído tecnologicamente’. Entidades de defesa da democratização das comunicações, por sua vez, querem que a escolha do padrão ocorra só depois da elaboração de uma nova legislação para o setor.


A preferência de Costa pelo padrão japonês e a forma como conduz o processo foram criticadas. ‘Não foi realizada nenhuma audiência pública sobre um assunto que interessa a 95% da população, enquanto Hélio Costa se reúne a portas fechadas com os radiodifusores’, afirmou o presidente da Intervozes, Gustavo Gindre.’


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Novo padrão atrai interesse de operadoras


‘As operadoras de telefonia fixa também querem garantir seu espaço no universo de novos serviços que será aberto a partir da escolha do padrão de TV digital no País. Ontem, os presidentes dessas empresas se reuniram com o ministro das Comunicações, Hélio Costa, e com a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff.


O ministro comentou que a interatividade na TV digital poderá ser feita pela telefonia fixa, pois ela já dispõe da infra-estrutura logística. ‘É muito mais simples, prático e fácil fazer essa interatividade na TV aberta pelo serviço fixo (de telefonia)’, disse o ministro.


Ele relatou também que o representante da Telemar manifestou, em reunião no Planalto, preferência pela escolha do padrão digital europeu. O Brasil está estudando os padrões europeu, japonês e americano.


Hoje, Costa voltará a tratar do tema TV digital em duas reuniões. Uma será feita com os representantes de 20 consórcios de universidades e empresas de software formados para agregar tecnologia ao padrão que vier a ser escolhido pelo Brasil. A outra reunião do dia será com os representantes das operadoras de telefonia celular.’


INTERNET
Renato Cruz


Google quer digitalizar livros brasileiros para oferecer busca


‘O Google, gigante americano da internet, está mesmo com fome de Brasil. Depois da visita ao País de seus fundadores, Larry Page e Sergey Brin, na semana passada, está em São Paulo o genovês Marco Marinucci, gerente de Desenvolvimento de Negócios do Google Books. Ontem, ele fez uma apresentação para cerca de 70 integrantes da Câmara Brasileira do Livro (CBL), no Instituto Goethe, para mostrar aos editores e livreiros brasileiros seu serviço de digitalização e buscas em livros.


‘Queremos lançar o Google Books em breve no Brasil’, afirmou Marinucci, antes da reunião. Ele acrescentou que a empresa prefere anunciar o serviço em grandes eventos do setor. A Bienal do Livro de São Paulo será realizada de 9 a 19 de março.


Fora do Brasil, o projeto recebeu críticas duras. ‘Houve um certo problema de comunicação’, disse o executivo. ‘Queremos evitar que aconteça aqui.’ A Associação Americana de Editoras Universitárias, que reúne 125 integrantes, chegou a enviar uma carta ao Google expressando preocupações com a possibilidade de desrespeito a direitos autorais.


O Google Books busca contratos com as editoras para ter em seu banco de dados versões digitais dos livros, que poderão ser buscadas pela internet. ‘Só mostramos cinco páginas por busca: a mais relevante, as duas anteriores e as duas posteriores’, explicou Marinucci. ‘A qualidade é bem baixa. Não se trata de uma ferramenta para ler várias páginas. Elas não podem ser impressas, copiadas ou gravadas.’


O executivo afirmou que o serviço deve ajudar a vender livros. Nos Estados Unidos, ele foi combinado com outros, como o Maps e o Local, para mostrar as livrarias mais próximas do internauta, e o Froogle, de comparação de preços de varejistas da internet, para incentivar a compra online do livro. Além disso, o Google mostra anúncios de texto no pé da página do livro digital, caso seja do interesse do editor, que recebe metade da receita gerada pelos cliques. Não há custo para o editor.


Essa é a parte do projeto para livros sob direito autoral. O Google Books mostra o texto integral dos livros em domínio público. Ele fechou acordo com grandes bibliotecas do mundo para ter acesso a esse tipo de texto. Para os livros fora de catálogo, mas que ainda não caíram em domínio público, o Google mostra as bibliotecas em que podem ser encontrados. ‘Mais de 80% da informação do mundo está offline’, afirmou Marinucci. A missão corporativa do Google é ‘organizar a informação do mundo e torná-la universalmente acessível e útil’.


