Uma pequena nota publicada pela Folha de S. Paulo na edição de sexta-feira (16/8) reflete mais intensamente o impacto provocado pelo fenômeno da Mídia Ninjado que as centenas de páginas já produzidas por intelectuais de várias grandezas, jornalistas e curiosos, em jornais, revistas e nas redes sociais digitais.
O texto em questão informa que o senador Aloysio Nunes Ferreira, do PSDB paulista, apresentou pedido de informações aos ministérios da Fazenda, Cultura e de Minas e Energia: ele quer saber se a Petrobras, o Banco do Brasil e entidades de apoio à cultura repassaram alguma verba para o coletivo de midiativistas que se notabilizou ao transmitir as manifestações que paralisam algumas das grandes cidades brasileiras desde junho.
A motivação do senador é explícita: “A Mídia Ninja fazcríticas à mídia tradicional, por isso quero saber de onde vêm os recursos dessa agência de notícias informal”, afirmou, segundo a Folha. Ou seja, ele se apresenta em defesa da imprensa que lhe dá o palanque.
Há outras manifestações em torno desse fenômeno de comunicação, que acompanha a impactante onda de protestos que já se integrou à rotina do país, mas a iniciativa do senador é o fato que define mais explicitamente o confronto que está em curso nas ruas.
Ao levantar suspeitas de que a Mídia Ninja e, porextensão, os coletivos de ação cultural abrigados nas casas Fora do Eixo, que lhe deram origem, são um braço militante ligado ao governo federal, ele tenta restringir a questão ao ambiente da política formal do qual faz parte. Fora desse contexto, o senador Aloysio e seus pares, os poderes da República e a mídia tradicional, são parte de um campo que é apenas uma referência no conjunto de eventos do qual faz parte a Mídia Ninja.
O aspecto mais interessante das manifestações de rua é o fato de se dirigirem às instituições de fora para dentro. Elas resultam do distanciamento criado pelas próprias instituições em relação à sociedade: o Estado, cujo controle as forças políticas institucionalizadas disputam, à revelia da sociedade, se afastou das ruas, fechando-se em seu próprio circo, de onde a mídia tradicional transmite os espetáculos deprimentes de magistrados em duelos de egos e de parlamentares disputando o butim do Tesouro.
A Mídia Ninja nãodemonstra interesse por esse campo específico, a não ser como objeto de protestos a serem filmados e publicizados, assim como ao coletivo Fora do Eixo não interessa o que Hollywood vai colocar nas telas do cinema.
A iniciativa do senador tem o propósito de mergulhar os dois movimentos no lamaçal em que se transformou a política institucional.
Preparando o confronto
Ainda no complexo de informações e opiniões que derivam da onda de protestos, registro para ampla reportagem do Globo colocando em discussão a necessidade de equilibrar o direito de manifestação com o direito dos demais cidadãos de ir e vir nas cidades onde levam suas vidas.
Esse é um aspecto interessante que ainda não havia sido apresentado devidamente em destaque pela imprensa, e que reflete um impasse a ser solucionado. No Estado de S.Paulo, dois artigos, lado a lado, percorrem o espaço que vai da questão da mobilidade urbana ao protagonismo dos midiativistas. Na Folha, também um artigo discute a violência de manifestantes e da Polícia Militar (ver aqui) e outro texto opinativo tenta desqualificar a Mídia Ninja (ver aqui) chamando seus integrantes de “jovens marqueteiros”.
Interessante observar que, assim como o senador Nunes Ferreira, que já foi aguerrido militante de esquerda, tendo atuado como motorista e segurança do líder guerrilheiro Caros Marighela, também o jornalista Fernando Gabeira, que igualmente atuou na luta armada e assina o artigo no Estado, vê o Mídia Ninja comouma ameaça (ver aqui).
Ameaça a quê?
O senador acha que o coletivo de midiativistas é um braço da militância petista financiado pelo governo federal. O ex-guerrilheiro Gabeira compara a Mídia Ninja àshordas de jovens violentos que levaram a efeito a “revolução cultural proletária” de Mao Tsé-Tung na China, em 1966, e diz que eles representam “o retorno à barbárie”.
Ainda que o foco tenha se desviado para desqualificar o Fora do Eixo e a Mídia Ninja,o alvo da reação é a onda de protestos que exige mudanças na política institucional.
Uma nota no Estado informa que o PSDB planeja colocar seus militantes nas ruas (ver aqui) no dia 7 de setembro, infiltrando-se nas manifestações do Movimento Passe Livre, para inserir entre as palavras de ordem o julgamento do chamado caso “mensalão” no Supremo Tribunal Federal. Os “tucanos”, diz o jornal, pretendem pegar uma carona com o grupo que nas redes sociais se identifica como Anonymous, juntando-se a ativistas de outros partidos.
É o status quo se mobilizando para tentar confundir o grito das ruas.
Os artigos que tentam demonizar a Mídia Ninja não caíram nas redações por acidente.