Monday, 23 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Quem quer a ditadura?

Coincidência ou não, dois dos principais jornais de circulação nacional trataram, nos últimos dias, de consultar os brasileiros sobre suas posições em relação ao regime democrático. Aparentemente, a motivação da pauta é a sucessão de manifestações que quase toda semana fecham a Avenida Paulista, pedindo o impeachment da presidente reeleita em outubro ou um golpe militar.

No domingo (7/12), o Estado de S. Paulo publicou pesquisa do Ibope revelando que a satisfação com a democracia subiu 13 pontos em 2014. Nesta segunda-feira (8), a Folha de S. Paulo divulga pesquisa Datafolha segundo a qual o índice de aprovação da democracia é o mais alto desde 1989.

Segundo a interpretação da pesquisa Ibope, apesar de um grande número de brasileiros ter dúvidas sobre a vantagem de viver em uma democracia, aumentou a porcentagem daqueles que defendem o regime de liberdade política em qualquer circunstância. Analistas consultados pelo Estado de S. Paulo acreditam que as dúvidas em relação ao regime democrático são alimentadas pela avaliação negativa dos partidos políticos e do Congresso Nacional e pela percepção de aumento da corrupção. Portanto, há uma relação direta entre o modo como a imprensa noticia e comenta os escândalos envolvendo políticos e partidos e o número de brasileiros que perdem a confiança na democracia, como já se afirmou neste Observatório.

Curiosamente, a maior concentração de cidadãos que prefere a ditadura ou acha que em algumas circunstâncias uma ditadura é melhor que a democracia está no Sudeste, onde a maioria dos eleitores optou pelo candidato derrotado na eleição presidencial de 2014. O perfil típico do antidemocrata brasileiro é o jovem com escolaridade e renda médias que vive em São Paulo ou no Rio de Janeiro. Especialistas citados pelo jornal creditam esse fenômeno ao fato de que os jovens tendem a emitir opiniões mais polarizadas, mas isso não explica por que o recorte dos antidemocratas é principalmente geográfico, uma vez que os jovens do Nordeste são mais favoráveis à democracia.

Convém lembrar que os antidemocratas se concentram nas regiões onde é maior a influência da imprensa hegemônica.

Aprovação em alta

A pesquisa Datafolha, interessante por relacionar a defesa da democracia diretamente à disputa eleitoral acirrada, não mereceu da Folha de S. Paulo o mesmo cuidado. O jornal paulista desprezou seu próprio instituto: embora tenha destacado o tema na primeira página, dedica ao estudo apenas um quarto de página, com um resumo dos dados gerais, sem especificar as nuances regionais ou por faixa de renda.

Ainda assim, esse quadro genérico permite observar que os brasileiros mais instruídos têm uma convicção mais sólida sobre a importância da democracia, com 80% afirmando que um regime de liberdade política é sempre a melhor forma de governo. Entre os menos escolarizados, que fizeram apenas o ensino fundamental, 57% têm a mesma opinião e 19% dizem que tanto faz uma democracia ou uma ditadura.

Também é interessante observar que, no domingo (7), a Folha havia publicado outra pesquisa na qual se perguntava aos consultados sobre o que achavam das responsabilidades da presidente Dilma Rousseff no escândalo da Petrobras. Segundo a Folha, nada menos do que 68% responderam positivamente, ou seja, uma maioria significativa entende que a presidente tem responsabilidade no caso.

Mas a edição distorce os números. A manchete do jornal diz o seguinte: “Brasileiro responsabiliza Dilma por caso Petrobras”. No entanto, a reportagem interna especifica que 48% concordam em que a presidente tem “muita responsabilidade” e 25% acreditam que ela tem “alguma responsabilidade” no escândalo. Paralelamente, 46% acham que o atual governo foi o que mais investigou casos de corrupção, no período da redemocratização, e 40% entendem que foi no governo de Dilma Rousseff que houve mais punição a corruptos.

A mesma pesquisa mostra que o noticiário sobre o pagamento de propinas na Petrobras não afetou a credibilidade da presidente: ela continua com as altas taxas de aprovação reveladas no dia 21 de outubro, antes da eleição em segundo turno: sua gestão é considerada ótima ou boa por 42% dos entrevistados. Além disso, ela conta com 50% de expectativas positivas quanto ao seu segundo mandato, apesar do grande esforço da mídia tradicional em baixar o nível de otimismo dos brasileiros.