O vice-presidente da CBL, Bernardo Gurbanov, afirmou, após a reunião, que as primeiras impressões foram positivas. ‘O Departamento Jurídico da CBL está estudando o contrato e, semana que vem, poderá oferecer um parecer aos associados’, afirmou Gurbanov, que é dono da Letraviva, que vende e edita livros em espanhol. Ele disse que, após o sinal verde do Jurídico, planeja colocar no Google os livros que edita.


Na reunião, os editores expressaram preocupação com questões de segurança, por terem de entregar seus livros a uma outra empresa. Além disso, destacaram que o sistema pode não ser interessante para livros de referência, como dicionários, jurídicos e de receitas.’


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Projeto Gutemberg é pioneiro em livros na rede


‘Outras empresas da internet, como Yahoo! e Amazon, também têm programas de digitalização de livros. Mas o pioneiro é o Projeto Gutemberg. Criado em 1971 por Michael Hart, oferece de graça e em formato digital 17 mil livros em domínio público. Em um mês, são baixados quase 2 milhões de livros. Os mais procurados: ‘Alice no País das Maravilhas’, de Lewis Carroll, ‘Ulisses’, de James Joyce, e ‘A Metamorfose’, de Franz Kafka. Todos em inglês.


Em entrevista ao ‘Wall Street Journal’, em dezembro de 2005, Hart reclamou: ‘Falei com o Google um ano antes de seu grande anúncio. Eles nos procuraram. (…) Nos deixaram falar sobre tudo o que estávamos fazendo. Isso aconteceu na sede do Google no Vale do Silício. Nos deram um almoço grátis e tudo. Foram muito gentis, mas muito orientados a um plano de negócios. Num determinado momento, eles nos levaram até a porta. Então eu ouvi a respeito [do Google Book Search] ao mesmo tempo em que todo mundo.’ Marco Marinucci, do Google, disse que é verdade a parte do almoço: ‘A proposta de criar bibliotecas digitais está na origem do Google’.’


Renato Cruz


Telefonia via internet chega à prateleira do supermercado


‘A telefonia via internet, que há poucos anos era coisa de micreiro, começa a conquistar espaço no varejo. O Extra Hipermercados, do Grupo Pão de Açúcar, começou a vender em 10 de suas lojas, nas cidades de São Paulo, Campinas e Rio de Janeiro, o Hip Box, aparelho que converte voz em dados, para ser ligado à conexão de banda larga.


‘Ainda não é uma explosão de vendas, mas os consumidores estão procurando cada vez mais o serviço’, explicou Paulo Humberg, presidente da Hip Telecom, operadora com quem o Extra fechou acordo. ‘O mercado está amadurecendo muito rápido. As empresas pequenas e médias, principalmente, estão aderindo mais rápido que o esperado.’


Segundo a Hip Telecom, o serviço permite reduzir os gastos com ligações de longa distância em até 70%. Em 2005, a empresa contava com cerca de 12 mil clientes e quer terminar o ano com 60 mil. ‘Queremos ser a principal empresa do segmento em 2009’, afirmou Humberg. Não é tarefa fácil. O Skype, serviço de telefonia via internet mais conhecido do mundo, fechou um acordo com a brasileira Transit para oferecer números brasileiros. As concessionárias de telefonia fixa – Telefônica, Telemar, Brasil Telecom e Embratel – estão prontas para entrar no jogo e defender sua participação de mercado.


A Hip Telecom já vende seu aparelho na Blockbuster e no Submarino, entre outros. No Extra, a empresa colocou promotores nos pontos de vendas, para ajudar o consumidor a entender o que é o produto. ‘Tem muita dúvida’, disse Humberg. ‘Querem saber se funciona sem banda larga. Depois que aprende, não larga.’ Com o Hip Box, o cliente pode conectar um aparelho telefônico comum à internet, sem ter que ligar o computador.


Um dos planos oferecidos pela Hip Telecom, chamado Hip Net São Paulo Ilimitado, dá direito a chamadas locais ilimitadas para 39 municípios do Estado, incluindo a capital. A empresa também lançou o cartão DDHip, que permite chamadas nacionais e internacionais a partir de qualquer telefone (fixo, móvel ou orelhão), com preços até 50% menores. Inicialmente, o cartão está disponível na Grande São Paulo e São José dos Campos.’


Todd Bishop


Microsoft prepara pacote de proteção


‘SEATTLE POST-INTELLIGENCER, SEATTLE – A Microsoft Corp. informou que seu novo serviço de segurança e manutenção de computadores chega ao mercado em junho, por uma taxa de inscrição anual de US$ 49,95. O serviço vai competir com outros programas que procuram proteger o sistema operacional Windows, da própria Microsoft, de ameaças online.


Batizado de Windows OneCare Live, o serviço foi anunciado no ano passado e está disponível para testes desde novembro. Mas, ao divulgar o preço e a data do lançamento, a Microsoft expôs dois aspectos-chave da estratégia que usará para competir com empresas como McAfee, Trend Micro e Symantec, que usa a marca Norton para o consumidor.


A Microsoft diz que o Windows OneCare incluirá proteção antivírus, firewall (sistema que impede o acesso não autorizado de e para rede privada, freqüentemente usado para impedir o acesso a intranets), dispositivo antiespionagem, recursos de manutenção do PC, backup de dados e mais assistência técnica e atualizações gratuitas. Dependendo do período de tempo, a taxa de assinatura anual pode ser equivalente ou até menor que o preço de softwares concorrentes com atualizações. ‘A empresa parece estar ‘visando agressivamente’ a esses rivais’, disse Paul Stamp, analista da Forrester Research.


Porém, ao cortejar os consumidores com seu serviço de segurança, a Microsoft enfrenta um obstáculo psicológico que as outras empresas não enfrentam – defeitos no Windows e em outros programas da Microsoft têm ajudado vírus e outras ameaças online a se proliferarem.


‘O consumidor precisa tomar uma decisão – devo confiar na Microsoft quando eles estão tendo dificuldades para proteger sua plataforma?’, diz Lane Bess, gerente-geral de negócios ao consumidor da Trend Micro.


Mas a Microsoft, que trabalha separadamente para reduzir os problemas do Windows, percebeu que havia a necessidade de um serviço de assinatura com tudo incluído para proteger e manter os PCs do consumidor, disse Dennis Bonsall, diretor da Windows OneCare.’


TELEVISÃO
Beatriz Coelho Silva


Gêmeos. De novo


‘Manoel Carlos volta à zona sul do Rio e ao parto de gêmeos em Páginas da Vida (título provisório), novela das 9 que estréia no fim do ano na Globo. A novidade é a bailarina Ana Botafogo como atriz: ela será uma professora de balé, casada com um trambiqueiro (Buza Ferraz). O convite à primeira bailarina do Teatro Municipal do Rio partiu do autor, eterno fã de Ana. Ela terá cenas dramáticas e dançará na telinha, ótima chance para o diretor Jaime Monjardim (que estréia parceria com Manoel Carlos) inovar nessa linguagem.


Gêmeos são uma constante na obra de Manoel Carlos. Foi assim em Baila Comigo (papéis de Tony Ramos), em Por Amor (paridos por Laura, personagem de Viviane Pasmanter que morria num acidente), e em Laços de Família (filhos da doméstica Ritinha, de Juliana Paes, que também morria, mas no parto). Em Páginas da Vida, a mãe dos gêmeos também morrerá ao dar à luz. Será um casal cuja menina é portadora de Down. Os avós maternos cuidam do garoto, mas rejeitam a menina, que é adotada pela obstetra que fez o parto. Anos depois, o pai tenta reaver a guarda da filha.’


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